House of the Dragon © HBO Max

House of the Dragon, primeira temporada em análise

“House of the Dragon” tem Targaryens, dragões, traições, amores e conspirações. Será que esta fórmula já conhecida de GoT pode sair vitoriosa novamente? É que “Game of Thrones” pode ter tido um final que não agradou a todos os fãs, mas algo ninguém consegue negar: a série é um verdadeiro fenómeno da última década da televisão e coloca uma fasquia bem alta para todas as que surgem a seguir. Especialmente esta que é o seu primeiro spin-off oficial.

I will not bend the knee” parece resumir, numa só frase, o modo de pensar de todos os que são de famílias poderosas de Westeros, o mundo de George R.R. Martin. Não importa a geração, não importa quem está no Trono de Ferro, ou a família a que pertence, haverá sempre este senão: nem todos se ajoelham e nem todos reconhecem o lugar.

Claro que “House of the Dragon” leva esta ideia um bocado além. Afinal de contas, não se trata de uma mera guerra de poder mas sim uma verdadeira guerra civil entre família (bem, entre pessoas que partilham o ADN talvez seja a melhor maneira de colocar as coisas. Família não é necessariamente o que os carateriza).

NOTA: Esta é uma análise sem spoilers dos momentos mais marcantes da temporada, podendo no entanto haver alguns vislumbres do que aconteceu, como referências aos momentos mais chocantes em termos de construção e apresentação de temas.

Lê Também:   House of the Dragon, primeiro episódio da série em análise

Na nossa análise do primeiro episódio fomos muito claros: “House of the Dragon” não procura fazer alusões a “Game of Thrones”, independentemente delas existirem pela clara relação entre casas que perduraram durante séculos até aos eventos que conhecemos da primeira série da HBO. Mas, o que existe, e isso sim está bem claro nesta nova série, é a mítica dos livros de George R.R. Martin. E tiremos desde já do caminho a questão do casting de atores, a cor da pele, ou se é algo credível.

House of the Dragon
“House of the Dragon” ainda não tinha estreado e já enfrentava duras críticas por parte dos fãs devido ao casting de Steve Toussaint como Lord Corlys Velaryon © HBO

Estamos a falar de uma história fantasiosa e que até o autor aprovou e esteve bastante envolvido na criação e desenvolvimento da série. Não há que ter tudo credível de mundo real. Sim, há certos pontos que são inspirados em fatos reais mas.. dragões? Gostam de os ver na série mas sabem que não existem certo? Então, esse é o primeiro ponto para deixarmos de lado muitas das críticas que surgiram pela internet fora. Mais que a cor ou o aspeto, há sim outros fatores que podem influenciar negativamente quem vê a série, e desses falaremos adiante.

Lê Também:   House of the Dragon | Conhece as personagens

Claro que com isto voltamo-nos também para outros pontos muito mencionados e que chocaram audiências, querendo quase censuras. Vamos por partes. Incesto. “Game of Thrones” já nos tinha atirado para este tema com Cersei e Jamie Lannister mas sabem que se vamos entrar no mundo real e fazer comparação, que esse é também um tema real? Aliás, sendo “House of the Dragon” uma história de casas nobres e reais, e que George R.R. Martins se inspira livremente em acontecimentos reais, não é de estranhar que esteja espelhado na história. O fato de Rhaenyra e Daemon acabarem por se casar, ou da sobrinha de Viserys lhe ter sido oferecida em casamento, ainda jovem, não era uma prática tão fora do comum há séculos atrás. Aliás, muitas eram as casas reais que adotavam essa prática para continuar a ‘linhagem pura’. Não queremos no entanto dizer que não se trata de um tema chocante nalguma medida. Sim, a disparidade de idades por vezes é tão gritante que nos faz mesmo sentir aquele cringeworthy moment.

Além disso, se GOT ficou infame pelos casamentos chocantes, o que se realçou em “House of the Dragon” foram mesmo os nascimentos. Os showrunners já tinham sido claros em várias entrevistas que este seria o seu novo foco mas o que ninguém esperava era quão focados estariam. E foi um choque. foi um choque pelo grafismo demonstrado, por um certo toque de “violência” e até pela maneira como as mulheres foram retratadas como meros acessórios nestes momentos (custa escrever, custa ler, mas é a verdade nua e crua do que foi representado).

House of the Dragon
Nesta série não se poupou nas gravidezes. Foram muitas, foram relevantes e foram gráficas e impactantes junto do público. ©HBO Max

Mas, se por um lado estes foram temas que chocaram e fizeram ecoar pela internet fora a popularidade (ou falta dele aos olhos de alguns) da série, há que focar também no core da série, a história dos Targaryen, e como é que ela foi montada e apresentada ao público.

É difícil. Uma adaptação literária é sempre difícil de se fazer e aqui aplica-se aquele conhecida frase de não se conseguir agradar a gregos ou troianos. George R.R. Martin esteve ativo mas mesmo ele manifestou-se nos dias recentes em como gostava de ter começado a história de modo diferente nos ecrãs; o autor gostava de ter voltado ainda mais atrás no tempo, e ter contado uma história dos Targaryen ainda antes de Viserys como rei por exemplo. Mas o que chegou ao ecrã até o agradou perante as opções criadas mas a nós, audiência, teve a sua quota parte de boas e más surpresas.

