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The Staircase | Entrevista a Antonio Campos e Maggie Cohn

“The Staircase” é um dos destaques do mês da HBO Max, e a Magazine.HD teve a oportunidade de conversar com o criador e produtora da minissérie.

A história conhecida como “The Staircase” já foi alvo de inúmeras reinterpretações. Aliás, este projeto apresentado sob o selo da HBO Max é o resultado de 14 anos de trabalho, com algumas pausas pelo meio. Mais uma vez, inicialmente pensado para ser uma longa-metragem, a fatídica noite que levou à morte de Kathleen Peterson e ao exaustivo julgamento do seu marido, Michael Peterson, acabou novamente no pequeno ecrã.

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Antonio Campos, Toni Collette e Maggie Cohn | © HBO Max

Colin Firth e Toni Colette são a dupla de protagonistas (de ouro), interpretando os Peterson. A seu lado estão Sophie Turner (“Game of Thrones”), Patrick Schwarzenegger (“The Long Road Home”), Odessa Young (“The Stand”), Dane DeHaan (“The Stranger”) e Olivia DeJonge (“The Society”) enquanto os filhos do casal. Eis a sinopse oficial da minissérie de oito episódios:

Baseada numa história real, ‘The Staircase’ explora a vida de Michael Peterson (Firth), a sua extensa família da Carolina do Norte e a morte suspeita da sua mulher, Kathleen Peterson (Collette).

A convite da plataforma, a Magazine.HD conversou com o criador, realizador e produtor, Antonio Campos, e com a produtora Maggie Cohn.

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MHD: Como é que chegaram a esta ideia e quanto tempo demorou até ser posta em prática?

Antonio Campos: Tinha acabado de lançar a minha primeira longa-metragem quando recebi o documentário – os primeiros oito episódios, que era tudo o que existia em 2008 – vindo de um produtor que estava interessado em adaptá-lo ao grande ecrã. Comecei o processo nessa altura e fiquei fascinado por 1) eu ser um entusiasta por crimes reais, estava constantemente a ler sobre crimes reais, por isso quando o projeto apareceu senti que o universo queria que continuasse com a temática, senti que era a coisa certa no momento certo.

E 2) era o caso mais complicado com que alguma vez me tinha deparado porque parecia incognoscível. Michael Peterson enquanto protagonista era tão impenetrável e acho as pessoas assim fascinantes, fazem com que me queira aproximar e descobrir mais. Assim, mergulhei na toca do coelho que é “The Staircase.”

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Odessa Young, Hannah Pniewski, Dane DeHaan, Colin Firth, Patrick Schwarzenegger, Odessa Young e Sophie Turner (da esq. para dta.) © HBO Max

Creio que a grande maioria das pessoas que esteve envolvida na história, de uma forma ou de outra, tiveram a experiência de ir cada vez mais fundo, ao ponto de pensarem durante muito tempo que iriam descobrir a verdade. Que os peritos não tinham olhado da forma ou do ângulo que deviam. A dada altura tornou-se claro de que enquanto contador de histórias, as minhas capacidades não eram as de decifrar um salpico de sangue. Esse não era o meu papel. Mas, compreendi a história e personagens, e simplesmente fiquei interessado em explorá-las.

Ao longo dos anos, comecei a ver “The Staircase” como algo mais complicado do a história ‘normal’ baseada num crime real, e comecei a vê-la como um drama familiar. Começando aqui – um drama familiar assente num crime real – começou a desenvolver-se para algo ainda mais complicado. Por fim, acabou por ser uma análise mais profunda da verdade e complexidade da verdade, e do que é a verdade objetiva, e essa foi a série que fizemos. Definitivamente que não seria este o resultado há 12 anos atrás, podemos dizer que o projeto encontrou organicamente o seu caminho.

MHD: Quais foram as suas primeiras impressões do documentário e porque ficou tão interessado em dramatizá-lo?

