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O Crime do Padre Amaro | Entrevista com o elenco

A Magazine.HD esteve à conversa com os atores de “O Crime do Padre Amaro” e ficou a conhecer melhor a nova série da RTP, produzida por Leonel Vieira.

Leonel Vieira é um dos mais bem sucedidos realizadores portugueses, tendo já vencido importantes prémios na área do cinema, uma vez que as suas obras já foram selecionadas para centenas de festivais internacionais. Tendo-se estreado na realização com quase trinta anos de idade, o seu primeiro filme, “A Sombra dos Abutres”, esteve logo nomeado a diferentes galardões, incluindo distinções brasileiras. Nesse mesmo ano, em 1998, o realizador português lançou uma nova longa-metragem que acabou por se tornar um filme de culto, “Zona J”. Desde então, Leonel tem vindo a apostar em trabalhos que dignifiquem o cinema e a cultura portuguesa, como é o caso da trilogia de remakes dos clássicos “O Pátio das Cantigas“, “O Leão da Estrela” e “A Canção de Lisboa”. Mais recentemente, Leonel Vieira apostou em “O Crime do Padre Amaro”, uma minissérie que retrata a crónica de costumes escrita por Eça de Queirós em 1875.

A trama desenrola-se em Leiria, no final da década de 1860 e acompanha a história da paixão proibida entre Amaro, um jovem padre, e Amélia “a rapariga mais bonita de Leiria”. Tensa, emocional e ancorada em conflitos de personalidade, a série “O Crime do Padre Amaro” lança um olhar crítico sobre a sociedade e a igreja em Portugal, na Leiria do século XIX.”

Em exibição no canal RTP desde o dia 16 de janeiro, “O Crime do Padre Amaro” está também disponível na RTP Play. A dois episódios do fim da minissérie, a Magazine.HD esteve à conversa com José Condessa e Bárbara Branco, os protagonista que dão vida a Padre Amaro e a Amélia; com José Raposo, o confidente de Amaro; Com Filomena Gonçalves, a mãe de Amélia; com Diogo Martins, a divertida personagem de Libaninho; e com Joaquim Nicolau, que dá vida ao Padre Natário, tendo ainda a escolha de elenco ao seu encargo. Durante a conversa, tentámos perceber o processo criativo dos atores que lhes permitiu dar vida às personagens criadas por Eça, bem como a importância de reviver um clássico da literatura portuguesa.

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JOSÉ CONDESSA & BÁRBARA BRANCO – PADRE AMARO & AMÉLIA

José Condessa e Bárbara Branco
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Magazine.HD: Como é que o convite para participar nesta série chegou até vós?

José Condessa: Eu Não conhecia o Leonel, foi através do Joaquim Nicolau que chegou o convite, porque ele gosta muito de nós e quer trabalhar conosco há muito tempo, mas estamos sempre com outras coisas e nunca mais acontecia. Mas o Joaquim fez-me o convite e disse que eu tinha de aceitar, mas não me dizia bem o que é que era [risos]. Mas depois, quando me disse, percebi que era uma oportunidade extraordinária e incrível e foi-se alongando durante algum tempo. Na verdade, eu estava no Brasil quando já se falava disto e, depois vim para cá, e começou-se a falar com outra regularidade, mas faltava saber o resto do elenco, e é aí que entra a parte da Bárbara! Eles depois foram à procura de uma Amélia… 

Bárbara Branco: E eu fui empurrada e muito bem empurrada, porque acho que correu bem [risos]. Mas o Joaquim falou de mim e, portanto, o Leonel acabou por me chamar também!

Magazine.HD: Portanto, disseram logo que sim!

José Condessa: Nós falamos sobre isso… O Leonel, não sabia ao início que nós éramos um casal, por isso ele não tinha ideias pré-concebidas. Depois, quando o Joaquim lhe disse foi uma surpresa, porque podia ser bom, como podia ser mau. Imagina se acontece alguma coisa… Mas nós depois conhecemos o Leonel, e foi um dia bem engraçado, porque nós conhecemo-nos, começámos a ler as primeiras coisas e começámos a ver que existia uma sintonia. A forma de trabalhar dos três era igual, a forma como ele deixa o ator explorar, ele diz o que é que quer mas não te corta… Isso é muito bonito!

Magazine.HD: Acham que resultou mais por serem um casal na vida real?

