"Como o Grinch Roubou o Natal" | © MGM Animation

Cinema Natalício | Como o Grinch Roubou o Natal (1966)

“Como o Grinch Roubou o Natal,” também conhecido como “How the Grinch Stole Christmas!,” é um dos contos mais intemporais do célebre autor conhecido como Dr. Seuss. Já muitas vezes foi adaptado ao cinema, quer seja em animação ou com atores de carne e osso. Quiçá a versão mais conhecida inclui Jim Carrey coberto de maquilhagem esverdeada, mas não será essa a melhor adaptação da obra. Essa honra recai sobre uma curta-metragem televisiva de 1966, animação esplendorosa do mestre Chuck Jones com canções escritas pelo próprio Seuss. Trata-se de um clássico delicioso que todos deviam ver, uma mini obra-prima.

Theodor Seuss Geisel, mais conhecido como Dr. Seuss, não queria que as suas famosas obras fossem adaptadas ao cinema. Nomeadamente, o artista repudiava a noção que os seus escritos pudessem ser expandidos para o formato de longa-metragem. Só depois da sua morte é que a viúva Geisel autorizou alguns projetos de Hollywood, mas já alguns contos haviam chegado ao pequeno ecrã pela mão do próprio autor. Até hoje, uma série de curtas animadas feitas nos anos 60 e 70 representam o píncaro do universo Seussical em expressão audiovisual. A primeira dessas façanhas aconteceu em 1966, quando Chuck Jones deu nova vida à história do pérfido Grinch.

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© MGM Animation

Os dois homens haviam colaborado antes numa série de curtas em tempo de guerra, as animações do “Private Snafu” que tinham como objetivo educar as tropas. Desde então, o cineasta havia mostrado interesse em adaptar o trabalho do escritor. Só que a sua década de 50 foi passada a redefinir os paradigmas dos desenhos-animados Americanos através do trabalho com os Looney Tunes da Warner Bros. Em meados da década seguinte, a experimentação tinha chegado a novos extremos, com expressividades grotescas e uma estética modernista. Foi nesta situação que os dois homens uniram esforços de novo, entrando em produção deste “Grinch” com financiamento da MGM.

Ao todo, 26 minutos de animação demoraram entre 11 e 14 meses a serem completados, englobando o trabalho de Seuss e Jones, o lendário Boris Karloff como narrador, inúmeros músicos e ainda mais animadores. A história em si desenrola-se de forma fiel ao livro de 1957. Algures no Monte Crumpit que sombreia a festiva Whoville, mora um velho jarreta que detesta o Natal. Verde e peludo, ele detesta o barulho que vem dos Whos e seus festejos incessantes, considerando seu amor pela quadra uma manifestação de materialismo feio. Por isso mesmo, decide o monstro roubar o Natal aos vizinhos, vestindo-se de Pai Natal num trenó puxado por Max, seu infeliz cão e fiel cúmplice. No fim da desventura, ele aprende o verdadeiro significado do Natal e seu coração cresce com amor.

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Em jeito de transposição da página para a TV, praticamente todo o material escrito no livro foi incluído, mas também se fizeram várias adições. Seuss supervisionou o trabalho, escrevendo nova narração e canções inspiradas nos seus típicos esquemas rimáticos. O resultado é um guião obcecado com o trocadilho e jogo de palavras, rico em piadas obscuras e uma dose generosa de arsénico. O sentimentalismo é contrariado pelo humor, seus trejeitos cínicos e mensagem moralista. Há um sentido de alienação linguística que complica o calor natalício, idiomas anárquicos em contradição ao final sacarino. Também se procura a distanciação do esquema religioso, encarando o Natal como um conjunto de valores laicos, mas não por isso amorais. Por outras palavras, é majestoso.

A animação também o é, mas encontra o triunfo por outros meios. Não há nenhuma da delicadeza presente na palavra escrita e nem sequer se preservou bem o estilo ilustrativo de Seuss. Em sua medida, Chuck Jones concebeu um filme de autor com um carimbo pessoal impossível de ignorar, edificando a obra na forma de uma colaboração artística refinada. O humor da escrita é contraposto por humor físico, piadas visuais e desenhos de personagem que salientam a geral estranheza da história e seus preceitos basilares. Nada melhor exemplifica isso que o Grinch em si, seus movimentos, um ballet venenoso, sua cara elástica capaz de se distorcer em caretas legitimamente perturbadoras.

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© MGM Animation

O pano de fundo é igualmente parte do cunho de Jones, mas conjuga alguma da magia ilustrativa de Seuss com suas variações entre grandes vazios e linhas reticuladas. No seu jeito muito próprio, os artistas encontram uma estilização que se afirma enquanto mistura de rigor minimalista com impulsos de maximalismo. O resultado é meio esquizofrénico e por isso eletrizante, decepando a iconografia natalícia sem contrariar suas tonalidades, seus intrínsecos sentimentos e associações apaixonadas. Só o contraste entre o protagonista verde-lima e o céu azul é tão intenso que cega, a paisagem invernal feita em linhas simples e posta em colisão com essa suprema caricatura de rabugice e ódio venal. A variedade cromática é incrível, mas também o são as poses, a transição, o gesto mais singelo tornado espetacular pela mão dos animadores a cargo de Chuck Jones.

Enfim, não podemos deixar de mencionar a música deste especial vencedor de Grammys pela narração e composições. Eugene Poddany não teve crédito por escrito, mas foi ele que coordenou todo o acompanhamento musical, incluindo os interlúdios cantados. Ao todo, aparecem três números chave na curta-metragem: “Welcome Christmas,” “Trim up the Tree” e “You’re a Mean One, Mr. Grinch.” Este último tem sido elevado a estatuto lendário, sendo vocalizado pelo maravilhoso Thurl Ravenscroft. Ao longo da canção, ouvimos uma litania de insultos, enquanto, em cena, o Grinch rouba o Natal aos Who em sucessivas vinhetas belas e divertidas, até um pouquinho sinistras. Tão fantástico é este momento, que qualquer desfeito lamechas em seu seguimento se sente mais merecido, uma flor de felicidade nascida no meio do alcatrão escuro. Desse equilíbrio magistral, emerge este especial de Natal, esta joia de animação, a melhor adaptação já feita aos clássicos literários de Dr. Seuss.

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