Eternals | © Marvel Studios/Disney

Eternals (Eternos), em análise

“Eternals (Eternos)” contém problemas narrativos que afetam a sua estrutura e ritmo, mas Chloé Zhao entrega mais um capítulo sólido da MCU.

Eternals (Eternos)” é a 26ª parcela do universo cinemático mais popular da atualidade. Desde o fim da Saga do Infinito que o público tem esperado pelo próximo grande passo. Todos sabiam que a MCU precisava de se tornar cósmica e lidar com um tipo completamente diferente de super-heróis. Kevin Feige confiou a Chloé Zhao – vencedora dos Óscares para Melhor Realizador e Melhor Filme com “Nomadland” – o projeto provavelmente mais importante da Phase Four. Este filme supostamente marca o início de uma nova Era de heróis e ainda apresenta o próximo “big bad” – ou, pelo menos, um vilão desse nível. Então, enquanto esperamos pelo Multiverso, há que discutir o altamente divisivo “Eternals (Eternos)“.

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Começo pela última frase. Para quem não me conhece, adoto uma “ideologia crítica” livre de trailers desde 2016, logo, como já é costume, consegui evitar todo o tipo de conteúdo relacionado com a publicidade do filme, mas era difícil ignorar a evolução negativa do consenso geral dos críticos. Normalmente, todos estes blockbusters megalómanos são recebidos com reações extraordinariamente positivas que sobrevalorizam qualquer trabalho. No entanto, é incomum um filme tão bem recebido obter exponencialmente críticas negativas ao ponto em que a opinião geral se torna 50-50. Os problemas narrativos e estruturais são inegáveis do meu ponto de vista, mas estão longe de dominar os inúmeros aspetos excelentes do filme.

Permitam-me retirar já o “mau” do caminho. “Eternals (Eternos)” tem uma equipa de quatro argumentistas: a própria Zhao, Patrick Burleigh (“Peter Rabbit 2: The Runaway”), Ryan Firpo e Kaz Firpo. A maioria dos filmes dentro da MCU possui mais do que apenas um par de pessoas responsáveis pelo argumento, por isso, nada de novo aqui. No entanto, não consigo deixar de considerar o número de escritores ligados a esta obra um dos motivos pelos quais a própria se perde no meio de tanta exposição e “world-building”, esquecendo-se das personagens e da história central.

eternals marvel
©2021 MARVEL

“Eternals (Eternos)” salta para trás e para a frente no tempo constantemente para explicar tudo à audiência. Literalmente tudo. Desde a origem dos próprios Eternals, Deviants e Celestials às regras religiosas, hierarquia cósmica e princípios que as personagens devem manter bem seguros nos seus corações. Contrariamente a muitas opiniões, não considero o tempo de execução muito longo. A duração de 157 minutos até se ajusta à quantidade de história que Zhao e a sua equipa desejam estabelecer e desenvolver ao longo desse período. É a preparação e execução da dita história que não funciona tão bem.

Em primeiro lugar, o erro número um que os cineastas podem cometer ao lidar com exposição: tratar o público como espetadores sem cérebro. Alguns diálogos expositórios parecem irrelevantes e desinteressantes em retrospetiva devido à necessidade incessante de explicar pontos de enredo ou prenunciar eventos que não precisam de nada disso. Estas cenas podiam ter sido substituídas por mais desenvolvimento de personagem, algo que já antecipava ser uma tarefa desafiadora. Com um elenco tão sonante e um grupo de heróis maior do que a equipa original dos Vingadores, não é surpreendente ver que algumas personagens acabam subdesenvolvidas.

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Torna-se ainda mais frustrante quando se repara que todos os Eternals possuem personalidades bastante cativantes. Alguns têm mais tempo de ecrã do que outros, o que é compreensível, mas os flashbacks carecem de uma narrativa eficiente tanto no que diz respeito ao enredo como às próprias personagens. Um twist em particular é guardado para a transição entre os últimos dois atos, mas o seu valor de choque é praticamente nulo devido ao forte prenúncio e à discussão repetitiva sobre o tópico que leva a essa revelação. Também considero o arco dos Deviants desapontante, especialmente quando o filme “engana” os espetadores, fazendo-os acreditar que existe algo mais do que aquilo que aparenta à superfície.

Com todos estes problemas, “Eternals (Eternos)” encontra-se longe de ser um dos piores filmes da MCU. Na verdade, mantém uma posição sólida na metade superior do quadro…

Relativamente à ação, apresenta os altos níveis de entretenimento que os fãs esperam. Os superpoderes distintos permitem algumas combinações fascinantes, criando sequências entusiasmantes. Os efeitos visuais estão “no ponto”, mas penso que nunca adjetivei um filme da MCU de “lindo”. Com a tremenda ajuda do diretor de fotografia de “Captain Marvel”, Ben Davis, “Eternals (Eternos)” é o filme mais lindo deste universo cinemático. Desde os planos largos de fazer cair o queixo aos ângulos mais íntimos, a cinematografia impressionante rouba os holofotes no campo técnico.

A banda sonora de Ramin Djawadi (“Game of Thrones”) acompanha a narrativa perfeitamente ao longo de todo o tempo de execução, mas é apenas no terceiro ato repleto de ação que realmente se transforma, tornando-se num factor indutor de arrepios. O guarda-roupa (Sammy Sheldon) também merece elogios, mas envio os meus parabéns a todos os departamentos por um filme tão bem produzido. Passando para o que torna este filme numa das obras mais arriscadas e ambiciosas dos últimos anos da Marvel: os seus temas.