José Condessa: Eu e a Bárbara já nos conhecemos há muitos anos e antes de namorarmos já trabalhávamos juntos em teatro. O que eu sinto, e acho que é recíproco desde sempre, é uma química muito grande quando estamos a representar. 

Bárbara Branco: E química não tem nada a ver com uma ligação com compulsão sexual ou atração, não é isso! É uma química com uma ligação brutal, que nem sempre acontece com os atores.

José Condessa: Podemos ser namorados e não acontecer, ou podemos não ser namorados e acontecer com os outros colegas. Felizmente, é bom que aconteça muitas vezes. Nesta questão de “O Crime do Padre Amaro”, a questão de a própria personagem ter que se conhecer, nós temos que fazer o caminho inverso. Nós não podemos levar a Bárbara e o Zé para ali. Nunca devemos fazer isso e nós também não somos atores de fazerem as personagens adaptarem a nós. É exatamente o contrário, nós é que temos de nos moldar à personagem e nós tivemos que fazer isso, ainda mais nestas personagens. Primeiro que tudo, ele é um Padre. Depois, ela também é uma mulher virgem. E de repente, não pode existir uma química natural entre as duas personagens. Tem que existir uma curiosidade, quase aquela coisa do amor que existe de repente e que vai nascendo, mas não pode haver um toque, não nos podemos descuidar e dizer ‘Olá, bom dia!’. Isto não pode acontecer nem na época, nem nas personagens, nem em nós. Nós não podemos permitir isso. Se calhar até é mais difícil do que se não nos conhecêssemos, porque iríamos destruir as barreiras naturalmente.

Bárbara Branco: Não é necessariamente mais fácil, mas também não é necessariamente mais difícil, porque, ao mesmo tempo, nós temos um à vontade um com o outro, mais que não seja para falarmos sobre as cenas e para dizer muito abertamente ao outro o que é que cada um pretende da sua personagem naquele momento e, portanto, neste caso, facilita. 

José Condessa: Do tipo, aquele ‘Olá’ na primeira vez que nos vimos na série, ficam ali uns olhares, uns silêncios… Eu acho que o que permite isso também é a escolha do realizador para a cena. Eu estar com outra pessoa e, de repente, há alguém que me chama à atenção… Um outro realizador diria ‘não, está aqui muito tempo, temos que cortar’, e de repente era ‘Olá, boa noite’.

Bárbara Branco: O Leonel permite-nos respirar em cena. Parece que estamos a invadir o espaço do outro. Eu senti-me a invadir o nosso espaço ali. Tipo, se calhar estou a mais [risos]. Mas são os silêncios e os tempos que o Leonel nos permitiu ter que também permitem que isso aconteça na história. 

José Condessa: E as personagens também! Ou seja, a minha personagem enquanto Padre não é uma pessoa que diga ‘ Olá, sou o Amaro’ [risos]. 

Magazine.HD: Como é que foi feita a preparação, não só para as personagens, mas também para dar vida a esta época, que é completamente diferente da nossa?

Bárbara Branco: Nós começámos por ler a obra, que foi , no meu caso, a base do meu trabalho. E, Obviamente, conversas com Leonel e com o Zé para percebermos, em conjunto, primeiro, o que é que o Leonel pretendia desta obra e de cada uma das personagens, e depois em conjunto, de que forma iríamos chegar a esse objetivo. Portanto, foi um bocadinho conversas com o Leonel e muito da obra, porque é uma obra muito fiel àquilo que o Eça escreveu. 

José Condessa: Existem cinco ou seis versões  da obra em cada episódio!

Bárbara Branco: E estava muito colado à obra, no bom sentido. Tivemos a liberdade artística de fazer o que nós quiséssemos, mas não deixámos de estar fiéis à descrição do Eça e, portanto, isso serviu, como é óbvio, como uma base muito importante para o trabalho. 

José Condessa: Mesmo coisas que acontecem na personagem, porque não cabe tudo nestes seis episódios, quem escreveu tem a noção do que é que aconteceu antes. Então, de repente, há pequenos pormenores que fizeram a diferença.

Bárbara Branco: Por exemplo, aquela cena da carta, nós vemos o Amaro a esconder a carta debaixo do colchão, depois a queimar a carta… isso no livro é um pormenor, um detalhe que facilmente poderia ter ficado esquecido se não houvesse alguém a ler a obra como deve ser e a tirar realmente as coisas importantes. E eu acho que tudo o que é importante na obra está presente na série.