Lê Também:   House of the Dragon | Os dragões da Casa Targaryen

“House of the Dragon” conseguiu introduzir novamente a fantasia dos dragões de forma exímia. Sem os tornar o centro do enredo, apresentou-os no momento certo, com a majestosidade que mereciam e com um merecido destaque. Por outro lado, uma vez mais a HBO relevou ser um dos melhores estúdios na escolha do elenco. De Paddy Considine a Matt Smith, e sem esquecer os duplos castings para Rhaenyra e Allicent, o forte elenco é um dos melhores pontos de toda a temporada.

Dotados de um talento enorme conseguiram todos eles dar profundidade a personagens que não eram conhecidas do público em geral (não falamos dos fãs dos livros), e que em muitos poucos episódios cativaram a atenção total. E aqui damos especial destaque às jovens Emily Carey e Milly Alcock, especialmente esta última. Como jovens Allicent Hightower e Rhaenyra Targaryen conseguiram criar uma relação próxima instantânea, de química perceptível, e que fez com que os espetadores se agarrassem rapidamente ao seu magnetismo. Inclusive, quase que nos arriscamos a dizer que o que levou a muitas perdas de interesse foi o súbito time jump que nos arrancou estas jovens atrizes do ecrã para darem lugar às suas ‘novas versões’ interpretadas por Olivia Cooke e Emma D’Arcy respetivamente.

House of the Dragon HBO A Guerra dos Tronos Game of Thrones
Milly Alcock foi uma Rhaenrya brilhante, capaz de desviar sempre toda a atenção para si quando entrava em cena. Mesmo em cena com Matt Smith ou Paddy Considine ©HBO Max

Mas, se o casting foi no ponto, o que já não correu bem foi o modo de montagem da história da temporada, e a narrativa idealizada para apresentar aos fãs. Sim, concordamos que a história dos Targaryen, e não, uma temporada nunca seria suficiente (e nem sabemos se as cinco possíveis em cima da mesa o serão), mas também sabemos que há ‘modos’ de fazer as coisas. Os argumentistas infelizmente pecaram por quererem avançar muito rápido em apenas 10 episódios, inviabilizando assim uma narrativa com pés e cabeça onde a história poderia ser acompanhada de forma clara e contínua.

Se Rhaenyra e Alicent envelheceram entre os saltos temporais, os espectadores ficaram confusos, e com razão, com Viserys, Daemon e especialmente Sir Cole. Enquanto que Viserys, ainda que com Paddy Considine a dar-lhe vida, tenha tido um claro envelhecimento rápido, mau e se calhar até em demasia, o resto não se pode dizer da sua família. Na verdade, todos os atores se mantiveram os mesmos menos as princesas e os filhos que entretanto surgiram. E dado o tempo passado é esquisito, muito esquisito. Por isso sim, a maior falha foi o salto temporal e o modo como foi tratado.

Lê Também:   House of the Dragon | As famílias que não conheciamos

O salto temporal foi precoce, apressado e não deu as bases necessárias para o novo episódio. Ficou a faltar informação pelo meio, temas que apenas poderemos descobrir entre linhas ou em eventuais flashbacks. Consequentemente, a aparente relutância em arranjar novos castings também não ajudou. Claro que adoramos continuar a ver Matt Smith a personificar de forma tão elegante e distinta Daemon Thargaryen, ou ver Eve Best a ser a melhor Rainha Targaryen que Nunca Foi, mas não faz sentido. Se ignoramos a escolha de fugir ao livro e escolher um elenco diverso em termos raciais, aqui não podemos ignorar esta falha de coesão na série.

Mas reconhecemos, as qualidades de “House of the Dragon” existem, e não devem ser esquecidas. Vamos considerar, num todo, que a primeira metade da temporada foi quase como um episódio piloto. Até porque foi depois do salto temporal que a série ganhou impulso. Nos primeiros episódios deixámo-nos apaixonar por Milly Alcock, ou por Matt Smith no papel de príncipe renegado e desafiador de regras, mas aquela sensação de GOT só a sentimos mesmo quando já todos eram adultos.

House of the Dragon
“House of the Dragon” demorou a arrancar mas depois do salto temporal, nada fazia parar o ritmo dos episódios © HBO

Se foi bom? Sim, talvez. Deu para manter a atenção presa, ainda que por vezes nos levasse a alguma distração. Porque convenhamos, quem é que não passou a temporada toda a tentar fazer ligações das personagens, especialmente os Targaryen, até Daenerys Targaryen? Spoiler alert: não há ligação direta! Isso mesmo. Tudo o que conhecemos agora está ainda muito distante dos eventos de GOT e talvez nem chegue lá perto. E, apesar do melhor terem sido os atores, que nos cativaram a continuar a ver as personagens, há que realçar que as personagens ainda não estiveram à altura de GOT.

