©Rai

‘Dão Licença? Alberto Sordi’, em análise

‘Dão Licença? Alberto Sordi’, é um filme do cineasta italiano Luca Manfredi, interpretado por Edoardo Pesce, que retrata o início menos conhecido da carreira do ator e cineasta italiano Alberto Sordi (1920-2003). Para ver na RTPlay.

Este filme, ‘Dão Licença? Alberto Sordi’ de Luca Manfredi (realizador praticamente de telefilmes e filho do comediante Nino Manfredi), passou algo despercebido na RTP2, no domingo passado quase à hora do jogo da Taça de Portugal, liga-nos de imediato a uma dos filmes da carreira do actor e cineasta italiano. Trata-se aliás de um filme-homenagem que assinala o centenário do nascimento de Alberto Sordi. ‘Dão Licença? Alberto Sordi’, não é uma obra-prima, aliás é um filme ligeiro e despretensioso, feito para grandes audiências, mas vale a pena recuperá-lo na RTPlay, sobretudo para os mais jovens para se relacionarem com a figura de um dos grandes cómicos do século XX. Alberto Sordi, depois de ter sido porteiro do Hotel Continental e expulso da Accademia dei Filodrammatici de Milão, regressa a Roma, à casa da família, para continuar a tentar trabalhar no cinema: são os anos do fascismo italiano, que procura celebrar as glórias da Roma Antiga. É nesta Roma à beira da II Guerra Mundial, com a Itália alinhada com as potências do Eixo, que Sordi conhece Federico Fellini. Apesar também de uma resistência inicial, vai acabar por colaborar com grande sucesso com o ator e realizador Vittorio de Sica.

Lê Também:   Netflix em Maio | Os Filmes que queremos ver

VÊ TRAILER DE ‘DÃO LICENÇA? ALBERTO SORDI’

Na convincente interpretação de Edoardo Pesce (vimo-lo em ‘Dogman’, de Matteo Garrone) no papel de Alberto Sordi reconhecemos logo aquelas características físicas muito particulares, do grande actor italiano: o seu inconfundível jeito de andar, que parece uma pequena corridinha e aquele famoso salto, com os dois pés. Em ‘Dão Licença? Arberto Sordi’, o realizador Luca Manfredi, enfoca as dimensões pública e privada do ator romano, traçando a sua trajetória, durante cerca de 20 anos: desde a segunda metade da década 30, quando foi expulso da Academia Interina dos Filodrammatici de Milão, por causa do seu inconfundível sotaque romano, até o sucesso obtido com a desvairada comédia ‘Um Americano em Roma’ (1954), dirigida por Steno. Nesse entretanto, Sordi como figurante, foi expulso das filmagens de ‘Cipião, O Africano’ (1937), pelo realizador Carmine Gallone, por se fazer engraçado, numa pequena fala; mas aos poucos foi-se tornando conhecido por fazer a dobragem em italiano da voz de Oliver Hardy (de ‘Bucha & Estica’) e ao mesmo tempo na rádio, com a personagem de Mario Pio. Teve um relacionamento amoroso com a então famosa atriz Andreina Pagnani. No início da década de 1940, conheceu Federico Fellini, que mais tarde o dirigiu em ‘O Sheik Branco’ (1952) e no famoso ‘Os Inúteis’ (I vitelloni), de 1953 e permaneceram amigos para toda a vida.

Alberto Sordi
©Rai

A fórmula de ‘Dão Licença? Alberto Sordi’, é muito semelhante ao filme biográfico que Manfredi dedicou ao pai Nino Manfredi (1921-2004), intitulado em ‘In arte Nino’, um telefilme de 2017, interpretado por Elio Germano: os difíceis começos de uma carreira até o limiar do sucesso. Como foi aliás o percurso de Sordi, que em tudo dependeu essencialmente dele próprio, num verdadeiro exemplo de insistência e superação. O actor Edoardo Pesce entra perfeitamente na personagem de Sordi e felizmente sem exagerar na imitação: recupera o olhar, expressões faciais, voz e sobretudo a sua determinação e sua subtil melancolia. O filme concentra-se igualmente no estreito vínculo de Sordi, com a sua família e, em particular, na relação algo dependente e até mórbida com a mãe. Aliás, há uma cena em que Sordi, logo após a morte da mãe, fecha-se sozinho no quarto com o corpo por uns tempos, não deixando entrar ninguém, nem mesmo os agentes funerários. 