José Condessa: Aquilo tem a ver com a primeira vez que o Amaro está com uma mulher antes de ser Padre, primeira e única, e deixa-lhe uma carta. E ele leva aquela carta para se ir lembrando que não é esse o caminho que escolheram para ele. Então, esse trabalho não está lá dito, ninguém explica que o Amaro nunca quis ser padre, não foi uma escolha dele. Ou seja, nós temos que fazer esse trabalho. Mas antes também o trabalho do latim, O trabalho da missa tridentina, que é totalmente diferente das missas atuais. A missa tridentina era dada de costas para os fiéis, e existem pequenas variantes, mesmo na própria forma dos paramentos, há camadas diferentes, como aquele que parece um lenço branco que eu cruzo, isso já não existe.  

Bárbara Branco: Também não há muita gente que nos consiga dar acesso a esse tipo de informações, portanto foi um trabalho também muito específico e tem que ser muito direcionado. 

Magazine.HD: Existe uma responsabilidade ainda maior ao atuar numa série sobre uma obra escrita pelo Eça? 

José Condessa: Sim tem, sem dúvida alguma! 

Bárbara Branco: E um grande privilégio também, porque temos obras literárias tão boas, escritas por portugueses e ainda não se fez realmente nada de importante e de relevante com essas obras. O Eça já merecia uma adaptação assim, fiel e real, que nos ponha realmente dentro da obra e dentro daquele contexto histórico. 

José Condessa: Também existe “Os Maias”, que foi feito no Brasil, e algumas outras coisas, também já tinham feito “O Crime do Padre Amaro”. Só que, nesta questão, é que nós temos todas as personagens que o Eça escreveu. Noutras adaptações, por escolha, vão cortando personagens e não se fala disto. Todos os padres estão só num padre e aqui não, cada padre tem cada pecado. E é muito bonito! Estamos muito felizes por fazer isto! 

Bárbara Branco: Acima de tudo, eu acho que “O Crime do Padre Amaro” está muito associado a uma obra polémica por ser só erótica, e o que nós tentámos recriar aqui foi mais do que o erotismo natural da obra, que não é preciso sublinhar, porque é latente a toda a obra. O que diferencia a relação do Amaro e da Amélia da relação carnal de outras personagens é precisamente o amor e o fascínio que têm um pelo outro.

José Condessa: Muitas vezes pensa-se só no lado físico da coisa. E há outra coisa que nós fizemos, que é uma crítica à sociedade e uma crítica também à Igreja. Estamos a falar de um obra que foi escrita em 1875 e que continua a ser completamente atual, porque é uma obra universal e as obras universais são transversais a qualquer tempo e a qualquer sociedade. 




JOSÉ RAPOSO – CÓNEGO DIAS

José Raposo
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Magazine.HD: Em primeiro lugar, queria pedir ao Zé que nos apresentasse a sua personagem, por favor.

José Raposo: Este Padre [Cónego Dias] é maravilhoso! Foi delicioso de o representar, porque tem um grande saber e uma grande experiência do ofício que, nesta época, lhe dava um poder na localidade onde ele era Prior. Enfim, dominava a Igreja! E a Igreja dominava as pessoas, como a gente sabe [risos]. Por isso, era um homem muito influente em relação às relações das famílias e, inclusivamente, nesta história deste amor proibido era o ‘confidente’, digamos assim, do jovem Padre Amaro. Portanto, acompanhou toda esta relação deles os dois! Ou seja, era o homem que dava conselhos e que tentava esconder isto ou aquilo, etc. Mas o que é mais maravilhoso nisto é escrita de Eça de Queirós, obviamente, e é nós podermos dizer aquelas palavras que só um génio como ele as podia pôr nas nossas bocas [risos].

Magazine.HD: Como é que se prepara para fazer a personagem de um padre? 