Antonio Campos: Penso que o que atrai toda a gente neste caso é o acesso. Como é que se obteve todo este acesso a estas pessoas e o que estava a acontecer para elas permitissem que uma equipa de filmagens entrasse? A forma como as pessoas – Michael Peterson e a equipa de defesa – se comportaram como se não estivessem câmaras presentes. Agirem de forma casual e a fazer piadas, e o facto de estarem dois realizadores franceses simplesmente incluídos nesta casa em Durham, em 2002 – é fascinante, porque o que estamos a ver não é o quadro completo. Existe muito mais. A partir do momento que comecei a analisar o documentário e a ver as gravações não utilizadas e as inúmeras pesquisas que foram realizadas ao longo dos anos, tornou-se bastante claro de que existia muito mais do que estava a ser mostrado no ecrã.

MHD: E a Maggie, como entrou no projeto? 

Maggie Cohn: Sempre fui fã do documentário, vi-o quando estreou. Lembro-me de pensar que era uma forma muito interessante de explorar uma família. Ao mesmo tempo que estávamos a explorar a ideia do que teria acontecido naquela noite, também estávamos a explorar as consequências e o impacto que a morte de alguém significa para uma família. Estávamos a assistir à emergência do luto. E depois, claro, o que mais me fascinou – enquanto alguém que compreende como as histórias são contadas e construídas –  foi o facto de as pessoas assistirem a um documentário e pensarem ‘oh, esta é a verdade, isto é a vida real,’ por isso desconstruir essa ideia dentro do contexto de uma narrativa era uma grande oportunidade. Não só fala para o documentário, como para as histórias que contamos à justiça.

Existem várias histórias, a da defesa e a da acusação, a do documentário, e a história que a família tem da sua vida. Quem era a Kathleen? O que aconteceu antes daquela noite? O que aconteceu à volta do enquadramento do documentário e o que aconteceu quando as câmaras se desligaram? A ideia de que poderíamos entrar do nível zero e simplesmente começar a trabalhar e a descobrir a melhor forma de contar a história foi uma oportunidade fantástica.

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MHD: Nos dias de hoje o género do crime real está bastante saturado… O que diferencia “The Staircase” dos restantes conteúdos?

Antonio Campos: Creio que parte se deve ao facto de estarmos a usar uma das peças seminais do género para desconstruir esse mesmo género. Estamos a utilizar “The Staircase” para falar sobre o porquê de “The Staircase” sequer existir. É a ideia de ‘nós conseguimos resolver isto, podemos encontrar uma resposta’, e por isso o que estamos a tentar fazer é dizer ‘não existem respostas, é tudo uma história.’ Queremos atingir um nível de conforto dentro do discurso de que não existe uma verdade única, pelo que recorremos ao género para comentar sobre si. Idealmente, será esse o derradeiro factor de diferenciação.

MHD: Quão perto trabalhou de Jean Xavier? De que forma é que isso influenciou a série?

Antonio Campos: O Jean [realizador francês, autor do documentário] e o Denis Poncet [produtor do documentário] foram duas das pessoas que conheci praticamente desde o início do projeto. Eles eram personagens muito importantes, o que era bastante entusiasmante. O Denis (que já faleceu) foi o produtor do documentário e era um grande amante da vida, muito excêntrico e fã de um bom mexerico. Ele estava constantemente a alimentar-me com teorias. Havia algo na qualidade sensacionalista que ele, enquanto produtor, ficava bastante entusiasmado. Já Jean era muito calado e não comentava as suas teorias. Ele era muito mais ponderado, e o seu estilo de realização reflete muito quem ele era enquanto pessoa e enquanto cineasta – existe uma contenção silenciosa que ele demonstra ao longo do documentário.

No início, eles eram as duas perspetivas opostas que eu pensava, e foram muito abertos e generosos com o seu tempo. Não é muito fácil mantermo-nos agarrados a um projeto durante muito tempo. Obviamente que não foi feito em 2008 e eu trouxe-o para um lugar diferente em 2011, quando comecei a escrevê-lo como  uma longa-metragem, mas tal revelou-se muito complicado, e depois simplesmente ficou ali pendurado. Mas eles acreditaram em mim para tentar adaptar a história, mantiveram-se sempre ao meu lado. Além de ser um recurso incrível para nós e alguém que abriu as portas e nos ajudou ao longo do caminho quando precisávamos de informação, o Jean também era um excelente advogado e campeão. Se não fosse pelo seu documentário, provavelmente não estaríamos aqui hoje.

