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CONSTANTINO, O Bicho de Contos | Entrevista com Patrícia Cairrão

A Magazine.HD esteve à conversa com Patrícia Cairrão, responsável pela adaptação de “Constantino, O Bicho de Contos” para o teatro.

Numa altura em que o mundo anda em guerra, fazendo sentir-se uma forte intolerância para com o outro, a RUGAS Associação Cultural leva a cena CONSTANTINO, O Bicho de Contos. Trata-se de uma peça de teatro dedicada aos mais novos que tem como missão consciencializar para a aceitação de todos os seres-humanos, independentemente das suas diferenças. Em suma, através da personagem de Constantino e de outros insetos que coabitam o seu jardim, temos acesso a uma crónica de costumes da sociedade atual, alertando-nos para a dificuldade em superar as dificuldades sentidas por quem tem traços diferentes.

A Magazine.HD esteve à conversa com Patrícia Susana Cairrão, responsável pela adaptação da obra “Constantino, O Bicho de Contos“, de Luís Miguel António, para a versão teatral. Numa divertida e profunda conversa, a atriz desvendou-nos um pouco mais sobre esta peça que se encontra em cena no Teatroesfera.

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Magazine.HD: Como é que surgiu a ideia para a adaptação da peça CONSTANTINO, O Bicho de Contos?

Patrícia Cairrão: A esta ideia surgiu porque nós fomos ao lançamento do livro com o mesmo nome, e falámos com o autor, que é o Luís António. Não foi lido o livro, mas na altura ficámos logo com um exemplar e o que ouvimos sobre o livro e sobre a própria história pareceu-nos muito interessante, tendo em conta os temas que trabalha. E pareceu-nos muito interessante fazer um trabalho sobre isso! E como também conhecíamos o autor, achámos que era mesmo uma ótima aposta, uma boa coisa que poderia acontecer e, de facto, aconteceu! Nós fizemos a adaptação do texto porque o texto, ainda assim, apesar de ser para a infância, não é um livro para a infância e ainda é, de alguma forma, longo para um espetáculo de teatro. Então, na adaptação do texto acabámos por ir à procura de uns momentos que pudessem ser mais imagéticos e mais interessantes em termos de dispositivo cénico sem alterar o fio condutor da história. E os temas a serem trabalhados também! Fizemos ali alguns excertos daquele jardim e acabou por dar origem ao espetáculo com o mesmo nome, CONSTANTINO, O Bicho de Contos. 

Magazine.HD: E assim para os mais curiosos, muito resumidamente, do que é que fala esta peça? Quem é este Constantino? 

Patrícia Cairrão: Então, o Constantino é um bicho-da-conta que quando nasce acaba logo por perceber que é diferente de todas as pessoas (neste caso, de todos os bichos) [risos], todos os bichos da sua espécie, da sua família, porque descobre que não consegue contar. E todos os bichos-da-conta deste Jardim, a sua função é precisamente contarem e serem contabilistas. Ele logo à nascença percebe que é diferente de todos os outros a ao longo do seu crescimento, tenta sempre resolver essa situação. Este é um Jardim que acaba por ser uma pequena sociedade em analogia à nossa forma de viver enquanto humanos, onde cada bicho tem a sua profissão e tem a sua função naquele Jardim onde existem escolas, onde existem babysitters, onde existem artistas, onde existem sapatarias, entre outras coisas. E ele ao longo do seu crescimento tenta então colmatar esta diferença. Mas a coisa não se dá logo, e ao longo desse tempo, vai vivendo experiências e vai descobrindo que gosta de ouvir as pessoas. Neste caso, gosta de ouvir os outros bichos, gosta de conversar com os outros bichos, gosta de saber as histórias das experiências e das situações que lhes acontecem. E dá-se aqui um dia, e é aí que está o plot point da história, em que o Constantino acaba por ter que realizar uma tarefa que é nova e é a primeira vez que se está a dispor a isso. E nesse dia, descobre que o seu talento é outro, não é contar números, não é contar coisas, mas contar contos e descobre que é um contador de histórias e não um contabilista.

Magazine.HD: E já conhecendo a RUGAS com o que nos tem presenteado até agora, este é mais um tema que volta a ser importante para os dias de hoje, em todos os sentidos. Temos aqui, ao fim e ao cabo, outra crítica social, uma outra vez, quase uma crónica de costumes da sociedade atual. 

Patrícia Cairrão: Exatamente, feita a partir de um texto que é claramente para a infância e um autor que se dispôs a trabalhar com a infância. Esta não é a profissão atual dele, mas ele foi professor do primeiro ciclo durante muitos anos, e tem também algumas experiências ligadas ao teatro. Apesar de a profissão dele agora ser outra, tem esta ligação à infância. E, de facto, é um tema muito pertinente, atualíssimo e que tem a ver aqui com a aceitação do outro, e com a nossa autoaceitação face às nossas diferenças, face à nossa maneira de estar e, no fundo, acaba por falar de tolerância. E nos dias de hoje, com as redes sociais, com o nível político, com os posts tão extremados, pareceu-nos para as idades mais tenras um tema mesmo muito pertinente de ser trabalhado através desta fábula. Acaba por ser uma fábula, são os bichos-da-conta aqui que nos vêm falar da aceitação, da diferença e dos outros bichos do Jardim a aceitarem essa diferença e da própria família a aceitar essa diferença como uma coisa boa e como uma coisa que nos pode trazer muita riqueza. E, quando digo riqueza, digo riqueza interior, não como algo que nos diminui. 

