Heartstopper, temporada 2 em análise
Na marca da sua segunda temporada, “Heartstopper” cumpre as expectativas e continua a assumir-se como uma lição de mestria no processo de adaptação: elevando e completando o seu material de origem, sempre com a criadora Alice Oseman a conduzir o barco.
[ATENÇÃO: Spoilers ligeiros acerca de alguns elementos do enredo da segunda temporada]
“Heartstopper”, o romance adolescente queer mais ternurento da televisão, está de regresso em agosto de 2023 para a 2ª temporada.
A história de Nick (Kit Connor) e Charlie (Joe Locke), de Tao (Will Gao) e Elle (Yasmin Finney), de Darcy (Kizzy Edgell) e Tara (Corinna Brown) e de Isaac (Tobie Donovan) está de volta para a sua segunda temporada, pronta para nos aquecer os corações com as mais belas e inclusivas narrativas de amor queer. Alice Oseman, a criadora dos comics que deram origem à série, regressa como senhora do seu conteúdo. Esta escreve e produz todos os episódios, uma vez mais, e desta forma o material original não só é respeitado – como é complementado e desenvolvido.
Belos mas curtos, os romances gráficos “Heartstopper”, presentemente contando quatro volumes e com dois finais no “forno”, narra a história do tímido Charlie, que se apaixona pelo popular e amistoso Nick Nelson, um “labrador humano” e jogador de Rugby. Esta história curta tem tempo para apresentar os amigos do par, as suas vidas e romances, e ainda os seus dramas quotidianos e relações familiares. Todavia, a série tem o luxo e o tempo para expandir cada uma destas histórias e assim torná-las mais ricas e repletas.
A segunda temporada de “Heartstopper” faz precisamente isso: continua a aprofundar a sua história, de forma a que personagens mais marginais ganhem mais vida. Imogene (Rhea Norwood) e Isaac, em particular, personagens criadas única e exclusivamente para a série, e que não existiam nos livros, pareciam algo perdidas no primeiro ano da série. Agora Imogene tem direito a um arco em que se recusa a ser menosprezada por um namorada desinteressado (o sempre problemático Ben, Sebastian Croft) e Isaac destaca-se através de um arco de descoberta, neste caso de assexualidade (o que faz todo o sentido para quem conhece a obra de Oseman, que focou o seu romance “Loveless” neste mesmo tema).
O maior desenvolvimento de personagens continua com Tara e Darcy, com particular foco na personagem Darcy, com Kizzy Edgell a destacar-se nesta sua interpretação de uma jovem lésbica não aceite pela sua mãe. Alguns dos instantes mais emotivos da temporada centram-se na dinâmica do casal mais “sénior” dentro do grupo de amigos, ilustrando as dificuldades que Darcy sente. Uma exploração bem para lá dos livros, e que deu outro valor e beleza a esta história de amor, que já era, aliás, bastante enternecedora na primeira temporada.
Na segunda temporada de “Heartstopper”, as relações do elenco de apoio têm direito a um desenvolvimento mais sólido. Tara e Darcy na imagem, aquando da visita do grupo a Paris.
A segunda temporada de “Heartstopper” começa com Nick Nelson a debater-se para ‘sair do armário’, agora que a sua nova relação tem um obstáculo claro – a afirmação perante o mundo. E se a mãe de Nick, interpretada pela sempre estupenda Olivia Coleman, é aberta e o aceita sem reservas, o mesmo não pode ser dito do seu pai distante e do seu irmão idiota. A luta interior de Nick tem inadvertidamente efeitos em Charlie, uma personagem altamente sensível e com uma tendência para a auto-censura, mesmo perante situações incapazes de controlar.
Todavia, embora a tensão esteja lá, o amor entre Nick e Charlie continua a ser belo, puro, pincelada de forma cuidada, como se a sua imagem em movimento televisiva fosse antes uma aguarela colorida. A sua vida e rotina romântica continuam a transmitir um encanto enternecedor, capaz de suavizar o mais cético dos corações. Por outro lado, Tao e Elle continuam num vai-não-vai, incapazes de dar um passo em frente na sua relação, com muito medo de danificar a sua presente amizade. Com coragem e notável garra, Elle explora também outras formas de afirmar a sua identidade trans.
