Doclisboa 2021 | Da Terra à Lua, em análise
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O Doclisboa 2021 recupera a secção “Da Terra à Lua”, uma pertinente programação não competitiva que atravessa diferentes tempos e espaços. Esta sessão em particular, exibida primeiramente no dia 28 de outubro, pelas 18h30, no Cinema São Jorge, com direito à apresentação por parte de todos os realizadores presentes em sala e posterior discussão.
Aqui apresentam-se três filmes que se situam em geografias distintas – Irão, França, Portugal – mas que se vêm unidos por diversos pontos de contacto, tais como a importância da música para a união entre os sujeitos ou o retrato de comunidades atípicas nas quais os cineastas mergulharam de alma e coração.
São estas aventuras uma viagem compreensiva até ao Bairro da Jamaica, mediante a lente da crise pandémica, uma jornada pelo ativismo nas ruas repletas de proibições de Terrão e ainda a luta de longa data, perpetuada por um grupo de ativistas em França, contra a construção de um novo aeroporto.
DA TERRA À LUA – JAMAIKA
Realização: José Sarmento Matos
O primeiro filme do fotógrafo documental José Sarmento Matos é uma belíssima homenagem aos habitantes do bairro da Jamaica, no Seixal, o infame bairro inacabado, onde os prédios com a tijoleira à mostra são palco de tráfico de droga e outras atividades ilícitas. Munido das palavras de um jovem rapper local, José Matos consegue tirar o foco da criminalidade e dita decadência e recuperar os habitantes deste bairro, dando-lhes caras, nomes e invertendo um pouco do anonimato que faz com que consigamos, coletivamente, enquanto sociedade, ignorar a humanidade dos habitantes deste local com condições deploráveis.
Tal como o filme (e a sua música) os retratam de forma tão incisiva, na sua maioria são cidadãos trabalhadores, que efetuam os seus descontos, que contribuem para o que quer que seja o “bem comum”, muitos deles africanos e que sonhavam encontrar um sonho europeu na região de Lisboa, sonho esse que lhes foi brutalmente retirado com prontidão. Aqui os cidadãos da Jamaica, nesta curta inserida na programação “Da Terra à Lua” entrevistam-se dentro das suas próprias casas através de câmaras cedidas pela Sony. O realizador pretendia que uma maior naturalidade fosse atingida no teor da conversação, removendo-se frequentemente da equação e conseguindo assim resultados mais “puros”.
Este pequeno e poético filme tem também como intuito expor as condições deploráveis que os habitantes do bairro tiveram de enfrentar perante a crise da COVID-19, bem como o seu próprio medo de contágio. Numa casa minúscula e sem condições básicas de higiene, como é possível isolar um potencial membro da família infetado? E sem empregos qualificados, muitos dos membros desta comunidade acabaram, durante esta crise, privados de emprego. Como sobreviver (e viver) neste panorama agudizado? Vivendo também , com a esperança vã, anunciada já em 2018, de que a distribuição de moradias condignas estaria para breve. Com as suas esperanças e astral em baixo, os moradores têm finalmente aqui direito a defender o seu ponto de vista e clamar pelos seus direitos.
Para além da música, e da natureza lírica que atravessa a pequena obra, destaca-se ainda o feliz casamento a que aqui assistimos entre imagem filmada e imagem fotografada, a qua, confere uma estética muito própria a “Jamaika”.
Nota: 90/100
YOU CAN’T SHOW MY FACE
2021 • SUÉCIA • 35’
DA TERRA À LUA – THE SPARK
2021 • SUÍÇA, FRANÇA, ITÁLIA • 60’
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A 19ª edição do Doclisboa continua até dia 31 de outubro, domingo. Já estes três filmes, que nos levam “Da Terra à Luz”, voltam a exibir precisamente no dia 31 de outubro, pelas 21h45, no Pequeno Auditório da Culturgest.
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