MHD: Chegaram a conhecer Michael Peterson?

Antonio Campos: Não tive a necessidade de o conhecer durante muito tempo, mas depois já na sala dos guionistas uma década depois de termos visto o documentário pela primeira vez, senti que estava confortável o suficiente para ter uma conversa com Michael, sem que a mesma me influenciasse. Assim, em 2020, falei com ele por telefone algumas vezes. Depois a Maggie fez o mesmo, bem como outro dos nossos guionistas. Cada um de nós escolheu as perguntas que iria colocar, queríamos ver se cada um obtinha uma versão diferente de Michael e a forma como ele se relacionava connosco. Por isso, essa foi a experiência de falar com ele.

Maggie Cohn: Não existia muita pressão para isso acontecer, porque o projeto não precisava necessariamente disso. Estamos a partir do pressuposto que isto é uma história e, como tal, não precisamos obrigatoriamente de compreender estas pessoas enquanto seres humanos. Também quisemos contar esta história sem nos inclinar-nos para uma direção, independentemente das nossas opiniões. Não saber quem iria acrescentar algo ou contribuir, tornou mais fácil para nós não ter a obrigação de falar com alguém, pelo que escrevemos a história de forma a que isso não fosse um requisito. Assim, embora não fosse proibido, não era obrigatório ou encorajado. “The Staircase” não é uma cópia. É o questionar da ideia se existe alguma verdade. E, por conseguinte, não é necessário esse tipo de participação dos intervenientes reais.

Antonio Campos: Pensando nisso agora, se não tivéssemos falado com Michael, penso que a série não teria sido diferente.

The Staircase Corpo mapa das séries de maio de 2022
Colin Firth e Toni Collette | © HBO Max

MHD: Porque é que foi tão importante reencenar os diferentes cenários da morte de Kathleen?

Antonio Campos: Era a nossa tese ao tentarmos examinar a própria verdade. Sentimos que precisávamos de voltar constantemente ao centro da história, que era a escada (“staircase” em inglês). De alguma forma, esta era a nossa obsessão. O que aconteceu naquele espaço, naquele período, naquela noite. O facto de podermos levar Kathleen e Michael desde o início da história até às diferentes versões daquela noite sem mudar nada do que tivesse acontecido antes, abordou as diferentes interpretações, bem como a complexidade da verdade do que aconteceu.

MHD: Permanece por esclarecer se Michael Peterson é um assassino ou um homem inocente. Tinha alguma opinião antes de ter entrado no projecto? A mesma mudou à medida que o mesmo foi avançando?

Antonio Campos: Sim, tinha. Fui em tantas direções diferentes com isto e tive tantos sentimentos diferentes, mas no final da série tive um feeling que nunca tinha sentido antes, por isso foi um processo interessante até chegar onde estou agora e à forma como penso, porque não é a mesma com que comecei.

MHD: Pode partilhar o seu estado atual?

Antonio Campos: Não! Queremos que as pessoas tenham a sua própria experiência. Creio que posso dizer que a experiência que o público atravessa ao longo da série é um reflexo da nossa, por isso é mais interessante para eles tê-la por si mesmos do que connosco a informá-los.

Maggie Cohn: Penso que todos tinham opiniões diferentes e saber que isso não era essencial para descobrir a história era importante. A conclusão a que todos chegámos é que qualquer pessoa é capaz de momentos incríveis de grandeza e amor, assim como são igualmente capazes de destruição, e isso é simplesmente a vida. Creio que quando temos essa dualidade e a estás disposto a aceitar em ti e em outras pessoas, começas a dar um bocadinho mais de valor às coisas importantes.

MHD: Obrigada Antonio e Maggie.

TRAILER | THE STAIRCASE JÁ DISPONÍVEL NA HBO MAX PORTUGAL

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