Sunset

75º Festival de Veneza (8) | ‘Sunset’: A Chapeleira

Uma jovem chapeleira torna-se testemunha da decadência da civilização e da queda do Império austro-húngaro no épico ‘Sunset’ de Laszlo Nemes (‘O Filho de Saul’), ambientado em Budapeste no período pré-I Guerra Mundial.

‘Sunset’ (Napszállta), o segundo filme do realizador húngaro Laszlo Nemes, é um poderoso fresco histórico, e um retrato da decadência e da catástrofe europeia, no início do século XX. Pode-se dizer que estão lá os eternos problemas e as confusões de fronteiras, étnicas e religiosas, herdadas dos regimes imperiais da ‘mittleeurope’, resumidos num filme que é um alerta igualmente para a intolerância nos nossos tempos. Ainda mais é um filme de origem húngara. O cenário é a bela e imperial cidade de Budapeste em 1913, um ano antes de começar a I Guerra Mundial.

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E parece de início criar uma atmosfera fascinante que ameaça e envolve a jovem e bela heroína Irisz (Juli Jakab), que regressa de Trento, na Itália onde estudou, para reaver aquilo que pertencia aos seus pais, entretanto desaparecidos. Só que a situação já é outra, porque alguém tomou conta da fábrica de chapéus da família. No entanto, o pesado simbolismo e inclinação de ‘Sunset’, para criar mistérios não resolvidos, afastam-no  de alguma forma da pungência e objectividade de ‘O Filho de Saul’, filme que lançou a carreira de Nemes com um Grande Prémio do Festival de Cannes 2015, Globo de Ouro e Óscar para Melhor Filme de Língua Estrangeira em 2016.

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TRAILER | ‘SUNSET’ DE LASZLO NEMES

Com quase duas horas e meia de duração — aliás os filmes de duração longa têm sido uma constante nesta edição — e filmado com uma intensidade crescente e planos quase sempre apertados sobre o rosto angustiado da protagonista, — aliás como em ‘O Filho de Saul’ — que exige um envolvimento total do espectador, ‘Sunset’ de Laszlo Nemes, torna-se algo cansativo e um pouco frustrante, porque os vários mistérios lançados, não parecem muito bem resolvidos ou revelados. Outra questão, é o próprio tema apocalíptico, que poderia ser mais bem explorado e argumentado até pelo seu oportuno sentido histórico, pois na verdade estamos cada vez mais ou sempre nas vésperas ou ameaçados de destruição e da intolerância.

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Mais, ‘Sunset’ não chega a ter a força e a conseguir puxar pela nossa imaginação, do que acontece para além do que está focado na imagem, como acontecia no campo de concentração nazi do primeiro filme. Embora Nemes tente aumentar o nosso nível de ansiedade e tensão, através da poderosa banda-sonora, o facto é que a personagem, as histórias paralelas, Budapeste na pré-guerra são sempre uma abstração que não chega a confrontar-nos com a violência ou a bater-nos no coração. Por isso, se o forte apoio da crítica (Prémio FIPRESCI em Cannes 2015) foi crucial para a brilhante carreira de ‘O Filho de Saul’, dificilmente vai-se repetir em ‘Sunset’. Mas não deixa de ser um dos filmes mais interessantes desta competição.

José Vieira Mendes (em Veneza)

José Vieira Mendes

Jornalista, crítico de cinema e programador. Licenciado em Comunicação Social, e pós-graduado em Produção de Televisão, pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa. É actualmente Editor da Magazine.HD (www.magazine-hd.com). Foi Director da ‘Premiere’ (1999 a 2010). Colaborou no blog ‘Imagens de Fundo’, do Final Cut/Visão JL , no Jornal de Letras e na Visão. Foi apresentador das ‘Noites de Cinema’, na RTP Memória e comentador no Bom Dia Portugal, da RTP1.  Realizou os documentários: ‘Gerações Curtas!?’ (2012);  ‘Ó Pai O Que É a Crise?’ (2012); ‘as memórias não se apagam’  (2014) e 'Mar Urbano Lisboa (2019). Foi programador do ciclo ‘Pontes para Istambul’ (2010),‘Turkey: The Missing Star Lisbon’ (2012), Mostras de Cinema da América Latina (2010 e 2011), 'Vamos fazer Rir a Europa', (2014), Mostra de Cinema Dominicano, (2014) e Cine Atlântico, Terceira, Açores desde 2016, até actualidade. Foi Director de Programação do Cine’Eco—Festival de Cinema Ambiental da Serra da Estrela de 2012 a 2019. É membro da FIPRESCI.

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