Dumb Money, a Crítica: Paul Dano e Pete Davison, irmãos cúmplices em paródia a Wall Street
Nas salas nacionais desde 21 de setembro, e à altura de redação deste artigo na sua segunda semana de exibição, ainda presente em 17 telas de norte a sul, “Dumb Money”, de Craig Gillespie (“Eu, Tonya”, “Cruella”) é uma comédia leve acerca de um evento verídico capaz de abalar as certezas de Wall Street.
No início de 2021, com a devastadora pandemia de COVID-19 no seu pico, um pequeno terramoto abanou, na vida real, a estrutura de Wall Street e colocou algum poder (mesmo que ilusório e temporário) na mão do cidadão comum. Todos nos devemos recordar do que aconteceu: um Youtuber especialista na bolsa convenceu os seus seguidores a investir na GameStop, uma empresa de lojas de videojogos norte-americana altamente desvalorizada em bolsa. Os resultados foram imprevisíveis e hilariantes.
Saltamos nem dois anos depois de “concluída” a história verídica que inspirou esta longa-metragem, e eis que surge no panorama “Dumb Money”, uma comédia situada no mundo financeiro, que na veia de filmes prévios como “A Queda de Wall Street” ou “O Lobo de Wall Street”, nos troca por miúdos aquilo que é a bolsa, a sua forma não democrática e não justa de atuação e os seus vícios.
Sem nunca aspirar a ser grande “Cinema” (com “C” maiúsculo), “Dumb Money” entra naquela categoria de “stick it to the rich” ou “eat the rich” (“dar uma lição aos ricos”), onde podemos encontrar obras deliciosas como “O Triângulo da Tristeza”, “O Menu” ou a série “The White Lotus”. E sim, este novo filme de Craig Gillespie não é uma grande obra nem dentro dos filmes sobre a bolsa nem entre as comédias que satirizam o 1% e retiram prazer dos seus percalços, mas não deixa de se apresentar como entretenimento puro eficaz.
Com “Dumb Money”, baseado no livro “The Antisocial Network” , tudo começa com Keith Gill (Paul Dano), um Youtuber conhecido pelo pseudónimo “Roaring Kitty” e que se distinguia através do humor com que cobria as flutuações do mercado. Formado em Finanças mas saído da faculdade após um crash da bolsa, Keith nunca teve a oportunidade de trabalhar numa corretora de topo. Contudo, trabalhava na área e era astuto no que diz respeito à intervenção junto da sua audiência.
Como indivíduo privado, Keith conseguiu o impensável: convencer os seus seguidores e seguidoras a comprar acções da GameStop, empresa retalhista de videojogos que se encontrava subvalorizada pela bolsa, com os próprios fundos de investimento a tentar afundar a empresa, “apostando” na sua falência breve a assim colhendo dividendos.
Nesta narrativa fílmica, é empolgante observar o nosso protagonista a mover uma multidão de cidadãos comuns, tentando convencê-los a investir numa empresa alegadamente condenada na bolsa. O grande Paulo Dano (“Uma Família à Beira de um Ataque de Nervos”, “Os Fabelmans”) é excelente e excêntrico neste papel central, sendo que protagonista de filme de estúdio não é o espaço que habita mais habitualmente. Todavia, o invulgar Keith assenta-lhe que nem uma luva.
Empolgante e caracterizado por uma montagem frenética e música alta, “Dumb Money” coloca os holofotes sobre vários pessoas comuns, pequenos investidores anónimos que foram capazes de machucar alguns grandes fundos de investimento. E mesmo que o filme não tenha a estética mais bela ou inovadora, e mesmo que siga a fórmula de outras longas prévias sobre a bolsa, não deixa de conseguir explicar-nos, clarificando um discurso complicado, o que aconteceu exatamente com a GameStop e com os fundos que investiam contra ela.
