via 79º Festival de Veneza/'Argentina, 75'

79º Festival de Veneza (4) | ‘Argentina, 1985’: Voltar a Acreditar

Quase a meio a competição de Veneza 79 rejubilou com ‘Argentina, 1985’, de Santiago Mitre sobre o processo contra a Junta Militar argentina, enquanto o veterano Paul Schrader recebia o Leão de Carreira e apresentava o magnífico ‘Master Gardener’, com Joel Edgerton e Sigourney Weaver.

Em ‘Argentina, 1985’, de Santiago Mitre (O Estudante’), mas um filme da competição de Veneza 79, onde o  público e privado alternam-se sobre um importante tema: os direitos humanos e a justiça, num filme, que conta a história verídica dos dois procuradores que investigaram e construíram a acusação contra os responsáveis os anos de chumbo da ditadura militar argentina. Em ‘O Estudante’ (2011), realizador argentino Santiago Mitre, já tinha observado a evolução da democracia nos seu país, falando da crise de poder, do hábito de negociar e da ascensão e percurso, nem sempre muito ético dos políticos. 

79º Festival de Veneza
via 79º Festival de Veneza/’Argentina,1985′.

Neste novo e estupendo ‘Argentina, 1985’, ‘um filme de trubunal’, o cineasta regressa ao passado e à vergonhosa história de um país que esteve subjugado por uma sangrenta ditadura militar de 1976 a 1983. ‘Argentina, 1985’, é um drama político onde é contado todo o processo liderado por Julio Strassera (Ricardo Darín) e Luis Moreno Ocampo (Peter Lanzani), que ousaram investigar a Junta Militar, para obter justiça e ver reconhecido o sofrimento das muitas vítimas daqueles anos de autêntico terrorismo de estado, repressão e tortura. Foram quase quatro meses de julgamento, com cerca 833 testemunhas e sobreviventes, que estiveram na rede de centros clandestinos de detenção e tortura e lembrar o destino dos mais de 30.000 desaparecidos.

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VÊ TRAILER DE ‘ARGENTINA, 1985’

O filme de Mitre mostra de uma forma extraordinária, ao ritmo mesmo de um daqueles filmes de Hollywood, essa verdadeira corrida contra o tempo, entre ameaças de morte e bomba, e de uma batalha entre David e Golias, reconstruída com minúcia e paixão, por um grupo de jovens juristas — e também de jovens e brilhantes intérpretes — capitaneados pelo procurador Julio ‘Loco’ Strassera, interpretado por Ricardo Darín, um dos melhores actores da actualidade, que parece querer apenas, estar no cinema ibero-americano. A coragem de filmar algo que até agora nunca ninguém se tinha atrevido a fazer e nos locais onde efectivamente aconteceram, fez talvez com que a Amazon Studios apostasse em que este fosso o seu primeiro projecto original ‘made in Argentina’. É também um importante reconhecimento para o argumentista e realizador de 42 anos natural de Buenos Aires, um dos mais interessantes cineastas argentinos do momento e que com este filme procura mostrar às novas gerações, que ditadura nunca mais e que é preciso ‘voltar a acreditar’, uma das frases chaves deste filme extraordinário.

79º Festival de Veneza
via 79º Festival de Veneza/’Master Gardner’.

Na noite em que foi entregue o Leão de Ouro de Carreira ao realizador e argumentista norte-americano Paul Schrader — tem sido um assíduo no Lido de Veneza, desde 1997, com ‘Confrontação’)— foi também pretexto para apresentar, mas fora da competição o seu novo drama psicológico ‘Master Gardener’, com um escrupuloso jardineiro interpretado por Joel Edgerton e Sigourney Weaver, na sua patroa uma rica viúva. Narvel Roth (Edgerton), é um um mestre na arte de fazer jardins perfeito, neste caso no de uma rica e idosa viúva do Lousiana (Weaver) com quem efectivamente tem uma relação muito especial. É um sentimento perfeito de equilíbrio, que regula o jardim e a casa aristocrática e que se quebra quando a patroa decide confiar aos cuidados e conhecimentos de Narvel, uma jovem e problemática sobrinha, que mal conhece. A rapariga aprende rapidamente o ofício, mas alguns dos seus problemas continuam a afectá-la, ao passo que ao mestre-jardineiro, as memórias da sua vida passada começam a agitá-lo.

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79º Festival de Veneza
via 79º Festival de Veneza/Quintessa Swindell, em ‘Master Gardner.

Depois de ter estado em competição em 2017 com a ‘No Coração da Escuridão’ e o ano passado com o belíssimo ‘The Card Counter—O Jogador’, Paul Schrader foi convidado para estar presente fora de competição, como é habitual para quem vai receber um Leão de Carreira. Aliás merecido para o argumentista de ‘Taxi Driver’ (1976) e ‘Touro Enrraivecido’ (1980) e realizador de filmes tão marcantes como ‘Hardcore-A Rapariga na Zona Quente’ (1979) ou ‘American Gigolo’ (1980). ‘Master Gardener’, Narvel Roth (Edgerton) é uma das muitas formas de fazer regressar o taxista Travis Bickle, um papel que aliás, que foi assumindo com algumas variantes, ao longo dos anos e que mais tarde se tornou num motorista de ambulância, traficante de drogas, filósofo, um padre confuso ou um jogador de poder. Aqui tem o rosto do ator-realizador Joel Edgerton, um homem solitário, calmo e misterioso, que começa sentado e escrevendo, numa sala, ainda com o seu trabalho como horticultor, quase esperando que algo aconteça, sem que façamos algum a ideia do seu passado. É então algo acontece mesmo. O trio de protagonistas fecha-se nas maravilhosas interpretações de uma renascida Sigourney Weaver, igual a ela propria  e com a jovem e promissora Quintessa Swindell, que veremos em breve em ‘Black Adam’, da DC Comics. Em síntese, num mundo com tanta violência, como é que um jardim bem tratado e muitas flores, podem dar tanta esperança ou voltar a acreditar? 

JVM

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