José Raposo: É assim, eu sou o pior ator do mundo para responder a uma coisa dessas, porque eu nunca preparo assim muitas coisas [risos]. É uma coisa muito intuitiva, mas depois é também o conhecimento que já temos. É um talento nato, pela experiência de vida e pelo conhecimento que vamos tendo das pessoas, tanto da Igreja como da Política, como das várias classes sociais que existem, porque eu dou-me com muita gente. Eu vou fazer 60 anos, tenho obrigação de conhecer mais ou menos os estereótipos das pessoas [risos]. Depois, claro, lendo a obra do Eça e explorando o mundo Queirosiano. É também uma questão de ter um bom diretor, como é o Leonel, sem dúvida nenhuma. O Leonel é um homem muito conhecedor de cinema e de cultura a nível geral. Aliás, toda a gente vai ver por esta obra que ele dá-nos este mundo do Eça de Queirós, que era o nosso mundo muito português, visto por um génio que o viveu como ninguém. E é muito importante que as novas gerações conheçam bem esta obra e foi isso que também nos fascinou que é o que devia fazer mais vezes a RTP. Todos os canais se deviam preocupar com os nossos dramaturgos e com a nossa história e dar a conhecê-la às novas gerações, principalmente. 

Magazine.HD: Quando o Eça escreveu esta obra gerou muita polémica e a Igreja contestou o livro. Anos mais tarde, em 2005, um filme é lançado e volta a gerar muita polémica. Em pleno século XXI, com uma maior liberdade e abertura mental maior, que reações são expectáveis?

José Raposo: Gera polémica na mesma, graças a Deus [risos]. E gera polémica porque é uma crítica, ainda por cima nesta época em que acontece tudo que está a acontecer na Igreja, portanto veio mesmo a calhar esta série. Mas revela que já naquela época havia, da parte da Igreja, uma atitude de grande repressão em relação aos atos humanos que são naturais, não é? E continua a haver, embora agora haja muito mais liberdade, há muito mais conhecimento das coisas. As pessoas estão muito mais preparadas…

Magazine.Hd: E é uma responsabilidade ainda maior representar este papel, tendo em conta que muita gente conhece o “Crime do Padre Amaro”?

José Raposo: É, mas é uma responsabilidade maravilhosa, porque eu não tenho dúvidas de que está muito bem feito, acima tudo pela realização e pelo elenco maravilhoso que tem a série, mas o Leonel foi um maestro fabuloso. 

Magazine.HD: Para terminar, como é que se concilia televisão, com cinema e com teatro, tudo ao mesmo tempo?

José Raposo: A vida dos atores é essa mesmo, não é verdade?




FILOMENA GONÇALVES – SÃO JOANEIRA

Filomena Gonçalves
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Magazine.HD: Primeiro que tudo, pedia-lhe que nos apresentasse a sua personagem. 

Filomena Gonçalves: Então ela é uma personagem que é mãe da protagonista e é uma mulher muito católica, muito ligada à Igreja, sempre em missas, mas que comete os seus pecados [risos]. Ela gosta tanto de padres que tem uma relação amorosa com o padre-mestre [interpretado por José Raposo]. E esta é a crítica que o Eça faz à sociedade da altura, à Igreja também, àquelas cumadrices, à vidinha da província em que se se é um padre, então vamos confiar porque é de Deus. Em suma, estas coisas um bocadinho mesquinhas destas tias que nunca casaram, mas estão sempre a cuscar a vida dos outros. E o Eça apanha isso tudo! E o local em que toda a gente se encontra é a casa da São Joaneira, que é a minha personagem, a mãe da protagonista. É uma personagem giríssima!

Magazine.HD: Como é que se preparou para dar vida a esta personagem? 

Filomena Gonçalves: Eu já conhecia o Eça, não muito profundamente esta obra “O Crime do Padre Amaro”, mas li e voltei a reler agora com outros olhos, porque é um livro que sofre várias edições. Ele próprio mexeu no livro ao longo do tempo, porque esta é uma das suas primeiras obras. Ele estava em Leiria quando começou a escrever esta obra, portanto, ele depois, pouco a pouco, foi reorganizando a obra. Eu não li as versões todas, li a que foi escolhida para ser feita. E pronto, sobretudo houve ensaios, falámos entre nós e discutimos o texto com o diretor de atores, o Joaquim Nicolau, e isso foi importantíssimo! Depois é encontrar gente por quem eu tenho grande admiração e com os quais é muito fácil trabalhar, porque lhes tenho grande admiração e porque são grandes atores. E o Leonel é um grande realizador e a equipa técnica era fantástica.

