"Vertigem Moral" | © MOTELX

MOTELX ’22 | Vertigem Mortal, em análise

Vertigem Mortal,” também conhecido como “Fall,” é um angustiante thriller realizado por Scott Mann, que conta com Grace Caroline Currey, Virginia Gardner e Jeffrey Dean Morgan nos papéis principais. O filme teve antestreia nacional na 16ª edição do MOTELx, onde integrou a secção Serviço de Quarto. Em Portugal, “Vertigem Mortal” tem distribuição da NOS Audiovisuais.

A simplicidade pode ser uma bênção, especialmente no que se refere ao cinema de género. Demasiada complicação pode estragar a pintura e quando o engenho é divertido, mas tolo, mais vale aceitar esse fato do que o contradizer com pretensiosismos inusitados. Não se trata tanto de um apelo à mediocridade, como um reconhecimento das prioridades e dos recursos – por tudo isso, este tipo de obra é uma espécie em vias de extinção. Hoje em dia, filmes de série B são praticamente não existentes, ou então são relegados a planos de distribuição obscuros onde nunca conseguem encontrar a sua audiência ideal.

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Tudo isto para dizer que “Vertigem Mortal” é um filme de série B, tão simples quanto desmiolado, que vence graças a essas facetas ao invés de por elas ser traído. A premissa principal, por exemplo, é tão esquálida que impressiona – duas amigas escalam uma torre de rádio remota e, devido a uma série de azares, ficam presas no topo sem maneira de descer ou pedir ajuda. Há mais substância ao texto, verdade seja dita, mas é exatamente nesses almejares a complexidades inalcançáveis que o filme mais fraqueja. É que, como tantas outras histórias de sobrevivência, “Vertigem Mortal” enquadra uma grande metáfora, onde a situação terrorífica é equivalente à crise psicológica da personagem e também serve como sua salvação.

Neste caso, Becky é uma jovem atormentada pela perda. Fã de adrenalina e desportos radicais, ela dedica a vida à escalada, mas, um dia, o marido morre devido a uma queda trágica. Tudo isso a nossa heroína testemunha ao lado da sua melhor amiga Hunter, outra alpinista. O trauma desse dia persegue-a, tornando aquilo que antes lhe dava prazer numa lembrança dolorosa – o medo depressa floresce dessa evolução emocional, um terror vertiginoso que lhe altera o sistema por completo. Por isso e outras razões, Hunter, quer forçar Becky a confrontar aquilo que a atormenta, uma espécie de terapia de choque por meio da escalada.

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Além do mais, não há melhor sítio para espalhar as cinzas do marido do que do cimo de uma torre com 600 metros de altura. Ominosas imagens de carcaças perdidas no deserto e abutres agressivos pressagiam a desgraça, um gesto diretorial que está quiçá a mais, um dourar da pílula desnecessário. Contudo, as amigas avançam, com Hunter a usar a aventura como modo de entreter os seus seguidores nas redes sociais. O diálogo é pobre nestas passagens, mas o engenho do suspense arrebata os sentidos. A sonoplastia espanta, em particular, delineando quanto as duas alpinistas se afastam do chão sem ser preciso a câmara olhar para baixo.

Os efeitos sonoros, por seu lado, como que dão personalidade à torre, seus muitos rangidos evocando a ideia de um animal moribundo, seu corpo a definhar apesar da monumentalidade. Muito Scott Mann brilha nesta subida, usando todos os truques e mais alguns para sintetizar a angústia e o isolamento das personagens. Chegado ao patamar superior, o filme acalma-se e entra no limbo, uma escada ferrugenta bloqueando o caminho de volta e o sol abrasador drenando os corpos de vida. A exaustão é palpável, o stress ainda mais, justificando algumas das atitudes mais melodramáticas das raparigas. Em tal situação, há um ponto em que a razão vai borda fora e o melodrama reina.

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Grace Caroline Currey e Virginia Gardner não são nenhumas mestras da interpretação, mas seu trabalho sustenta o arco narrativo, nem que seja pela química excelente estabelecida entre as duas. A cada minuto que passa, sentimos o degradar da mente, o definhar do sistema à medida que a esperança azeda e se fermenta em fatalismo. Dito isso, Mann é a estrela do filme, encenando “Vertigem Fatal” como o gradual retorcer de uma corda, até que o aperto é tanto que ela se desintegra. O modo como se transmite a altura da torre é especialmente impressionante, provocando náuseas e desamparo até ao espetador mais cínico. Face a um estímulo tão visceral, nem é preciso trabalho de personagem para partilhar a aflição das pessoas em cena – a expressão sensorial do tormento é mais do que suficiente. A simplicidade é a chave do sucesso, como se vê.

Vertigem Mortal, em análise
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Movie title: Fall

Date published: 14 de September de 2022

Director(s): Scott Mann

Actor(s): Grace Caroline Currey, Virginia Gardner, Jeffrey Dean Morgan, Mason Gooding, Jasper Cole, Darrell Dennis, Bamm Ericsen, Julia Pace Mitchell

Genre: Thriller, 2022, 107 min

  • Cláudio Alves - 70
70

CONCLUSÃO:

Traçando o pesadelo vertical de duas amigas presas no topo de uma torre isolada, “Vertigem Mortal” trabalha com os medos mais básicos, mais animalescos e viscerais, do espetador. Trata-se de um filme de série-B em preceitos clássicos com uma direção aprumada e espaço para as emoções fortes. O texto nem sempre funciona na perfeição, mas há valor neste esforço imperfeito. Enquanto entretenimento forte e fugaz, não há falha grave a apontar.

O MELHOR: Os muitos modos como Mann e MacGregor – o diretor de fotografia – encontram para expressar a grandiosidade vertiginosa da torre. Desde o contrapicado clássico até à exuberância dos efeitos digitais, desde o sol escaldante até ao sinistro vazio da noite, esta parelha faz milagres.

O PIOR: Algum CGI menos bem conseguido – entendemos que o filme não teve um orçamento milionário – e a desajeitada tentativa de forçar uma moral ao fim da história. O trauma não se resolve com mais trauma, não obstante o que estes thrillers de sobrevivência possam declarar. Isso e o filme é demasiado comprido também.

CA

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