EFA 2017: Seis Prémios Que Arredondaram ‘O Quadrado’

Sem grande surpresa o filme sueco, ‘O Quadrado’ de Ruben Östlund, em cartaz nas salas nacionais, foi o grande vencedor dos 30º European Film Awards (EFA), conseguindo seis galardões, tantos para quanto estava nomeado, mais o de cenografia já anunciado. Soa um pouco a exagero tendo em conta a qualidade excepcional dos cinco nomeados a Melhor Filme nesta trigésima edição dos (Prémios dos Cinema Europeu).

Ruben Östlund era ontem um cineasta, ‘terrivelmente contente’ com o número de prémios recebidos — Melhor Filme, Comédia, Realizador, Actor (Claes Bang), Argumento e ainda o galardão técnico pelo Design de Produção ou Cenografia — anunciado previamente — , por O Quadrado, tantos quantos as nomeações (5); e em jeito não se sabe se de brincadeira ou a sério declarou aos jornalistas antes da cerimónia acontecer, de que iria ganhar tudo. E assim aconteceu! Foi igualmente com grande espectáculo que celebrou os prémios na gala de sábado passado — como aliás já o tinha feito quando recebeu a Palma de Ouro em Cannes — ‘não só por ter ganho tudo’, como acabou naturalmente por dizer, mas por ter experimentado um sentimento de ‘comunidade’: ‘Sinto-me de certo modo envergonhado, não sei se merecíamos tanto’, disse-o depois de ter recebido o Prémio de Melhor Filme. Ruben Östlund desejou que estes prémios possam ser ‘uma plataforma para falar de coisas importantes, como a Europa. Mas já lá vamos a este assunto tendo em conta não só os prémios foram importantes, mas também um discurso altamente político de Wim Wenders, Presidente da Academia Europeia de Cinema.

30º EFA
‘O Quadrado’, juntou seis EFA, para toda equipa comemorar em palco.

 

De facto, foi uma noite quadrada e sem muitas expectativas, como o filme de Ruben Östlund, numa cerimónia contraditória, angustiante e divertida, leve e pesada ao mesmo tempo, que só podia ser mesmo europeia, destes tempos conturbados. Talvez até um pouco longa e como sempre com a constante ausência de grandes estrelas do cinema europeu — sobretudo francesas, italianas e ainda inglesas; tendo em conta que se tratava do 30º Aniversários dos EFA, surpreende um bocado. Mas já estamos habituados a que assim seja e essa é na verdade uma das imagens desta ‘Europa unida’, com muitas premiações que vão dos Goya aos BAFTA, até aos Cesars.

30º EFA
A cerimonia procurou simbolizar uma Europa e o cinema unidos.

 

No entanto, objectivo de escolher o Melhor Filme Europeu 2017 foi conseguido, pois efectivamente O Quadrado, de Ruben Östlund é-o com toda a justeza e fez o pleno concorrendo com outros filmes muito bons — num ano aliás exepcional de qualidade e de importantes premiações desses filmes em outros festivais internacionais — entre os cinco nomeados: 120 Batimentos Por Minuto, Loveless, Corpo e Alma, O Outro Lado da Esperança. Só lhe faltou o de Melhor Actriz que foi para Alexandra Borbély — uma novata, que recebeu o prémio com profunda comoção   pela sua notável interpretação no filme húngaro Corpo e Alma, de Ildikó Enyedi, que tinha quatro nomeações. E praticamente esta foi a história destes 30º EFA, com prémios que não surpreenderam nada, como o Prémio Revelação/Primeira Obra, para Lady Macbeth, de William Oldroyd ou o Prémio de Animação para A Paixão de Van Gogh, do casal Dorota Kobiela & Hugh Welchman, um filme que tem tido um surpreendente box office em Portugal, aliás como o grande vencedor da noite.

30º EFA
Melhor Filme consecutivamente para duas comédias, como ‘Toni Erdmann’, o ano passado.