Magazine.HD: Quando a obra do Eça foi publicada, gerou uma grande polémica…

Filomena Gonçalves: Ainda hoje gera! E é com alguma fleuma que a série passa na televisão, porque o tema é ainda hoje daquelas coisas com as quais não se pode mexer. Eu sou católica, mas este este tipo de assuntos são ainda proibidos dentro da Igreja Católica. O casamento dos padres é ainda um assunto que não se discute. O sacerdócio aberto às mulheres é um assunto que ainda não se fala dentro da Igreja. E devia começar a falar-se! Eu sei que a Igreja Católica tem dogmas e que se rege por eles, e eu compreendo. Mas há necessidade de abrir a Igreja ao mundo e às necessidades dos seus fiéis. A fé está dentro de cada um de nós, e fazer esta série não diminuiu a minha fé, mas compreendo as críticas que aqui estão ou que são feitas, e são bem feitas [risos]. Aliás, a Igreja Católica está a braços com um escândalo que nos diz que não é inócua, não é absolutamente pura, não é? 

Magazine.HD: Tem um peso e uma responsabilidade ainda maiores participar numa série em que muita gente já conhece a história?

Filomena Gonçalves: Eu acho que sim! O Eça é um autor extraordinário, mas é também um autor que exige responsabilidade. Esperemos não estragar o trabalho do senhor [risos]. Porque ele escreve tão bem, e há autores portugueses que escrevem tão bem. Também já fiz Camilo e é delicioso, se bem que noutro registo. Portanto, é sempre um prazer enorme voltar a estes autores!




DIOGO MARTINS – LIBANINHO

Diogo Martins
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Magazine.HD: Quem é o Diogo nesta nova série? 

Diogo Martins: O Diogo distancia-se sempre muito das personagens que faz. Obviamente que todas as personagens têm um bocadinho do Diogo, mas esta é uma personagem um bocadinho mais peculiar, diferente do que tenho feito e de todos os registos que me têm dado. E é uma oportunidade que eu tive que agarrar da melhor forma possível. Preocupei-me muito em destoar um bocadinho de tudo o que estava a ser feito e esse era um risco, sem dúvida. Mas toda a dimensão e a carga que a personagem tem também me pedia que eu fizesse isto desta forma, portanto, tentei não ficar muito fora do contexto da história e da narrativa e de como todos a estão a interpretar, e, tentei ao mesmo tempo enquadrar-me nela, mas sempre diferente. E eu acho que resultou!

Magazine.HD: Que preparação é que se faz para se criar esta personagem tão diferente? 

Diogo Martins: Olha, eu acho que a personagem já é muito rica. O Eça realmente faz todas as personagens com uma carga e uma dimensão que tu não precisas, à partida de fazer grande coisa, precisas só de executar. Mas eu vi o filme que foi feito, que é uma coisa mais atual dentro da obra, no entanto, eu sinto que tentei aproximar-me de uma imagem que era o Libaninho. Ou seja, há sempre a descrição da personagem e eu tentei aproximar-me ao máximo dela consoante aquilo que eu achei que poderia ser. E depois, é lógico que é com o exercício, com a preparação dos ensaios, e tudo o que foi feito com o Leonel, juntamente com todos os atores, que se chega à descoberta.

Magazine.HD: O Diogo falava em agarrar uma oportunidade. Como é que surgiu esta oportunidade? 

Diogo Martins: Foi através, grande parte, do Joaquim que, felizmente, nos foi juntando a todos e trouxe um elenco realmente forte, não só pela sua forma de representação, mas também por todo o caráter e toda a essência que tem. Cada vez mais é importante estar com pessoas de quem gosto e que me entusiasmo a admirá-las também no seu trabalho e, portanto, acho que reuniram aqui tudo o que era necessário para que resultasse: bons atores e boas pessoas. 

Magazine.HD: E que memórias ficam deste projeto? 

Diogo Martins: Ficam memórias maravilhosas de aprendizagem, principalmente de muita aprendizagem de olhar para Leonel e perceber o cuidado que ele tem com cada plano. É quase como se fosse um pintor! Isto é uma coisa absurda que eu nunca tinha assistido, ou se vi, se calhar não tomei a devida atenção. E o cuidado com que ele aborda todo o seu plano de trabalho, toda a forma como quer passar uma imagem de um personagem… aquilo tem muito trabalho por trás e muito cuidado. Isso também me fez aprender e fez-me querer sempre dar mais e querer corresponder às expectativas, não defraudar as expectativas dele. 

