"Doutor Sono" (2019) |©NOS Audiovisuais

Doutor Sono, em análise

“Doutor Sono” (2019), dá continuação ao universo de “Shining” (1980). Não funcionando exatamente como uma sequela no sentido mais tradicional, continua a história original a partir do ponto de vista de Danny Torrance 40 após os acontecimentos originais do primeiro filme. 

Esta sequela de um filme original de 1980 conta com realização e argumento de Mike Flanagan, realizador de obras como “The Haunting of Hill House”, “Hush” ou “Before I Wake” (2016). Flanagan é assim um bem-sucedido autor dentro do género do terror e mistério, e com “Doutor Sono” continua a explorar essa sua veia. Contudo, há que dizer que esta longa narrativa é mais um mistério do que um assustador regresso ao mundo de Stephen King.

doutor sono
Reconstituição das cenas originais de “Shining” (1980) |©NOS Audiovisuais

“Doutor Sono” conta-nos a história de Danny Torrance, que agora dá pelo nome de Dan, 40 anos após os traumáticos eventos que levaram à morte do seu pai no Hotel Overlook, quando tinha apenas 5 anos. O filme é protagonizado por Ewan McGregor e apresenta-nos o resultado da negligência, violência e trauma de infância. Danny teve um início de vida difícil e o seu talento especial, a sua “magia, o “shining”, ou o seu “brilho”, não deixaram de lhe dificultar a vida. Dan tenta, no presente, não utilizar o seu poder especial, mas é atormentado e herda o vício do alcoolismo do seu pai. Vemo-lo à medida que decide escolher maus caminhos, repletos de vício.

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O filme apresenta-nos literais fantasmas do passado, à medida que através de flashbacks recuperamos o que aconteceu a Wendy e Danny depois de abandonarem o Hotel Overlook. É bastante estranho, ver reconstruída a narrativa no passado, em 1980, com atores diferentes. Parece algo bizarro, e é-nos impossível entrar completamente neste lógica, talvez devido ao carácter imortal que os interpretes originais atingiram já.

Doutor Sono
O Nó |© NOS Audiovisuais

Dan tenta ao máximo atingir uma nova vida, criar algo novo no qual os seus vícios fiquem no passado, e também sem auxílio do seu “shining”. Contudo, a narrativa deste thriller sobrenatural tem outros objectivos. Dan encontra, nos recantos da sua mente, a muitos quilómetros de distância, a adolescente Abra, uma corajosa jovem com poderes bem especiais.

Eis que somos introduzidos a um grupo, bem, quase a um culto, que dá pelo nome de “The True Knot” ou simplesmente “O Nó”. Estes seres semi-humanos são chefiados por Rose (Rebecca Ferguson), a bela vilã da história. O Nó é composto por pessoas que têm também elas capacidades especiais, e que decidem aplicá-las da mesma forma. Ao perseguirem aqueles que partilham do seu poder, este grupo, que não é único no mundo, vai adquirir a capacidade de se alimentar da energia de terceiros para conseguir alcançar um vislumbre de imortalidade.

Quando Rose e o seu grupo se apercebem da existência de Abra, e do seu imenso poder, cabe a Dan ajudar a salvá-la. E é aí  que se vê obrigado a confrontar os fantasmas do seu passado, os quais tinha já fechado em “caixinhas”, ou antes caixões. O Overlook volta à linha do horizonte, em toda a sua glória numa nova mas igualmente mortífera manifestação. As gémeas estão de volta, o quarto 237, o sangue que sai dos elevadores, os mordomos, tudo…

Doctor Sleep
O labirinto do Overlook recebe novos visitantes em 2019 |©NOS Audiovisuais

“Doutor Sono” ou “Doctor Sleep”, no original, apresenta uma narrativa bem distinta da de “Shining”, em termos de estrutura e forma de apresentação dos seus pontos centrais. “Shining” vence pela importância dada ao suspense, aquilo que fica por ser dito, à sugestão, ao mistério, ao clima de cortar a faca. Ora, “Doutor Sono” é muito mais evidente, preto no branco, a história é aquilo que é, não há muito espaço para dúvida. Ao longo do filme, ficamos com todas as certezas sobre exactamente o que é o “brilho”, o que quer este novo grupo, o que podem fazer para atingir os seus fins, e quais as formas de contra-atacar. Tudo é dito, todos os pontos são colocados nos “i’s”, sem grande mistério.

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Não é uma má narrativa, mas é uma bem mais simplista e com menos possibilidade de se tornar num fenómeno de culto. Embora verdade seja dita, tal confirmação só possa ser feita pelo teste do tempo. Ao fim de contas, “Shining” foi arrastado na praça pública aquando da sua estreia original.

Independente disso, esta é uma narrativa mais simples, mais directa, mais fechada dentro de si mesma e mais “mental”. Tudo se trata das lutas que conseguimos travar com a nossa mente, e os mecanismos de defesa que a mesma é capaz de accionar. Muitos são os truques, os pequenos detalhes que criam algum sentido de surpresa ao longo do filme, e que resultam sem grandes falhas.

Esteticamente, não é tão impressionante quanto a sua história mãe. A palete, típica de um filme de terror, é bastante escura, e as partes que mais nos trazem satisfação são aquelas em que recuperamos o Hotel e toda a sua mise-en-scène. Não necessariamente por estes serem os melhores cenários, mas porque a nostalgia é um sentimento forte, e o motivador número 1 para sequelas e remakes.

Doutor Sono
De volta ao Hotel Overlook |©NOS Audiovisuais

“Doutor Sono” deve mais talvez a “Before I Wake”, drama sobrenatural de terror realizador por Flanagan sobre um miúdo capaz de dar vida aos seus sonhos e pesadelos e materializá-los para todos verem. Sim, esta obra é baseada num livro de Stephen King que recupera o universo de “Shining”, mas indepedentemente disso, é evidente quem criou este filme, alguém que tem vindo a desenvolver uma clara marca de autoria.

“Doutor Sono” é uma narrativa banal mas agradável, que responde a muitas perguntas que possam ter ficado por responder desde a obra original a que procura dar continuidade. Ewan Mcgregor é aqui uma convincente atormentada versão adulta de Danny Torrance. 

Doutor Sono
Doutor Sono

Movie title: Doutor Sono

Date published: 3 de November de 2019

Director(s): Mike Flannagan

Actor(s): Ewan McGreggor, Rebecca Ferguson

Genre: Terror, Suspense , Sobrenatural

  • Maggie Silva - 75
  • Inês Serra - 50
63

CONCLUSÃO

Uma sequela que fracassa como filha de “Shining”, mas que resulta como uma história quase separada de seu direito.

O MELHOR: A recuperação e reconstituição de um popular universo, o desenvolvimento da narrativa que conhecemos há tantos anos.

O PIOR: O surgimento de um outro ator a desempenhar o papel de Jack Torrance é demasiado para a imaginação do espectador. O que nos leva ao pior problema desta “sequela”: nada fica entregue à imaginação.

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