13º IndieLisboa | O Novo Aluno, em análise

Em O Novo Aluno temos mais uma narrativa adolescente em que um pária social encontra o seu refúgio entre um grupo de freaks e geeks, acabando por aprender valerosas lições sobre amizade e aceitação da diferença.

o novo aluno

Um dos grandes vencedores da 13ª edição do IndieLisboa foi Le nouveau ou O Novo Aluno de Rudi Rosenberg, um filme que alcançou dois prémios no final do festival, incluindo a desejada honra de ser o filme escolhido pelas audiências que, durante os dias destas celebrações cinematográficas, foram votando nos vários filmes exibidos no âmbito do Indie. Isto torna-se particularmente interessante quando olhamos criticamente para o filme em questão, uma comédia sobre jovens adolescentes, no limiar entre a infância e o estatuto de jovens adultos, que é um dos mais leves filmes oferecidos pelas seleções do Indie. Aliás, poder-se-ia caracterizar este filme como um feel good movie bem à moda do mais inofensivo e banal cinema de Hollywood, sendo que a única diferenciação deste filme para com essas obras semelhantes será mesmo a sua nacionalidade e sua presença no circuito dos festivais internacionais de cinema, onde a sua simplicidade e inocência conseguem parecer algo raro e precioso no meio de soturnas obras cheias de austeridade temática e complicados discursos estéticos.

Tal como o seu título aponta, o protagonista de O Novo Aluno é um rapaz francês que acaba de se mudar para Paris, onde é recebido na sua nova escola como um pária social, com esse estatuto de “novo” a lhe bloquear quaisquer esperanças de integração amigável. A acrescentar-se a estas mágoas e dores de crescimento, temos o facto que Benoit, pois esse é o seu nome, é supostamente envergonhado e inseguro, o que não parece corresponder a muitos dos seus comportamentos mais tardios na narrativa, mas serve de propulsionador de enredo nos primeiros momentos do filme. Na nova escola, com os seus códigos e grupos, Benoit vê-se assim excluído e ridicularizado pelos miúdos que têm o tão desejado estatuto de serem populares. Parece que as únicas pessoas a olhar para ele com alguma simpatia são os geeks e freaks, mais especificamente Constantin, um jovem de óculos, aparelho nos dentes e geral aparência de totó de uma sitcom do Disney Channel, que é obcecado com a ideia de formar um coro na escola; Joshua, um rapaz com excesso de peso e sérias incompetências sociais; e Aglaée, uma jovem com deficiências motoras que, mesmo assim, é a mais ajuizada e socialmente capaz deste grupo de improváveis aliados.

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Apesar desta ligação se começar a estabelecer com os desafortunados da hierarquia social adolescente, Benoit tem os seus olhos fixos numa outra nova aluna neste liceu parisiense, Johanna. Bela e de sotaque quebrado e notório, sendo de origem sueca, esta jovem torna-se no principal objeto de obsessão romântica do nosso protagonista. Estamos, pois claro, num filme que estará muito confortavelmente posicionado ao lado de uma infinidade de outras obras semelhantes sobre as mágoas de adolescentes inseridos numa sociedade insular de mean girls e bullys fanfarrões, que tentam afirmar-se na sua diferença com resultados finais que deveriam, segundo as claras intenções do filme, ser tidas como algo inspirador e comovente.

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Estas são nobres intenções, disso não há dúvida, mas é certamente difícil não olhar a execução do filme e mesmo o seu texto como algo de uma corrosiva banalidade e inconsequência. Afinal, poderia todo este enredo e mesmo suas personagens serem maiores clichés? Se este filme fosse uma comédia de estúdio americana haveria alguém a cantar seu valor cinematográfico? Ou seria este mais uma obra de ligeiros prazeres que é facilmente descartada como uma sobremesa agradável mas sem valor nutritivo de um ponto de vista humano, artístico ou puramente cinematográfico? Toda a construção de O Novo Aluno, por exemplo, está dependente de rígidas e fossilizadas fórmulas narrativas que já se até tinham tornado cliché fastidioso quando John Hughes primeiro se dignou a olhar o mundo dos adolescentes como panorama para uma das suas muito famosas teen comedys dos anos 80.