Alberto Sordi
©Rai

Existiriam certamente muitas mais histórias e anedotas, provavelmente até mais úteis e divertidas, para apresentar Sordi ao público mais jovem. Porém o retrato, mesmo que correto e desenvolto, é um tanto pálido e sem grandes contradições, no que diz respeito ao seu carácter: Sordi é sempre visto como um ‘gajo’ porreiro e divertido. Há aliás uma cena, enquanto discute na Villa Borghese com Andreina Pagnani, que reflecte este aspecto simplista e sem tensões, do filme de Manfredi: a actriz está a ler um guião para o papel da Irmã Simplicia em ‘Os Miseráveis’ (‘I miserabili, 1948)’, de Riccardo Freda. Sordi por outro lado, não consegue entrar como actor no cinema. Depois da conversa, Andreina diz-lhe: ‘Se o cinema não te quer, a culpa não é minha’. A tensão permanece apenas na escrita e o filme apenas a reproduz com uma certa leveza o conflito, aliás como posteriormente o fim da relação sentimental, entre os dois.

Alberto Sordi
©Rai

O filme passa muito ao de leve pelas polémicas, pelas zonas de sombra do ator. A história, o fascismo, as sua entrada das tropas aliadas em 4 de junho de 1944, na banda do Exército como tocador de pratos, com uma ‘cunha’, do pai para escapar à frente de batalha, permanecem principalmente como um adereço narrativo, nada aprofundado. Mas, acima de tudo, faltam rostos e personalidades fortes, a começar pelo próprio Federico Fellini, que aparece também e apenas como um ‘gajo’ simpático, sorridente, com talento para  desenhar e escrever guiões, num retrato quase à beira de uma caricatura; e mesmo a figura de Vittorio De Sica, que não recebeu Sordi, nem sequer o deixou entrar na sua casa, para não lhe ‘interromper o fluxo criativo’ quando afinal, estava a jogar às cartas com os amigos. A história de Alberto Sordi não está lá toda embora se note a preocupação de chegar tanto quanto possível aos detalhes, só que estamos apenas no domínio de um mero telefilme de pouco mais de 1h30.

Dão Licença? Alberto Sordi, em análise
Alberto Sordi

Movie title: Permette? Alberto Sordi

Date published: 25 de May de 2021

Director(s): Luca Manfredi

Actor(s): Edoardo Pesce, Gennaro Cannavacciuolo, Sara Cardinaletti, Giorgio Colangeli, Paola Tiziana Cruciani, Francesco Foti, Martina Galletta, Paolo Giangrasso, Michela Giraud, Pia Lanciotti, Alberto Paradossi.

Genre: Ficção, 100 minutos, 2020

  • José Vieira Mendes - 60
60

CONCLUSÃO:

‘Dão Licença? Alberto Sordi’ é um biopic em jeito de homenagem sobre o inicio da carreira do grande cómico italiano Alberto Sordi. O filme não é uma obra-prima  exemplar, mas é bem feito (sobretudo muito bem interpretado por Edoardo Pesce) e até parece de facto um daqueles velhos dramas vintage, com uns certos toques nostálgicos do cinema clássico italiano. É feito mais para informar e educar os espectadores, do que propriamente para apaixonar um cinéfilo dos mais pesados. Mas vê-se sem agonias e sem termos a sensação de estar a perder o nosso tempo. E depois Sordi será sempre Sordi!

O MELHOR: A interpretação de Edoardo Pesce é bastante boa e convincente, sem ser uma mera imitação;

O PIOR: O retrato do ator romano, ainda que cheio de anedotas e pequenos detalhes, parece algo pálido e permanece quase sempre na superficialidade.

JVM

Sending
User Review
3.67 (3 votes)
Comments Rating 5 (1 review)

Leave a Reply

Sending