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Seberg – Contra Todos os Inimigos, em análise

A vida da actriz norte-americana Jean Seberg é contada num elegante thriller de espionagem inspirado em factos reais e no polémico percurso político da ícone da Nova Vaga do cinema francês. ‘Seberg – Contra Todos os Inimigos’, protagonizado por Kristen Stewart e Anthony Mackie, estreia a 20 de fevereiro, nos cinemas nacionais.

’Seberg – Contra Todos os Inimigos’ abre com a reconstituição da cena da estaca na fogueira de ‘Santa Joana’ (1957), de Otto Preminger, o filme que lançou Jean Seberg (Kristen Stewart), aos 18 anos (e no qual ela também se queimou, note-se). Depois protagonizou ‘Bom Dia, Tristeza’, quando ainda não era muito conhecida, mas tinha já uma experiência traumática resultante das suas colaborações com o realizador austríaco. A fama e o sucesso chegariam mais tarde, em 1960, com a sua participação em ‘O Acossado’ de Jean-Luc Godard.

TRAILER DE ‘SEBERG – CONTRA TODOS OS INIMIGOS’

Mas estas participações nas obras da ‘nouvelle vague’ não vimos neste filme. De Joana d’Arc seguimos logo a vida da atriz, no período em que regressa a Hollywood para fazer uma série de filmes (de 1965 a 1970) até mais ou menos 1971; ou seja, quando se envolve nos movimentos anti-guerra e de luta pelos direitos humanos e exactamente para os momentos da sua súbita paixão pelos famosos Black Panters, um movimento revolucionário negro contra a discriminação racial nos EUA — que foi um dos pesadelos do FBI de Edgar J. Hoover — acabando por ‘enrolar-se’ — apesar de já ser casada — com Hakim Jamal (Anthony Mackie), um dos seus líderes mais fogosos e carismáticos, um militante a quem a polícia chamava de ‘viciado em pornografia e ‘ex-doente de hospital psiquiátrico’. Como os agentes do FBI, Jack Solomon (Jack O’Connell) e Carl Kowalski (Vince Vaughn) passavam a vida controlando as acções de Jamal, tornou-se quase inevitável que as suas atenções se virassem para a ‘diva apaixonada’, que parecia estar a querer ‘brincar com fogo’.

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Seberg não hesitou mesmo ir-se afirmando como uma activista radical tentando a todo o custo, mudar as coisas e procurando fazer a diferença em relação a outras divas do cinema, embora na verdade não tivesse sido muito bem sucedida. Contudo, não escapou e passou a ser objeto de uma campanha de perseguição e difamação cada vez mais pesada, orientada pelo FBI e por certos media sensacionalistas e conservadores. Tanto que o próprio agente Solomon, — fascinado e obcecado pela atriz — diferentemente do agressivo Kowalski, tenta em vão distanciar-se. No entanto, cada vez mais perturbada e paranóica, Seberg também com seu ‘casamento aberto’ com o famoso dramaturgo e escritor francês Romain Gary (Yvan Attal), cada vez mais em risco, começa a falar da ideia de suicídio.

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“Seberg: Contra Todos os Inimigos” ©NOS Audiovisuais

Animados por uma certa indignação e vontade de questionar os factos, o realizador Benedict Andrews e os argumentistas Joe Shrapnel e Anna Waterhouse colocaram-se numa espécie de beco sem saída, mexendo com a história verdadeira — que suspeitamos ter sido enfim, expurgada — e o processo de auto-destruição da jovem estrela que estava na altura no topo da fama. ’Seberg-Contra Todos os Inimigos’ denúncia os erros evidentes de um sistema de investigação agressivo e violento, que vai até ao insulto dos direitos liberdades e garantias de qualquer cidadão norte-americano, ilibando inclusive os responsáveis morais pelo sucedido com a actriz. Para conseguirem um certo equilíbrio, a equipa criativa de ’Seberg-Contra Todos os Inimigos’ inventou até um policia (ou agente do FBI) bonzinho e idealista, complementado pela sua esposa sensível (Margaret Qualley) e (provavelmente) liberal, e que tem uma paixão pelos livros aos quadrinhos originais da década 40. O ainda jovem realizador Benedict Andrews, vindo do teatro — tem duas memoráveis realizações-encenações de ‘Gato em Telhado de Zinco Quente’ e ‘Um Eléctrico Chamado Desejo’, de Tennessee Williams, para o National Theatre Live londrino — e realizou ‘Una—Negra Sedução’ (2016) constrói atmosferas e cenários sempre com uma mão enluvada e suave em termos dramáticos e narrativos. Por outro lado, pôde contar com uma esforçada dedicação ao papel da sua protagonista Kristen Stewart, nunca, é certo muito empática, mas inteligente, talentosa, e bastante escrupulosa ao reinventar sem medos um personagem famoso e até, pelo contrário, sem exagerar na sua interpretação.

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Anthony Mackie em “Seberg – Contra Todos os Inimigos” | ©NOS Audiovisuais

De qualquer modo as interpretações do restante elenco seguem todas elegantemente pelo mesmo caminho, a começar pela esposa-americana de Margaret Qualley (vimo-la em ‘Era Uma Vez Em…Hollywood’, de Quentin Tarantino e em breve em ‘My Salinger Year’, filme de abertura da 70ª Berlinale), ao carisma irritante de Anthony Mackie, em Hakim Jamal, ao escrupuloso agente do FBI interpretado pelo inglês Jack O’Connell — grande actor dos palcos londrinos — e a terminar na agressividade canina, do experiente e sempre competente Vince Vaughn, na figura do polícia-mau. Um bom filme para recordar a bela diva, um símbolo do cinema francês, que quase como outras actrizes da época, acabou por ter um final trágico.

JVM

Seberg – Contra Todos os Inimigos
Seberg: Contra todos os Inimigos

Movie title: Seberg

Date published: 18 de February de 2020

Director(s): Benedict Andrews

Actor(s): Kristen Stewart, Anthony Mackie, Jack O’Connell, Vince Vaughn, Margaret Qualley

Genre: Drama, Biografia, Thriller, Reino Unido/EUA, 2019, 102'

  • José Vieira Mendes - 70
  • Rui Ribeiro - 83
77

CONCLUSÃO

’Seberg — Contra Todos os Inimigos’ é um elegante thriller político e um biopic temporal sem grandes pretensões, sobretudo onde a malograda actriz é muito bem interpretada por uma talentosa e inteligente Kristen Stewart, que apoiada pelo excelente trabalho de figurinos e maquilhagem, parece-se sem exageros muito mais com Joan Seberg do que à partida poderíamos imaginar.

O MELHOR: A esforçada e dedicada interpretação de Kristen Stewart, que se cuida para não chegar ao overacting de ser igualzinha a Joan Seberg;

O PIOR: A figura do agente Jack Solomon, parece demasiado bonzinho e liberal, para aqueles tempos em que o FBI era um feroz instrumento de intimidação contra a revolução.

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