Eis que, perante todas estas tensões do quotidiano deliciosas e bem apresentadas, o grupo chega a Paris para uma visita de estudo. Aqui, muitos eventos centrais – de tensões entre Tara e Darcy, à aproximação de Tao e Elle (por fim), passando pelo evento mais fulcral. Finalmente Nick começa a perceber que Charlie não tem uma relação normal com a comida. Este elemento é muito importante, pois por muito encantado e idílico que “Heartstopper” possa ser, o conteúdo torna-se mais triste e melancólico à medida que os livros avançam e a série, pelo que podemos constatar, não irá inverter esta tendência de perda da inocência.
Em Paris, a alegria e a tristeza coexistem em todas as personagens, à medida que o amor desperta e a cidade é filmada de forma deslumbrante, convidando-nos a entrar na imagem televisiva para não mais sair. E terminada a viagem a Paris, mais rituais de passagem – do baile da escola aos exames finais.
Da banalidade ao extraordinário, das exposições queer aos pedidos de desculpas, “Heartstopper” continua a ser um dos mais belos e inclusivos retratos da adolescência. Sem excesso risível de drogas e sem uma sexualização impiedosa das suas personagens (sim, “Euphoria”, estou a olhar para ti), a série de Oseman deixa os seus adolescentes simplesmente ser, e nunca invalida as suas lutas ou o seu sofrimento.
Como complemento perfeito, as vidas de Charlie, Nick e companhia continuam a ser musicadas na perfeição. Que o diga a popular playlist oficial da série, disponível no Spotify, e que este mês viu acrescentadas as músicas que marcam o ritmo da temporada 2:
Ainda há muitos episódios da vida de Charlie e Nick (e companhia) para contar nas temporadas vindouras. Cá estaremos, para entrar num mundo adolescente que não vira as costas ao sofrimento mas que prefere munir-se de cor, amor e representatividade.
TRAILER | TEMPORADA 2 DE HEARTSTOPPER – DISPONÍVEL EM AGOSTO DE 2023
Heartstopper, temporada 2 em análise
Name: Heartstopper, T2
Description: Nick e Charlie lidam com os obstáculos da nova relação. Tara e Darcy enfrentam desafios imprevisíveis, enquanto Tao e Elle tentam descobrir se alguma vez poderão ir além da amizade. Com os exames a pairar no horizonte, uma viagem a Paris e um baile de finalistas para organizar, o grupo não tem mãos a medir enquanto passa pelas seguintes fases da vida, do amor e da amizade.
Author: Alice Oseman
-
Maggie Silva - 85
Conclusão
Na marca da segunda temporada, “Heartsopper” continua a expandir a narrativa dos romances gráficos e a encontrar novos ângulos interessantes para desenvolver as suas personagens. Alice Oseman mantém o controlo como criadora e argumentista, garantindo um processo de adaptação irrepreensível.
Overall
85User Review
( votes)Pros
- A visita a Paris, bem explorada e sem pressas, ao longo de múltiplos episódios;
- Com o novo cenário – de Paris ao Baile – a segunda temporada de “Heartstopper” continua a pedir emprestada a estética dos comics ao mesmo tempo que nos presenteia com uma fotografia deslumbrante e pautada por cores vibrantes;
- O maior desenvolvimento das personagens: Ben tem mais profundidade, embora tenha uma jornada semelhante à dos livros e Imogene e Isaac, personagens que não existiam na BD, têm pela primeira vez verdadeiro propósito;
- A banda sonora continua a complementar o que se passa no ecrã de forma exímia;
- O arco, para lá de importante, do distúrbio alimentar de Charlie é introduzido com mestria e de forma promissora.
Cons
- Elle e Tao têm uma moleza excessiva no avançar e recuar da sua relação, mas não removeríamos as suas linhas narrativas por nada, especialmente porque nesta temporada ficamos a conhecer a sua interioridade muito melhor.