Via 79º Festival de Veneza/'The Eternal Daughter'

79º Festival de Veneza | Tilda Swinton em ‘The Eternal Daughter’

Tilda Swinton ocupou o lugar da realizadora Joanna Hoog em ‘The Eternal Daughter’, um filme de fantasmas sem fantasmas e a obra mais importante deste dia de competição. Mais ainda com o filme ‘Il Signore delle formiche’ do italiano Gianni Amelio. A ‘cowboiada’ das antigas ‘Dead for a Dollar’, o regresso do veterano Walter Hill está fora da competição.

A relação mãe-filha é um dos temas mais recorrentes desta Veneza 79, já abordada pelos italianos Pallaoro e Crialese, respectivamente em ‘Mónica’ e A Immensità’. Porém, neste momento deve haver poucos cineastas britânicos que nos entusiasmem tanto como Joanna Hogg (The Souvenir I e II) e ainda mais neste filme bastante simples mas muito eficaz, intitulado The Eternal Daughter, com Tilda Swinton, a desdobrar-se em dois papéis: mãe e filha. O díptico de ‘The Souvenir’, — em que curiosamente a protagonista era Honor Swinton Byrne, a filha da mãe — foi unanimemente elogiado pela crítica pela crítica internacional e o segundo aliás mais minimalista — e na lista deste seu novo — até mais do que o primeiro filme. É de facto magnífico para esta cineasta de sessenta dois anos, que teve um reconhecimento internacional tardio, chegar agora à competição internacional de Veneza 79. ‘The Eternal Daugther’, conta a história de uma cineasta que retorna à antiga casa da família, agora transformada num assustador hotel, que parece ainda habitado pela sua velha mãe ou apenas uma ilusão? Faz aliás lembrar um pouco ‘Os Outros’ (2001), de Alejandro Amenábar, com Nicole Kidman. ‘The Eternal Daugther’, volta aliás com o díptico, a ser uma história com muitos elementos autobiográficos, onde há dois anos atrás, a realizadora decidiu num hotel assustador, para expiar o seus fantasmas entrelaçando-os com  as suas emoções mais profundas. Todo o filme — do filme dentro do filme — gira à volta do processo criativo de escrever um argumento para o seu novo filme, escolhendo um ambiente ideal que a ajudasse a recuperasse o vínculo que tinha com a sua propria minha mãe. O filme que está longe, de estabelecer um confronto entre mãe e filha pelo contrário, é um retrato muito subtil de duas gerações de mulheres, que de formas obviamente muito diferentes mantinham os seus sentimentos muito resguardados. Ambas vivenciavam a perda sem saberem como ultrapassar essa dor; às vezes, até parecem sentir arrependimento e culpa. Neste sentido, em ‘The Eternal Daughter’ a realizadora parece procurar também expiar a sua própria culpa, numa espécie de  experiência catártica que lhe permitiu, talvez ligar-se ainda mais à sua velha mãe. ‘The Eternal Daugther’ é o resultado disso e ao mesmo tempo uma forma de ultrapassar o muito que ficou por dizer uma outra, o que nos acontece a todos quando perdemos os nossos pais. Os filmes de fantasmas e casas assombradas, são também uma tradição do cinema e da literatura britânica.

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VÊ TRAILER DE ‘THE ETERNAL DAUGHTER’

Gianni Amelio, o realizador italiano do eterno ‘Il ladro di bambini (1992), concorre novamente ao Leão de Ouro com ‘Il Signore delle Formiche’, que começa por volta de 1968, quando o escritor, dramaturgo, filósofo e mirmecologista (estudioso do comportamento das formigas), Aldo Braibanti (Luigi Lo Cascio), é acusado de ‘plágio psicológico’, algo que aconteceu na realidade. Em português não temos, creio esta figura jurídica, mas pode considerar-se próximo de ‘domínio ou influência’ psicológica negativa, sobre determinado indivíduo mais frágil. Mas na verdade, a acusação, cobria o verdadeiro motivo do julgamento: a homossexualidade de Braibanti, uma condição bastantes reprimida e rejeitada nas instituições em Itália dos anos 60, tanto nos meios católicos, como ao nível da esquerda e do próprio Partido Comunista, do qual o intelectual tal com o Passolini acabou dissidente. Ettore (Leonardo Maltese), a suposta vítima de Brabanti, foi internado em um hospital psiquiátrico por seus pais, mesmo tendo mais de 18 anos. Recebeu vários tratamentos de choque para curá-lo pelas suas ‘ideias marxistas’, que eram uma consequência de uma suposta influência maligna de Braibanti. Um jornalista do jornal comunista L’Unità (Elio Germano) tenta reformular a verdade, enfrentando suspeitos e críticas, inclusive das suas chefias.

