"Los Fuertes" | © Queer Lisboa

Queer Lisboa ’20 | Los Fuertes, em análise

A 24ª edição do Queer Lisboa já teve início e vai durar até dia 26 de setembro. O filme de abertura foi “Los Fuertes”, segunda longa-metragem do chileno Omar Zúñiga Hidalgo. Trata-se de um romance melancólico que nos recorda o famoso “Weekend” de Andrew Haigh ou, talvez, a trilogia “Before” de Richard Linklater.

“Los Fuertes” é um filme sobre a busca da liberdade. É também uma história sobre o seu custo. Lucas, que vive na capital chilena de Santiago, quer livrar-se de um país que muita infelicidade lhe trouxe, a pátria de pais que o rejeitam, quiçá pela sua sexualidade. Para ele, a emigração é salvação na senda de uma bolsa de estudos ganha por mérito próprio. Lucas vai para o Canadá, mas, antes de partir, decide visitar quem da sua família ainda lhe nutre afeto.

Em Valdivia, cidade costeira do Chile, vive a irmã dentista desse jovem. Tal como os laços entre seus pais e irmão esmoreceram, também a relação da senhora e seu marido parece perder fôlego a cada dia que passa. Estranhamente, é junto ao mar, nessa terra de corações partidos, que Lucas encontra quem lhe conquiste o coração e excite o sexo. Ele é Antonio, um pescador encruzilhado num caso adúltero e muito infeliz com um colega de trabalho casado.

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© Queer Lisboa

Se Lucas procura liberdade, também Antonio o faz. Só que, na mesma medida que um homem vê o caminho para a liberdade traçado na emigração, o outro encontra-o na independência financeira. Roco quer ter seu próprio barco de pesca e deixar de ter seu emprego à mercê do ex-amante rabugento. Aí se veem diferenças de classe e de personalidade também, barreiras que separam os homens ao mesmo tempo que a emoção e o desejo os unem. É evidente, contudo, que qualquer romance entre os dois será de curta duração.

Na sua visita à irmã, Lucas conhece Antonio e os dois envolvem-se, mas os dias do amor estão contados e a viagem para o Canadá é a data limite. O fado infeliz não impede os dois homens de se deixarem seduzir, revelando intimidade e vulnerabilidade um ao outro. Ao início, eles acanham-se, tentam proteger seus corações, mas o desejo é forte demais e os homens caem na cama um do outro. Não só a sua química é espetacular, como a felicidade que trazem à vida do outro remete para a euforia total.

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Apesar de filmar a obra num registo de naturalismo cru e casual, Omar Zúñiga Hidalgo jamais descura na exacerbação da folia e do prazer. Em interlúdios dançantes e eróticos, o realizador imerge o espetador no êxtase de dois homens solitários que encontram preciosa companhia por uns escassos dias. Assim entendemos como eles quebram a rotina um do outro, como despertam novas felicidades e novo prazer. Queremos que eles fiquem juntos, mas sabemos que isso é impossível.

O conto destes dois amantes é tão fechado, tão predefinido e necessariamente previsível, como as recriações históricas que se encenam nos monumentos de Valdivia. Aí, dramatiza-se a luta pela independência chilena e Antonio, em folga da pesca, dá vida a alguns dos heróis nacionais do passado. Tal como eles, ele quer independência. Ao mesmo tempo, Lucas só observa a luta, flutuando pelo teatro belicoso como um espetador passivo, mais interessado em fugir do que em lutar. Ou talvez a fuga seja, em si, um tipo de luta pela liberdade.

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© Queer Lisboa

Tal colisão do sonho ideal e da realidade dura confere uma névoa de melancolia ao filme. “Los Fuertes” é uma obra de coração pesado que se vai deixando voar pela inspiração do romance. Traçam-se guerras da intimidade, pequenos combates pela confiança do outro, batalhas lutadas pelo privilégio de ver o verdadeiro eu de outra pessoa. Não tem grande dramatismo, mas as tensões da história doem como sumo de limão libado sobre uma ferida aberta. É humilde, mas forte, simples em estrutura, mas complexo em sentimento. É, acima de tudo, um filme que transpira honestidade e jamais sacrifica o realismo pelo espetáculo.

Los Fuertes, em análise
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Movie title: Los Fuertes

Date published: 19 de September de 2020

Director(s): Omar Zúñiga Hidalgo

Actor(s): Samuel González, Antonio Altamirano, Marcela Salinas, Rafael Contreras, Nicolás Corales, Luis Montoya

Genre: Drama, 2019, 98 min

  • Cláudio Alves - 70
70

CONCLUSÃO:

“Los Fuertes” seduz sua audiência com um conto de romance passageiro, de amor efémero que floresce no advento da mudança. Modesto e casual, realista e cru, mas delicado, o filme de Omar Zúñiga Hidalgo agrada, mas jamais surpreende ou desafia o espetador. De modo geral, é uma bela maneira de começar o Queer Lisboa deste ano.

O MELHOR: A química vibrante entre os atores principais. Samuel González e Antonio Altamirano como Lucas e Antonio são perfeitos, subtilmente invocando ideias de desejo sublimado, dúvida romântica e tristeza dançando com euforia.

O PIOR: Quão esboçadas e indefinidas as personagens secundárias são. Para um filme com tanta empatia para com os seus protagonistas, desejávamos que as vidas na periferia do enredo fossem mais valorizadas.

CA

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