 

O Quadrado, de Ruben Östlund está efectivamente em consonância com os tempos que vivemos pois é uma furiosa, excessiva e divertida crónica sobre a hipocrisia, centrada no mundo da arte contemporánea e sobre a sua legitimação. Mas é principalmente uma crónica velada sobre uma Europa que se desmorona, que ao mesmo tempo celebra o que resta dela. Ruben Östlund confessava mesmo que ‘a sociedade de consumo em que vivemos se tornou em nada de bom e antes numa verdadeira paranoia: egoísta, confusa, estranha e violenta’. E é disso que trata o filme, um drama, uma comédia que vive no limite exacto entre o trágico, o sublime e o ridículo. Não deixa também de ser curioso novamente se querer fazer rir esta Europa, já que o Cinema Europeu, tem fama de ser sisudo e dramático; esta é a segunda vez consecutiva que o Melhor Filme Europeu é uma comédia — agridoce bem-entendido —, depois de ano passado o vencedor ter sido Toni Erdmann, da alemã Maren Ade.

30º EFA
Wim Wenders, de pé para aplaudir na homenagem a Aleksandr Sokurov.

 

Tudo o que aconteceu nesta 30º cerimónia dos EFA, não foi por acaso e tudo pareceu coordenado com os prémios para O Quadrado, inclusive a longa e insistente intervenção de Wim Wenders, lamentado-se e denunciando uma Europa sujeita à maior das ameaças: o nacionalismo. O cineasta-presidente da Academia Europeia de Cinema, atacou com dureza todos aqueles que ‘estão roubando’ as ideias que nos definem como europeus: ‘Há uma responsabilidade comum de construir a Europa porque a Europa é a solução não o problema’. Às vezes demasiado solene e como já é habitual a cerimónia decorreu entre a dificuldade de calibrar o entusiasmo com o aborrecimento apesar da excelente condução do cómico-actor Alex Bendremühl, como apresentador de serviço, desde os últimos dois anos. Essa solenidade é também um retrato desta (ou de sempre?) da Europa.

30º EFA
A actriz-realizadora Julie Delpy foi homenageada, falou, riu e chorou.

 

Emotivas novamente — repetiram-se do ano anterior — foram as palavras de protesto contra a continuidade do encarceramento do cineasta ucraniano Oleg Sentsov, na Rússia. A actriz-realizadora francesa Julie Delpy que recebeu um Prémio de Carreira, protestou, riu e chorou ‘por ter sobrevivido nestes últimos 30 anos’ e manifestou a sua vontade de continuar a sobreviver, sustentando um novo projecto de filme, para o qual pediu dinheiro à audiência. E teve uma surpresa na tela com uma mensagem do seu ‘velho’ parceiro de elencos Ethan Hawke. E depois foi a vez da homenagem a Aleksandr Sokurov, num discurso confuso entre a euforia e aborrecimento, entre o drama e a comédia, cada uma de sua vez, como foi de apraxe. Uma cerimónia e uma premiação que resultou num verdadeiro retrato da Europa em que vivemos agora a dos nacionalismos, a do Brexit, várias vezes trazida ironicamente para os discursos. Os prémios esses ficam para a história e O Quadrado, já com a Palma de Ouro em Cannes, reforça a sua posição na primeira da corrida a um Óscar de Melhor Filme de Língua Estrangeira. A ver vamos!

Palmarés da 30ª edição dos EFA 2017 (Prémios do Cinema Europeu)


Melhor Filme: O Quadrado.
Melhor Realizador: Ruben Östlund, por O Quadrado.
Melhor Comédia: O Quadrado.
Melhor Actriz: Alexandra Borbély, por Corpo e Alma.
Melhor Actor: Claes Bang, por O Quadrado.
Melhor Argumento: Ruben Östlund, por O Quadrado.
Prémio Revelação: Lady Macbeth.
Melhor Filme de Animação: A paixão de Van Gogh.
Melhor Documentário: Communion.
Melhor Curta-Metragem: Timecode, de Juanjo Giménez.
Melhor Montagem: Robin Campillo, por 120 Pulsações Por Minuto.
Melhor Design de Produção: Josefin Åsberg, por O Quadrado.
Melhor Compositor: Evgueni & Sacha Galperine, por Loveless.
Melhor Design de Som: Oriol Tarragó, por Un monstruo viene a verme.
Melhor Maquilhagem e Cabeleireiro: Leendert van Nimwegen, por Brimstone.
Melhor Guarda-Roupa: Katarzyna Lewinska, por Spoor.
Prémio Melhor Director de Fotografia Europeu / Prix Carlo di Palma: Michail Krichman, por Loveless.
Prémio Co-producção Europeia / Premio Eurimages: Cédomir Kolar.
Prémio de Carreira: Aleksandr Sokurov.
Prémio Melhor Contribuição no Cinema: Julie Delpy.

José Vieira Mendes

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