VÊ TRAILER DE ‘IL SIGNORE DELLE FORMICHE’

Apesar do estilo um tanto ‘novelesco’ e televisivo ‘Il Signore delle Formiche’ é uma história que mantêm actualidade, porque ainda existe muita descriminação, das famílias até mesmo em instituições, como a escola, por exemplo, onde muitos jovens são agredidos (ou sofrem bullying, como se diz agora) verbal e fisicamente, apenas pelo facto de serem ‘diferentes’ e a homossexualidade ser considerada ainda por muitos um desvio. O filme não é apenas sobre a história de Braibanti e do seu amigo Ettore, passa-se naquela época específica, mas trata sobretudo de encorajar aqueles que hoje estão impotentes perante a descriminação e a violência física e psicológica e ajudá-los a sair do armário. Braibanti é muito bem interpretado pelo actor siciliana Luigi Lo Cascio, e o jornalista pelo grande Elio Germano, talvez o melhor actor italiano da actualidade. Mas há também seis novos actores absolutos, como é o caso de Leonardo Maltese, que interpreta Ettore, numa combinação de experiência, talento e naturalismo.

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VÊ TRAILER DE ‘DEAD FOR A DOLLAR’

Walter Hill aos 80 anos é considerado um dos maiores especialistas em filmes de ação, em que a violência é submetida a diferentes graus de estilização, e a busca por efeitos visuais inéditos acompanhados por uma constante experimentação ao nível da linguagem cinematográfica, sem fugir ao mesmo tempo a um certo classicismo. Walter Hill, é efectivamente um realizador de vários films cult, como ‘Os Selvagens da Noite’ (1979), ’48 Horas’ (1982) ou ‘Estrada de Fogo’ (1984), entre outros. Está aqui na Veneza 79, (fora de competição) com o western ‘Dead For A Dollar’ e foi ontem agraciado com o Prémio Cartier Glória ao Cineasta, pouco antes da exibição oficial na Sala Grande à noite. A história narrada neste seu novo filme é inspirada no premiado argumento ‘The Moon of Popping Trees’, de Matt Harris e foi adaptado para para esta ocasião, pelo próprio Walter Hill. Estamos em 1897 e o caçador de recompensas Max Borlund (Christoph Waltz) está vageando por Chihuahua no Novo México. É então contratado por um rico empresário de Santa Fé e a sua missão é encontrar e trazer para casa a sua esposa Rachel Price (Rachel Brosnahan), que foi feita refém e sequestrada por Elijah Jones (Brandon Scott), um desertor, afro-americano fugido do exército.  Enquanto isso, aproxima-se o momento do encontro ou melhor de embate com Joe Cribbens (Willem Dafoe), um jogador profissional, fora-da-lei e inimigo jurado de Max, que o havia mandado para a prisão anos antes. No entanto, quando Max descobre que a mulher realmente fugiu pela sua própria  vontade com Elijah, fugindo de um casamento, onde é abusada pelo marido, Max tem de escolher entre cumprir a missão para a qual foi contratado e que acaba sendo injusta, ou agir por ele mesmo. Enquanto isso, o círculo de implacáveis mercenários ao serviço de um grande proprietário de terras (Benjamin Bratt) ​​e e seu antigo rival Cribbens aperta-se ao seu redor. Max e seu parceiro Alonzo Poe (Warren Burke) não têm nada a ganhar em resistirem à ameaça, nada além da honra e justiça. Uma preciosidade, um regresso ao velho Oeste, mas muito aquém das cenas de tirar o fôlego de outros tempos.

JVM

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