Magazine.HD: Esta série hoje continua a gerar polémica?

Diogo Martins: Eu espero que não! Acho que todos nós temos que ter as mentes bem mais abertas em determinados assuntos. Se isto fosse polémico, acho que seria só estranho. Às vezes as coisas são estranhas, portanto, não me fazia estranheza se houvesse uma polémica agora [risos]. Eu acho que também, como a obra é tão conhecida, e como já foi também retratada noutro filme, eu acho que já não vai acontecer. E além do mais, quem ficar chocado com o que quer que seja, só tem que crescer intelectualmente e mentalmente [risos]. 




JOAQUIM NICOLAU – PADRE NATÁRIO

Joaquim Nicolau
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Magazine.HD: Antes de mais Joaquim, podia falar-nos da sua personagem nesta série? 

Joaquim Nicolau: Eu faço de Padre Natário, um padre muito pouco católico, no sentido em que exerce a sua fé e a sua profissão não muito bem [risos]. É irascível e de maus fígados [risos]. E eu espero não ter fugido àquilo que o Eça colocou na sua obra. Nós não retratamos muito, não fugimos ao que está no romance. Como tal, deu-me algum prazer fazer este trabalho, aliás, porque tive uma transformação um bocadinho complexa, que me deu algum trabalho, e que me deu algumas dores de cabeça, porque tinha que rapar o cabelo todas as semanas [risos]. Mas gostei do trabalho que fiz e gosto muito de trabalhar com o Leonel Vieira.

Magazine.HD: Existe uma responsabilidade ainda maior estar à frente de um projeto em que a história já é conhecida do público? 

Joaquim Nicolau: Sim, e além de ser uma história conhecida, e que deverá e terá que ser conhecida, porque faz parte de um nome maior da literatura portuguesa! A verdade é que é um objeto histórico, em que a gente tem que ter muito cuidado. E quando está nas nossas mãos, temos que manipular com muito cuidado e com muito carinho para não estragarmos. 

Magazine.HD: O Joaquim também está à frente da escolha dos atores…

Joaquim Nicolau: Sim, aqui eu fiz a escolha de elenco. Ou seja, foi uma das minhas responsabilidades escolher este elenco e apresentá-lo. Não é difícil! Eu, trabalho há muitos anos com muitos atores. Eu tenho o meu trabalho, que as pessoas geralmente não conhecem, que é estar à frente de elencos. E eu conheço bem os atores portugueses, conhecia bem a obra, e conhecia bem o Leonel. Sabia bem do que é que o projeto necessitava e tentei aproximar-me o mais possível dessa necessidade, escolhendo as pessoas corretas e indicadas mesmo para papéis que pouco aparecem. A Carla Vasconcelos, por exemplo, ela não fala, mas é importantíssima. Portanto, eu fui escolher a pessoa certa para estar certa com a irmã certa, que é a Marina Albuquerque. Eu já andava atrás do casal, Bárbara Branco e José Condessa, há muito tempo, e resultou bem! Eu gosto muito de elenco que proporcionei ao Leonel e ele dirigiu muito bem! 

Magazine.HD: Para terminar, que memórias engraçadas ficam desta experiência? 

Joaquim Nicolau: O que me fica na memória é perceber que estávamos realmente a fazer um bom trabalho. Eu percebi isso logo, porque viu-se logo desde o início que estávamos no caminho certo, e isso é que é a grande memória que eu tenho. Depois, o convívio com os meus colegas… eu talvez tenha sido o que conviveu menos, porque eu estava já com um projeto em mãos, que era o “Festa é Festa“, porque eu andava para cá e para lá, entre Lisboa e Leiria, sempre de um lado para o outro. Mas o momento em que estávamos juntos era sempre uma alegria. É muito bom nós partilharmos pequenos momentos, nem que seja de lazer, às vezes estarmos só a beber um copo ou estar tranquilamente só em repouso, mas foi muito bom!

TRAILER | O CRIME DO PADRE AMARO É A MAIS RECENTE OBRA DE LEONEL VIEIRA

Tens acompanhado a série “O Crime do Padre Amaro”? O que pensas desta nova adaptação da obra de Eça de Queirós?

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