Sir Cole foi uma desilusão. Ignorando a parte do não recasting, o modo como foi construído e apresentado levou-nos rapidamente a sentir um desdém por ele, que se revelou mesquinho e ‘pequeno’. Por outro lado, Alicent, que se aparentava ingénua, foi-se mostrando como uma ‘jogadora nata’ no mundo da política, fazendo crescer um certo sentimento de ódiozinho de estimação. Alguém por aí também sentiu uma certa vibe de Rainha Mãe semelhante a Cersei Lannister? Nós sentimos. Mas infelizmente não foi forte o suficiente para a entendermos e nutrirmos até uma certa admiração pela sua presença.

House of the Dragon
©HBO Max

Outras, ainda que não tenham sido detestáveis, ficaram-se por pouco. Mysaria pouco ou nada fez, Ser Harrold Westerling foi passando pelos pingos da chuva, e até Larys Strong se revelou ‘pequeno’ para o tipo de personagem de mentiras e conspiração que retratava. Esperávamos mais porque se houve algo que GOT conseguiu foi fazer-nos apaixonar pelas personagens num todo. Aqui, como se disse, o elenco num todo é excepcional. Já as personagens em si ficaram muito em falta. Faltou um género de Tyrion Lannister que nos fizesse querer ouvir os seus monólogos, faltou-nos um Littefinger realmente ativo nas teias de conspirações do reino, faltou alguém que fosse genuinamente bom como Jon Snow, ou uma força destemida e sedenta de poder como Cersei Lannister para amarmos odiar.

Emma D’Arcy, Matt Smith e Eve Best deram-nos as personagens mais consistentes – Rhaenyra, Daemon e Rhaenys – mas soube a pouco para já. Foi um bom começo, mas em ponto muito pequenino.

Lê Também:   House of the Dragon | Mini-entrevista a Miguel Sapochnik

No entanto uma série não se faz apenas de história e pessoas e “House of the Dragon” teve ainda uma grande falha: a falta de equilíbrio em termos de imagem. Não houve um tom claro do primeiro ao último episódio, e os episódios mais carregados e escuros não são de todo o agrado do público e, talvez por também não terem um teor tão carregado, ficaram completamente fora do contexto e fizeram a série descer um pouco no patamar de excelência a que se podia ter proposto.

Não obstante, no geral, “House of the Dragon” é uma força a ser reconhecida. Os figurinos voltam a destacar-se (não venham com a história das perucas. Se vamos por aí nós pegamos no argumento que não há assim tanta gente com cabelo branco na totalidade, muito menos crianças), o elenco é de qualidade extrema e a história é rica. Muito rica. O segredo agora para continuar a bater recordes? Diríamos que apenas mais coesão na equipa de escritores e showrunners. Tem de haver um rumo definido e talvez seja George R.R. Martin que devesse dar mesmo a última palavra.

House of the Dragon
Os dragões foram um dos pontos altos da série e ainda que com pouca presença para já, deixaram sempre a sua marca na mente dos fãs pelo magnífico trabalho de CGI e efeitos especiais © HBO Max

A história é interessante o suficiente para continuar, independentemente se é focada apenas nos Targaryen, mas tem de ser bem contada. De nada vale estender a série se depois não há storylines que se possam seguir, ou se depois o final acontece de forma abrupta e (muito!) apressada como aconteceu com a oitava temporada de GOT. O universo de George R. R. Martin é rico e merece uma adaptação cuidada.

Foste devorando todos os episódios à medida que saiam? Qual o teu veredito sobre esta primeira temporada?

  • Marta Kong Nunes - 80
80

CONCLUSÃO

“House of the Dragon” é uma série cativante, do início ao fim, e independentemente das suas falhas. Ainda tem muito a percorrer para chegar ao ponto de “Game of Thrones” mas para lá poderá caminhar se as temporadas futuras se ajustarem na storyline certa. Mais do que a história, a série ganha e muito com o brilhante elenco escolhido a dedo que, mesmo com poucas falas ou poucos episódios, conseguem deixar claramente a sua marca na memória das audiências.

Pros

  • A prestação da jovem Milly Alcock conseguiu cativar desde o primeiro instante como uma jovem Rhaenyra;
  • Matt Smith, que não foi um homem de muito diálogo na série, conseguiu sempre roubar o protagonismo em qualquer cena presente;
  • O elenco de uma forma geral revelou-se acertado para todas as personagens;
  • Os figurinos;
  • Uma história base definida, que já tem um rumo traçado e que pode ser a base para uma longa série bem adaptada.

Cons

  • Houve faltas de saltos temporais, criando sensações de vazio entre episódios para explicar certa situação ou relação;
  • A falta de aparente critério na evolução das personagens, nomeadamente a idade e aspeto nos saltos temporais (e consequentemente falta de mudança de casting);
  • Falta de coesão e definição de tom no episódio e a sua cinematografia, criando imagens escuras e desnecessárias;
  • Os momentos chocantes não foram muitos mas numa temporada foram o suficiente para afastarem muito o público da história em si, focando-se mais nessas questões isoladas.
Sending
User Review
3.29 (7 votes)

Leave a Reply