"Deadly Weapons" | © Juri Productions

IndieLisboa ’22 | Deadly Weapons, em análise

Também conhecido como “Seios de Morte,” “Deadly Weapons” marca a primeira colaboração entre a rainha do sexploitation e a mulher com o alegado maior busto do cinema. O filme de 1974 passou na Cinemateca Portuguesa como parte da Retrospetiva Doris Wishman do 19º IndieLisboa.

Nascida Ilana Wajc em 1937, Chesty Morgan cresceu em Varsóvia. Durante o Holocausto, os seus pais foram mortos, deixando-a órfã no meio da guerra. Fundado o estado de Israel, a futura estrela foi para lá enviada e passou o resto da infância numa série de orfanatos, antes de acabar instalada num kibutz. Assim ela permaneceu até 1957, quando se casou com um americano chamado Josef Wiczkowski. Adaptado o nome para a anglofonia, a rebatizada Liliana mudou-se para Nova Iorque onde se terá dedicado à família. Contudo, novas tragédias abalaram o mundo da senhora.

Em 1965, Josef perdeu a vida durante um assalto em Brooklyn, deixando sua esposa como mãe enviuvada de duas filhas. É aqui que temos de discutir o corpo que lhe veio a dar fama. Nomeadamente, referimo-nos aos seios avantajados que lhe fizeram o busto medir uns loucos 185 centímetros. Segundo o que consta, a fisionomia icónica jamais foi aumentada por implantes ou outras operações cosméticas, sendo a realidade desta mulher desde os tempos em que vivia em Israel. Desesperada por dinheiro para sustentar a família, a dona-de-casa virou-se para o trabalho sexual e ganhou fama graças às medidas.

deadly weapons critica indielisboa
© Juri Productions

Primeiro, deu pelo nome de Zsa Zsa e foi stripper, bailarina do burlesco. Tão grande era o peito que ela não precisava de revelar mais nada para excitar a clientela ou cativar qualquer audiência. Apesar de alguns problemas com a lei, sua fama foi crescendo no contexto da indústria erótica e, com o novo nome de Chesty Morgan, ela também tentou ser atriz. Doris Wishman, a mais bem-sucedida realizadora de soft-core na época foi a artista encarregue de lhe imortalizar os atributos em celuloide. Originalmente, até planearam fazer três filmes, mas só dois foram rodados.

Tudo começou com “Deadly Weapons,” escrito por Judy J. Kushner na forma de um guião que, até no contexto do universo Wishman, peca pela parvoíce. Tal como outras produções da realizadora nos anos 70, este trabalho vai buscar inspiração aos sucessos de Hollywood nos cinemas. Neste caso, o subgénero modelo é a história de vingança, com cenas de morte expostas sem pudor ou bom gosto. Não se trata, contudo, de uma paródia irónica. Se há algo transversal a toda a obra de Doris Wishman é a sua irrevogável sinceridade.

Sem querer cair em hipérboles, diríamos mesmo que “Deadly Weapons” nos revela a cineasta num momento de particular aprumo audiovisual. Sem chegar ao rigor de “Let Me Die a Woman,” esta fita erótica brilha nos momentos de contemplação exótica, especialmente as cenas em que Chesty Morgan revela o peito em palco. Multiplicada por espelhos, a mulher torna-se numa abstração de pele desnuda. É a carnalidade do cinema erótico tão desconectada da personagem até ao ponto do vanguardismo. Conhecendo o repertório de Wishman, isso deve ser um acidente, mas não deixa de representar um momento curioso na filmografia da autora.

Voltando ao guião de Kushner, a narrativa centra-se nas desventuras de Crystal, cujo namorado é assassinado pela máfia Floridiana no início da fita. Com desejos de retribuição violenta, ela decide vingar-se dos homens que lhe roubaram o final feliz. Afundando-se nas profundezas da perfídia, Crystal torna-se numa assassina que mata com as mamas. Apesar de a humanidade lhe escapar por entre os dedos, o mistério do que aconteceu ao namorado é algo que ela nunca desiste de desvendar. Nem que lhe custe a alma, a vida, tudo.

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© Juri Productions

Como sempre, Wishman sofre do amadorismo patente no trabalho de qualquer autodidata empurrada para as margens. O aproveitamento do espaço, por exemplo, faz-se consoante as possibilidades infinitas do seu apartamento, sempre pronto a servir de cenário para as mais variadas cenas. Muitas vezes, para contornar a repetição, momentos de transição focam-se somente nos pés das personagens. Essa é uma das muitas técnicas que tornam as obras desta pioneira tão fascinantes e divertidas. Ao vê-las, é possível vislumbrar um cinema formado além dos costumes comuns, uma espécie de alternativa ingénua que quase representa “outsider art”.

Dito isso, nem o estilo tresloucado de Wishman nem o guião sem juízo de Kushner conseguem ofuscar a verdadeira estrela de “Deadly Weapons.” Nos dois filmes que fez com a realizadora, Chesty Morgan jamais demonstrou capacidades enquanto atriz dramática, mas o seu magnetismo é inegável. Nem nos referimos aos seios que lhe ganharam fama, mas à qualidade meio melancólica do seu olhar. Com pestanas falsas e uma peruca platinada a tombar para a cinza, a presença de Morgan puxa pela câmara e pelos olhos do espetador. Se existe alguma honestidade dramática neste filme, ela vive na fisicalidade custosa da sua estrela, os olhos tristes com que confronta o mundo e o modo desapaixonado com que atua a arte de matar.

Deadly Weapons, em análise
deadly weapons critica indielisboa

Movie title: Deadly Weapons

Date published: 7 de May de 2022

Director(s): Doris Wishman

Actor(s): Chesty Morgan, Harry Reems, Richard Towers, Saul Meth, Phillip Stahl, Mitchell Fredericks, Denise Purcell, John McMohon, Louis Burdi, Doris Wishman

Genre: Crime, Thriller, 1974, 75 min

  • Cláudio Alves - 65
65

CONCLUSÃO:

Parte de uma duologia orientada pelo protagonismo de Chesty Morgan, “Deadly Weapons” antecede o “Double Agent 73.” Adotando os preceitos do thriller de vingança, o filme perde-se em homicídios via seio, mas triunfa quando a câmara se foca ou no olhar da sua estrela ou na teatralidade do palco burlesco.

O MELHOR: Chesty Morgan!

O PIOR: O argumento de Kushner é mesmo muito pobre, superando até alguns dos outros, mais absurdos, filmes de Doris Wishman.

CA

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