Tár, em análise
“Tár”, um drama realizado, produzido e escrito por Todd Field (” Little Children”) avança para os Óscares de 2023 com um total de seis nomeações, inclusive Melhor Atriz e Melhor Filme. Que dizer desta jornada pelo sucesso e queda de uma poderosa figura fictícia?
Parece quase supérfluo ou repetitivo intitular uma prestação de Cate Blanchett como “uma das melhores da sua carreira”, pelo menos quando estamos a falar de uma das melhores atrizes do cinema contemporâneo. Todavia, Lydia Tár é, sem dúvida, uma personagem memorável e capaz de escapar das páginas do argumento e frames do cinema, ganhando vida própria.
Esta longa-metragem encontra Blanchett no papel da personagem titular, uma maestrina inovadora, no topo do seu campo profissional, e que já trabalhou com as principais orquestras de todo o mundo. Dominante, impiedosa, e perfeitamente segura da sua mestria, Lydia Tár é uma personagem complexa, e que vence na sua capacidade para se elevar acima de distinções simplistas de moralidade.
“Tár” é a história do auge da carreira musical deste génio, enquanto prepara uma nova peça para a sua residência na orquestra de Berlim. É aqui, enquanto Tár se prepara para uma apresentação da Sinfonia n.º 5 de Mahler, que a vida de Tár começa a ruir rumo ao inevitável apagamento. Não obstante, este não é um filme que procure denunciar a “cultura de cancelamento”, embora se apresente como uma obra do “aqui e agora”, isto de forma inequívoca.
Lydia é uma figura problemática, egoísta, mesquinha até, que orienta as suas acções tendo em conta, única e exclusivamente, a gratificação pessoal. O seu passado ameaça engoli-la, e embora Lydia o mereça, não deixamos de apreciar a vertiginosa queda testemunhada. É esse o poder do argumento de Todd Field – não precisamos de empatizar com a figura de Lydia Tár para nos interessarmos pela sua jornada.
Embora na marca das 2h30, “Tár” seja ligeiramente longo de mais para o seu próprio bem, sofrendo de alguns problemas de edição – quantas vezes precisamos de ver manifestações noturnas de culpa? – a jornada da personagem central nunca deixa de agarrar o espectador.
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Acima de tudo, “Tár” é uma narrativa acerca de perigosos caminhos e relações de poder capazes de envenenar tudo em seu redor. Situado num mundo elitista e de nicho, o filme vale pela sua capacidade de se desprender deste meio e retratar sentimentos profundamente relacionáveis e universais.
Como trunfos inegáveis, a longa-metragem mune-se de uma versátil e devastadora prestação central por parte de Cate Blanchett, um ser camaleónico que se despe de todo o star power e habita, de corpo e alma, a sua personagem. Ademais, a banda-sonora, asfixiante e ansiosa, musica um conjunto de eventos que exigem bastante da psique de quem vê. Como outro elemento decisivo, identifica-se a fotografia, que traça um jogo de espelhos e reflexos capaz de enfatizar a farsa protagonizada por Lydia.
Assente na força do seu elenco central e secundário, “Tár” consegue universalizar e tornar mundano um mundo feito para um nicho muito restrito. Lydia Tár não é uma vilã, mas não é tão pouco uma heroína – é com esta ambiguidade, e com o seu egoísmo e hipocrisia – que teremos de lidar à medida que a obra progride e nos transporta para o seu trágico último acto. É impossível desviar o olhar, isto à medida que o castelo de cartas começa a ruir.
TRAILER | TÁR, NOMEADO A SEIS ÓSCARES, ENCONTRA-SE NAS SALAS DE CINEMA NACIONAIS
Tár, em análise
Movie title: Tár
Movie description: Conhecemos Tár no auge da sua carreira, enquanto se prepara para o lançamento de um livro e para uma extremamente antecipada performance ao vivo da Sinfonia n.º 5 de Mahler. Ao longo das semanas subsequentes, a vida de Tár começa a desenrolar-se de uma maneira singularmente moderna. O resultado é uma abrasadora análise do poder e do seu impacto e durabilidade na sociedade contemporânea.
Date published: 25 de February de 2023
Country: EUA
Duration: 158
Director(s): Tood Field
Actor(s): Cate Blanchett, Noémie Merlant, Nina Hoss
Genre: Drama, Música
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Maggie Silva - 78
CONCLUSÃO
Embora se prolongue um pouco para lá do recomendado, “Tár” é um filme ambicioso e bem executado, capaz de ser universal na sua abordagem de dinâmicas de poder e também profundamente específico e alusivo às questões que se colocam na sociedade do século XXI.
Pros
- A gigante, inabalável e “galardoável” prestação de Cate Blanchett.
- A capacidade de criar uma personagem de moralidade duvidosa e apresentá-la como protagonista, sem nunca precisar que nos coloquemos do seu lado;
- A colocação da narrativa num mundo elitista e fechado, sem a tornar intelectualmente pretensiosa;
Cons
- Problemas de ritmo ao longo dos seus actos;
- Alguma repetição de ideiais.