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O Crime do Padre Amaro, primeiras impressões

Considerada uma das obras que melhor retrata e satiriza o século XIX, “O Crime do Padre Amaro” tem uma nova versão adaptada à televisão e o resultado conta com aspetos deveras positivos.

No século XII, o Concílio de Latrão definiu que os sacerdotes deveriam praticar o celibato, ficando-lhes interdito o direito ao matrimónio ao mesmo tempo que a abstenção sexual deveria ser praticada a partir do momento em que um padre assume o compromisso com a Igreja. Apesar de esta ser uma exigência do sacerdócio até aos dias de hoje, a lei nem sempre tem vindo a ser cumprida, havendo muitos padres que acabam por viver em pecado. Como tal, em 1875 Eça de Queirós denunciou estas infrações ao publicar “O Crime do Padre Amaro”, uma obra que acabou por desafiar a própria Igreja, gerando uma enorme consternação na sociedade. A mestria do escritor português acabou mesmo por se tornar numa verdadeira sátira à sociedade da época.

Sendo ainda hoje um tema considerado delicado para os fiéis católicos, “O Crime do Padre Amaro” acabou por ter apenas duas adaptações cinematográficas, sendo ambas uma versão mais contemporânea da obra de Eça de Queirós. Porém, dois séculos volvidos, Leonel Vieira decidiu apostar no desenvolvimento de uma série que acaba por ser um retrato fiel do livro do aclamado escritor. Trata-se de um conjunto de seis episódios que retratam uma época distante, mas atual, e que podem ser vistos na RTP Play.

O Crime do Padre Amaro
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Embora a nova adaptação de “O Crime do Padre Amaro” esteja dividida em seis capítulos, um plano geral da narrativa é nos apresentado logo no primeiro episódio. Na verdade, mal se inicia a ação toma-se desde logo conhecimento de que um novo padre deverá chegar à paróquia dado o falecimento do pároco precedente em pleno ato obsceno com uma prostituta. Como tal, os primeiros minutos de vídeo dão-nos uma pequena visão do tema central da narrativa. Do mesmo modo, torna-se demasiado óbvio que mal Amaro se hospeda no lar de São Joanina este fica incapaz de de tirar os olhos da inocente Amélia. E em apenas 50 minutos de episódio, o Padre acaba mesmo por cair na tentação de beijar a jovem rapariga, mostrando que nem ele se livrará de dar continuidade aos pecados cometidos pelo clero daquela paróquia. E claro está, o primeiro capítulo desta minissérie mostra bem as heresias cometidas pelos restantes sacerdotes que afirmam bem afincadamente que todo o ser-humano tem as suas necessidades íntimas.

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Olhando mais a fundo para a obra de Leonel Vieira, é de louvar a qualidade e riqueza dos pormenores desenvolvidos para recriar todo o cenário e guarda-roupa do século XIX. Tendo Leiria como cenário, torna-se quase impossível percepcionar que a minissérie foi gravada nestes dias, existindo uma grande atenção ao detalhe. Desde o chão coberto de terra a imitar uma época em que a ausência de calçada era total a uma casa recheada de objetos como uma pia e um penico em que é visível o momento em que este é despejado, a construção do cenário é um fiel retrato de um século passado, o que nos facilita a imersão na cena. Do mesmo modo, as roupas e a caracterização das personagens merece também um destaque, pelos penteados das senhoras, bem como as vestes que são utilizadas nos vários atos. Notavelmente, as indumentárias sacerdotais utilizadas são exatamente as mesmas usadas no século XIX, mantendo elementos que entretanto caíram em desuso.

O Crime do Padre Amaro
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Para terminar, importa também realçar o comportamento dos atores selecionados para o elenco de “O Crime do Padre Amaro”. Talvez por serem um verdadeiro casal fora dos ecrãs, a química existente entre José Condessa e Bárbara Branco, os protagonistas desta minissérie, é brilhante. Ao olharmos para a dupla, evidenciamos um brilho no olhar e um desejo interno que acaba por ser revelar deveras genuíno. Do mesmo modo, o destaque deve também realçar a representação de Filomena Gonçalves que adota uma postura digna da época, recorrendo a um tom de voz exatamente na medida certa. Com tudo isto, pouco se pode acrescentar ao trabalho de José Raposo que, como já é hábito, mantém o brio que lhe é tão característico. Além disso, importa também mencionar o personagem construído por Diogo Martins que conseguiu dignificar e respeitar a essência de Libaninho.

TRAILER | O CRIME DO PADRE AMARO É A MAIS RECENTE OBRA DE LEONEL VIEIRA

Tens acompanhado a série “O Crime do Padre Amaro”? O que pensas da nova obra de Leonel Vieira?

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