Constantino, O Bicho de Contos
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Magazine.HD: Vocês vão estrear este fim-de-semana, mas já tiveram a antestreia para três escolas! Como é que tem sido a reação do público? 

Patrícia Cairrão: A reação do público foi fenomenal! E é sempre bom este ano esta antestreia ter sido para escolas e foi para um auditório bem grande. Foi no auditório Acácio Barreiros, do Centro Cultural Olga Cadaval, com plateias de umas para mais de 200 crianças, outras com 200 crianças. Foi fenomenal porque é um espetáculo que também pressupõe, em alguns momentos, a participação deles e a participação deles foi estrondosa. É muito interessante como é que com pequenos estímulos e pequenas interpelações, não quero estar aqui a desvendar, eles agarraram super bem e queriam dar respostas. E deram imensas respostas para ajudar esta conquista do Constantino, que depois acabou por se revelar uma outra conquista e não aquela para a qual eles estavam ali a querer contribuir com tanta força e com tanto entusiasmo [risos]. 

Magazine.HD: Acho que isso é maravilhoso e já cria grandes expectativas para a estreia para o público em geral, sendo que aqui já vai ser um público mais variado, porque temos os pais a acompanharem as crianças e já temos uma outra reação mais adulta, digamos assim. Vocês só vão estar em cena durante o fim-de-semana?

Patrícia Cairrão: Sim, esta estreia para o público em geral vai ser só sábado e domingo, no Teatroesfera. Depois, já temos programadas mais sessões para mais escolas. E pronto, agora estamos prontos para reservas, para contactos e para futura uma digressão! 

Magazine.HD: Claro que sim, por aquilo que ouvi merece andar a contar pelo país inteiro! Já existem mais projetos para a vossa Associação Cultural?

Patrícia Cairrão: Neste momento, estamos a desenvolver um trabalho com séniores no âmbito de um projeto, em parceria com a Câmara Municipal de Sintra, que é ‘A Cultura Sai à Rua’, em que trabalhamos com séniores com demência. Temos agora também já no próximo fim-de-semana, 26 e 27 de maio, um encontro de teatro sénior, a terceira edição, promovido pela Câmara Municipal do Seixal, com um documentário que realizámos no âmbito de um projeto que desenvolvemos também com eles, de um grupo de teatro sénior municipal, que é o Desdramatizar. Há um documentário sobre o teatro e a saúde mental sénior, com núcleos de teatro sénior também aqui de associações de reformados do Concelho do Seixal, com a visita e a apresentação de um espetáculo, também do grupo de teatro Identidades, da Escola Superior de Teatro e Cinema.

Continuamos a desenvolver trabalho com esse grupo que é o Desdramatizar, com criação de espetáculos e, temos os nossos projetos de formação em cinema a decorrer aqui no Concelho do Seixal, como também no Concelho de Oeiras, os Cineclube, que são projetos de formação e de criação de filmes, formação ao longo seis meses, aproximadamente, formação em argumento, formação em realização, em produção e, depois, com a parte prática que é as rodagens do filme que cada aluno criou, e depois a montagem desse filme e, a fase final, a apresentação numa gala em que mostramos todos os filmes que foram desenvolvidos ao longo de cada um dos projetos.

Em termos de espetáculos, estamos à espera de respostas para uma criação, esta sim para público geral, que é a Desmesura, Exercício com Medeia, também a partir de do livro com o mesmo nome, da autora, Hélia Correia. Por altura das comemorações do 25 de Abril, estreámos uma versão adaptada de um espetáculo que já tínhamos realizado anteriormente, que é PENÉLOPE, e criámos agora esta versão adaptada, que se chama As Cartas de Penélope. É uma fusão entre a leitura performance com interface entre o vídeo e o som e a performance e, que versa sobre a correspondência trocada durante aquele período um bocado obscuro da nossa história, o período da Guerra Colonial portuguesa. Eram toneladas diárias de cartas trocadas, aerogramas, postais trocados entre a metrópole e África, e entre África e a metrópole. Além desse produto que tem interface entre a performance, o vídeo e o som, ainda temos uma conversa de roda com o público, sendo que este também pode partilhar histórias que tenha e testemunhos. Esta conversa faz mesmo parte do produto artístico, ou seja, a performance é mais curta e o ónus depois versa sobre a conversa com auxílio dos espólios particulares que temos. Queremos, de facto, levar a Penélope a públicos específicos, quer escolas secundárias, como a outras comunidades, ou seja, pessoas mais velhas que não têm possibilidade de se deslocar a determinados auditórios, numa perspetiva de perpetuar a memória para que isto não se desvaneça.

TEASER | CONSTANTINO, O BICHO DE CONTOS ESTREOU A 20 DE MAIO

Já conhecias a obra “Constantino, O Bicho de Contos”? Ficaste curioso/a com a nova peça encenada pela RUGAS Associação Cultural?

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