As abelhas são uma metáfora para as questões de identidade e diversidade. ©73ª Berlinale

73ª Berlinale | 20.000 Especies de Abejas: Em Busca da Identidade

O fascinante ’20.000 Especies de Abejas’, uma primeira obra da realizadora basca Estibaliz Urresola Solaguren, é o filme que tem colhido mais elogios, vindos de todo o lado, para além de ser para já o mais forte candidato ao Urso de Ouro 2023. Veremos?

As crianças têm sido as grandes protagonistas dos filmes desta 73ª edição da Berlinale — já aconteceu ontem com Tótem. Em ’20.000 Especies de Abejas’, uma primeira-obra da realizadora basca Estibaliz Urresola Solaguren, volta a ser uma criança de oito anos a figura central de uma luta interior, e as abelhas como uma metáfora à biodiversidade da Natureza e à questão da identidade sexual. Aliás, o filme de Solaguren é também um hino à diversidade, que nos ajuda a explicar muitas coisas através da imagem de uma família convencional. Uma criança de oito anos sofre muito porque as pessoas ao seu redor, insistem em chamá-la pelo nome de nascença: Aitor. O seu apelido, Cocó, não lhe parece totalmente errado, mas também não o sente como o mais apropriado para si. As crianças e mãe Ane (Patricia López Arnaiz) vão de férias de verão, para o País Basco, para as origens, onde vive a avó Lita (Itziar Lazkano) e a tia-avó Lourdes (Ane Gabarain), para a casa da família, que está intimamente ligada à criação de esculturas e à produção de mel.

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20.000 Especies de Abejas
Uma criança de oito anos é a figura central de uma luta interior. ©73ª Berlinale

É neste contexto que a criança acaba por confidenciar a sua dor e inquietação, aos seus parentes e amigos mais próximos. Porém, a sua mãe, que ao mesmo tempo luta também com o fardo parental ambivalente e com uma crise pessoal e profissional, acaba por ter alguma dificuldade em lidar com essa busca de identidade do seu pequeno filho. Esta estreia nas longas-metragens da realizadora basca Estibaliz Urresola Solaguren é efectivamente um trabalho luminoso e maravilhosamente sensível, protagonizado pela pequena Sofía Otero, que aparece pela primeira vez na frente das câmaras. A pequena, interpreta uma criança que tenta encontrar o nome certo (ou a sua identidade sexual), no meio de uma família em decomposição e de uma mãe problemática, mas amorosa, que parece hesitar em confrontar-se com a realidade. Assim como a diversidade da natureza exige muitas abelhas, as personagens secundárias deste filme emblemático sobre uma questão contemporânea, são essenciais para a evolução da protagonista, sobretudo a tia-avó uma mulher livre, independente e de mente aberta, mas também dos irmãos. O ambiente predominantemente feminino é um exemplo para a criança do que são as diferentes maneiras de ser mulher.

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20.000 Especies de Abejas
Apesar do amor, a mãe tem dificuldade em lidar com a busca da criança. ©73ª Berlinale

Urresola assume mais do que uma perspectiva, mostrando que a identidade de género é algo escandalosamente complexo e não se resolve apenas de uma forma médica ou cirúrgica. ’20.000 Especies de Abejas’, aborda um aspecto talvez menos óbvio da transição de género: a mentalidade ou melhor como funciona a cabeça do indivíduo, e neste caso a de uma criança, e a das pessoas que o rodeiam. Não esquecendo a forma como isso pode ajudar ou complicar o processo. Logo no início do filme há uma fronteira geográfica e uma fronteira mental, que fala das dificuldades que temos para superar certas crenças dos nossos antepassados e das pessoas que vieram antes de nós. E isso é essencial para a evolução deste filme belíssimo, passado entre colmeias e flores, que explora a identidade do lado das mulheres — a dada altura passa do ponto de vista da criança, para o da mãe — da família, ao mesmo tempo que reflete sobre as suas próprias vidas, desejos e expectativas. É um dos grandes candidatos ao Urso de Ouro 2023 e caso se venha a confirmar seria o segundo consecutivo, para o cinema espanhol.

JVM, em Berlim




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