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Esta dependência de padrões narrativos estende-se ao próprio desenhar de cada personagem. Já referimos os geeks estereotipados, mas esse tipo de caracterização facilitista também afeta outras personagens com muitas das personagens femininas a serem de particular ênfase, sendo todas ou familiares, ou mean girls cruéis ou interesse românticos. Nem a pobre Aglaée consegue afirmar-se como uma personagem completa sem ser emparelhada com Constantin, sendo que se torna mais uma parte da história do jovem obcecado com coro do que uma figura com força narrativa individual. O pior exemplo disto é mesmo Johanna, que parece uma fantasia criada por um miúdo de 13 anos doutrinado pelas ideias sexistas inerentes a tanta da cultura pop atual. Ela é atraente, exótica, simpática, quase etérea na sua fluidez social e negação das barreiras dos grupos de liceu. Para além disso tem pouca personalidade e seu papel no enredo parece exclusivamente o de vitimizar Benoit com a suposta tragédia da friendzone.

Uma boa defesa contra tais críticas será certamente que esses limites conceptuais e grande imaturidade narrativa se devém à proximidade que o filme estabelece entre a sua observação e a mentalidade juvenil das suas personagens. Afinal, este tipo de imaturidade em que as caracterizações e mecanismos narrativos do filme acabam por cair é um eficaz reflexo do modo como estes jovens encaram o mundo, um mundo de rótulos humanos, estritos códigos sociais e humilhações de liceu que parecem apocalipses pessoais no momento em que são sentidas. Há ainda que acrescentar que, apesar desta imaturidade, o filme consegue criar algum balanço tonal ao exacerbar a sua perspetiva juvenil em momentos de humor, mas também se distanciar o suficiente para entender que muitos dos comportamentos das suas personagens poderão, apesar de infantilmente charmosos, ser bastante questionáveis. Como píncaro deste último aspeto, temos a sequência de uma festa dada na casa de uma das raparigas mais populares da escola, onde as atitudes de Joshua são tão hilariantes na sua abjeta incompetência social, como dolorosas, tanto para si, como para suas vítimas e para a audiência que estremece como que sentindo vergonha alheia por todos os jovens envolvidos.

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Nenhuma desta abordagem franca ao mundo dos adolescentes funcionaria sem o primoroso elenco juvenil, onde, curiosamente, nem é Réphaël Ghrenassia como o protagonista quem mais se destaca. Muito mais admiráveis são os atores que interpretam os maiores falhados deste liceu e eventual trupe de companheiros de Benoit. Como Constantin e Joshua, Guillaume Cloud-Roussel e Joshua Raccah são perfeitas presenças completamente credíveis mesmo nos seus momentos de maior ridículo. Num registo semelhante, mas crucialmente distinto, há uma maravilhosa seriedade e serenidade no trabalho da jovem Géraldine Martineau como Aglaée, que consegue ser ainda mais divertido de se observar quando é contraponto ao absurdo vistoso dos seus usuais companheiros de cena. No panorama dos atores adultos pouco há a dizer, sendo que, com exceção do tio de Benoit preso no seu eterno arrested development, a presença adulta é quase inexistente.

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Apesar do primor deste elenco infantil há, contudo, que se apontar uma terrível manobra do casting de O Novo Aluno. Repare-se como um filme que defende a celebração da diferença e a recusa dos códigos sociais que privilegiam os abastados, atraentes e socialmente confortáveis, os cineastas intencionalmente escolhem para seu protagonista aquele que é indubitavelmente o mais bem-parecido dos totós. Nem mesmo neste aspeto, O Novo Aluno consegue fugir à sua intrínseca banalidade, acabando por não ter coragem de realmente seguir a própria ideologia de inúmeros lugares comuns. É certo que muitas audiências poderão encontrar valor neste tipo de corrosivos clichés e perniciosos padrões cinematográficos, mas este é um filme com pouco ou nada a dizer com alguma relevância e que trata o pouco valor que tem com uma abordagem banal e perniciosamente inconsequente, que acaba por o destruir e subverter. Mesmo assim, é divertido de modo simplista e não desafia qualquer audiência de ponto de vista intelectual, humano ou estético, pelo que é fácil de perceber o seu sucesso no voto do público deste recente IndieLisboa.

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O MELHOR: O elenco juvenil que quase faz de O Novo Aluno uma obra essencial do recente filme sobre narrativas adolescentes.

O PIOR: Tudo o que não é o seu elenco..


 

Título Original: Le nouveau
Realizador:  Rudi Rosenberg
Elenco: Réphaël Ghrenassia, Joshua Raccah, Géraldine Martineau
Comédia | 2015 | 81 min

O novo aluno

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