71º Festival de Cannes: Duarte Coimbra, com “Amor, Avenidas Novas”

“Amor, Avenidas Novas”, a curta-metragem portuguesa realizada por Duarte Coimbra e produzido pela Escola Superior de Teatro e Cinema de Lisboa (ESTC), estreia esta terça na 57ª Semana da Crítica, uma secção paralela do Festival de Cannes.

“Amor, Avenidas Novas” é uma nostálgica e musical canção sobre o amor dirigida por Duarte Coimbra, um jovem diplomado em cinema de 22 anos. Duarte Coimbra foi o vencedor do Prémio Jovem Talento do IndieLisboa 2018. Ainda antes de viajar para o Festival de Cannes, Duarte Coimbra falou à MHD, sobre a sua curta e a surpreendente selecção para a 57ª Semana da Crítica.

Duarte Coimbra
O actor e cantor Manuel Lourenço (Primeira Dama) é o protagonista de “Amor, Avenidas Novas”.

Magazine HD: Como nasceu essa ideia de realizarem um filme que cruza um ideal de amor de duas gerações distintas, pais e filhos?

Duarte Coimbra: Achei que poderia ser interessante trabalhar essa ideia visto que é algo sobre a qual reflito bastante e que se revê na minha própria educação e crescimento.

MHD: O filme é um olhar crítico sobre essa Lisboa que se está a tornar cada vez mais permeável à especulação imobiliária e ao turismo???

DC: A ideia dessa crítica e que está evidentemente presente no filme é que ela não fosse algo sem nexo, que aparecesse no filme só porque eu tinha a urgência que aparecesse mas sim que fosse uma coisa justificada, incorporada na narrativa.

MHD: Também é uma experiência do cinema dentro do cinema: Manel entra por uma rodagem a dentro só de meninas…

DC: Sim, não sei se se pode falar de meta-cinema já que isto é algo diferente, penso eu, já que parece-me ser um detour do que o filme vive e que depois retoma à continuidade. Mas sim, acho que esta cena existe para reforçar as ligações/ relações amor-cinema, amor-cidade, cidade-cinema. E é um gag cómico também, ou pelo menos a tentativa de um.

MHD: A cena também funciona como uma espécie de homenagem à ESTC, a vossa Escola que tem sido o berço de muitos cineastas, certo?

DC: Sim, acho que sim. Acho que pode funcionar como homenagem, mas também como crítica. A escola é um sítio muito importante e sem ela este filme com toda a certeza não existiria mas não deixa também de ser um sítio com muitas coisas por melhorar ainda. Mas sim, é acima de tudo uma homenagem, já que o filme pode funcionar também como uma espécie de fechar de ciclo.

Duarte Coimbra
Amor é  a história de um jovem que carrega  um colchão às costas pela Av. Almirante Reis abaixo.

MHD: A propósito “Amor, Avenidas Novas’, faz lembrar e ainda bem um bocadinho as curtas do Miguel Gomes. Revês-te nesta referência?

DC: É interessante falar dos filmes do Miguel Gomes depois de falar da escola porque ele foi sem dúvida o realizador que mais me encantou durante o período que estudei na ESTC. Foi na Escola que também comecei a ver mais Cinema Português e que descobri verdadeiramente a Cinemateca e realizadores como o Manoel de Oliveira e o João César Monteiro. E o Miguel Gomes sempre teve um lugar especial, sentia-me e ainda me sinto, de maneira diferente, atraído pela abordagem, pela planificação, pelo texto, etc. É importante dizer que o meu percurso na Escola coincidiu com o estreia do seu último filme, e eu senti que foi um momento muito importante para mim e para as pessoas que estavam à minha volta.

MHD: Sendo um filme de Escola como é que vocês se organizam para tu seres o realizador, o Luis o argumentista, o Pedro, o produtor. Isto é definido inteiramente por vocês ou há intervenção de um professor ou professores da escola?

DC: A proposta da Escola é organizarmo-nos por triângulos e eu estava a tirar a licenciatura em Realização, o Luís em Argumento e o Pedro em Produção, daí acharmos que fazia sentido juntarmo-nos os três, talvez por causa dos interesses que temos em comum e da nossa amizade.  A partir daí fomos seguidos pelos diferentes professores nestas três áreas, para que fossemos construindo o filme.

Duarte Coimbra
Uma Lisboa que se está a tornar cada vez mais permeável à especulação imobiliária e ao turismo

MHD: Numa sociedade e no mundo em que tudo é efémero e temporário (em que é difícil acreditar em alguma coisa, nas pessoas, nos políticos, nas instituições, nos media, ainda há lugar para o romantismo e mais para uma vida a dois ou para um amor para toda a vida?

DC: Eu espero que sim. Acho que uma das forças do filme, talvez a mais interessante é essa. É essa verdade. É essa esperança.

MHD: A última cena é genial…uma verdadeira cena de Julieta e Romeu…e com o tema ‘E tu Aqui’, da Lena d’Agua (eu adoro as músicas da Lena d’Agua, são um dos meus guilty pleasures, aliás como ela…). Como é que pensaram essa cena e decidiram recuperar a música da Lena D’Água (e do Variações)?

DC: Eu queria fechar o filme com uma ideia de fogo-de-artifício, mas como estávamos restringidos em tempo-dinheiro, achei que podia encontrar esse fogo-de-artifício, essa força, na música da Lena D’Água. Fazia todo o sentido já que a Lena D’Água é recorrente no filme.

MHD: Apesar de tudo o filme é ou não é uma grande ode ao amor, à felicidade, a Lisboa…e ao contrário do que dizia o Marivaux…ainda se pode brincar com o Amor?

DC: Eu acho que isso fica para o espectador responder. Mas acho que sim, ainda se pode e deve brincar com o amor.

Duarte Coimbra
Os realizadores da 57ª Semana da Crítica com os portugueses Duarte Coimbra e Gabriel Abrantes.

MHD: Só para terminar é muito importante para ti estar na Semana da Crítica do Festival de Cannes?

DC: É surreal mas claro que é muito importante. Era um passo que pensava nunca alcançar, muito menos com o filme que fiz na Escola de Cinema.

José Vieira Mendes (em Cannes)

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