E apesar de Dano ter aqui um nobre papel de protagonista, esta é uma obra acima de tudo de elenco. Grande parte do orçamento desta produção foi, aliás, gasto em cachês. Ao longo de perto de duas horas, vamos acompanhando um número bastante amplo de pessoas comuns que lucraram com este “ataque à bolsa”, da enfermeira interpretada por America Ferrera (“Barbie”) ao trabalhador da Gamestop de Anthony Ramos (“Hamilton”).
Do outro lado, os bilionários e gestores de fundos da vida real são interpretados por atores cómicos (e não só) eficazes (embora aqui tenham personagens algo caricaturais), que aliás têm menos tempo de ecrã do que habitualmente lhes é concedido: como Seth Rogen (“Os Fablemans”), o versátil Nick Offerman (“Parks & Rec.”) ou até um quase irreconhecível Sebastian Stan (que já havia participado em “Eu,Tonya”).
Já no papel de esposa compreensiva algo unidimensional temos Shailene Woodley (“Big Little Lies”) e no papel do irmão rebelde e hedonista de Keith, temos o comediante Pete Davison (“O Rei de Staten Island”) no seu maior papel no cinema até agora. Pelo menos num filme/série não baseados na sua vida. O sempre polémico Davidson representa uma outra versão de si próprio, como é habitual, mas não deixou de arrancar as maiores gargalhadas da sala onde vimos o filme, justificando este seu salto para o cinema que é fácil ver com alguma incredulidade. Além disso, as suas interações com Dano apresentam-se, surpreendentemente, como alguns dos momentos mais humanos do filme.
Tão fragmentado que é “Dumb Money” e não conseguimos focar-nos verdadeiramente na história de ninguém. A única personagem com mais profundidade é o nosso impulsionador da ação, O Keith de Paul Dano. Tudo o resto acaba por ser um pouco um borrão povoado por lugares-comuns. Não obstante, com as suas constantes piadas, a sua ironia mordaz e a sua crítica feroz ao sistema capitalista, não há como não desfrutar da visualização deste filme.
TRAILER | DUMB MONEY – JÁ NOS CINEMAS DE NORTE A SUL
Dumb Money, em análise
Movie title: Dumb Money
Movie description: “Dumb Money” é o derradeiro conto de David vs. Golias, inspirado na louca história verídica ocorrida durante a pandemia na qual pequenos investidores derrotaram os grandes fundos de investimento, no fenómeno que ficou conhecido como “meme stocks”, com enfoque nos acontecimentos em torno das ações da GameStop (sim, a loja de videojogos de centro comercial).
Date published: 29 de September de 2023
Country: EUA
Duration: 104'
Author: Lauren Schuker Blum, Rebecca Angelo
Director(s): Craig Gillespie
Actor(s): Paul Dano, Pete Davidson, America Ferrera, Nick Offerman, Anthony Ramos, Sebastian Stan, Shailene Woodley, Seth Rogen, Vincent D'Onofrio,
Genre: Comédia, Biografia
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Maggie Silva - 70
CONCLUSÃO
Um filme de elenco divertido e bem ritmado, “Dumb Money” não inventa a roda, mas é capaz de entreter durante perto de duas horas. Paul Dano tem direito a ser o protagonista que raramente é, America Ferrera (sempre no eterno papel da mulher com garra da classe trabalhadora) continua a encantar-nos e Pete Davidson mostra que talvez até consiga fazer cinema (mesmo que o seu papel nunca passe do auto-referencial).
Pros
- Humor mordaz.
- Entretenimento puro.
- Paródia de Wall Street capaz de empolgar.
- Não se leva tão a sério quanto isso.
Cons
- Falta de distância temporal entre o evento referenciado e a altura em que os tais eventos decorreram.
- Personagens com pouca profundidade (por serem demasiadas) e a esmagadora maioria dos atores centrais a interpretarem papéis que são lugares-comuns ou reforços do seu “typecasting“.
- Mergulhado em cultura da internet, “Dumb Money” é mais memes e imagens de arquivo do que criação genuína de estilo. A sua estética, essa, é uma salada russa.