Zhao percorre a linha ténue entre fé e fanatismo brilhantemente, algo que se torna numa das linhas narrativas mais cativantes do filme. Os Eternals acreditam no Celestial Arishem, a figura divina da sua “religião”. Algumas personagens mantêm uma devoção cega a Arishem e seguem os seus mandamentos sem questionar nada. Outros eventualmente começam a ver o mundo pela sua perspetiva, formando as suas opiniões e tomando as suas decisões. No entanto, é o meio-termo que Zhao acerta na perfeição.

Uma personagem – que não vou spoilar – acredita em Arishem tanto quanto os fanáticos, mas respeita e entende outras posições. A certa altura, um dilema moral impossível é colocado aos pés dos nossos heróis, onde basicamente estes aplicam o que a sua religião lhes ensinou, ou seguem os seus próprios corações. Honestamente, não existe uma resposta correta e Zhao demonstra isso ao público através do comportamento de cada personagem.

Eternals Ikaris
©Marvel Studios 2021

“Eternals (Eternos)” é, sem dúvida, uma história guiada por exposição, mas o seu sucesso depende quase exclusivamente do quanto o público se aproxima emocionalmente dos heróis. Não entrarei em detalhes sobre todos, mas devo elogiar desde já as prestações excecionais. Todos incorporam as suas personagens sem esforço. O elenco diverso e inclusivo oferece aos fãs da MCU novos favoritos e defendo a teoria de que será extremamente improvável que um espetador não crie uma conexão com alguém no filme. Na verdade, “Eternals (Eternos)” é um filme de “primeiros” em muitas áreas.

Não só contém a primeira cena de sexo do universo cinemático, mas também apresenta a primeira personagem surda e a primeira família abertamente gay. Não mencionaria estes pormenores – principalmente o último – se não tivessem causado tanta polémica, nomeadamente um mercado de distribuição específico que proibiu a projeção do filme. É verdade que, nos últimos anos, os estúdios tentaram forçar inclusão e diversidade em centenas de projetos, levando a filmes focarem-se de forma aleatória e estranha em determinados traços de personagens como se fossem algo especial em vez de os normalizar. Zhao é inteligente o suficiente para lidar com estes tópicos delicados com cuidado.

Eternals Arishem the Judge
©Marvel Studios 2021

Tudo é abordado como qualquer outra cena no filme. Todos os beijos são filmados exatamente da mesma maneira e a cena de sexo desenrola-se naturalmente, pois é assim que a intimidade funciona. As personagens em si podem não estar totalmente desenvolvidas, mas as suas relações parecem surpreendentemente genuínas e emocionalmente convincentes. Ikaris (Richard Madden), Sersi (Gemma Chan), Phastos (Brian Tyree Henry), Sprite (Lia McHugh) e Thena (Angelina Jolie) são os meus destaques pessoais quando se trata dos Eternais.

No entanto, considero as relações entre Druig (Barry Keoghan) e Makkari (Lauren Ridloff), assim como entre Thena e Gilgamesh (Don Lee) as que mais compensam o investimento dos espetadores. Kingo (Kumail Nanjiani) é usado principalmente para “comic relief”, exceto numa das minhas cenas favoritas, relacionada com os eventos do terceiro ato. No final, é Karun (Harish Patel), o criado de Kingo, de quem me recordo com mais carinho. Karun representa o melhor da humanidade: é humilde, honesto, leal, trabalhador e extremamente grato. Uma das performances mais genuínas de todo o ano.

O problema não está nas personagens, mas no que estas fazem com o tempo de ecrã que lhes é alocado. O filme parece desnecessariamente complexo e confuso em alguns pontos, mas acredito firmemente que, se os espetadores conseguirem estabelecer uma ligação emocional com algumas personagens, estes problemas podem acabar por se tornar insignificantes. Já agora, convém referir que Dane Whitman (Kit Harington) é apenas uma espécie de teaser neste filme do que ainda está por vir em conteúdo futuro, logo moderem as vossas expetativas.

Não se esqueçam de esperar pelas DUAS cenas pós-créditos!

Relembramos-te que Chloé Zhao foi a grande vencedora da passada edição dos Óscares da Academia, portanto aproveita para ler o nosso post-mortem sobre a edição das estatuetas douradas decorrida no passado mês de abril.

Eternals (Eternos), em análise
ETERNALS

Movie title: Eternals (Eternos)

Movie description: "Eternals (Eternos)", da Marvel Studios, acompanha um grupo de heróis para além das estrelas que protegem a Terra desde a criação do Homem. Quando criaturas monstruosas, os Deviants, há muito tempo dadas como extintas, regressam misteriosamente, os Eternals são forçados a reunir-se para, mais uma vez, defender a humanidade.

Date published: 11 de November de 2021

Country: Estados Unidos da América

Duration: 156'

Director(s): Chloé Zhao

Actor(s): Gemma Chan, Richard Madden, Kumail Nanjiani, Lia McHugh, Brian Tyree Henry, Lauren Ridloff, Barry Keoghan, Don Lee, Kit Harington, Salma Hayek, Angelina Jolie,

Genre: Ação, Aventura, Fantasia

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  • Manuel São Bento - 70
  • Virgílio Jesus - 80
  • João Fernandes - 80
  • Marta Kong Nunes - 75
  • Ana Inês Carvalho - 75
76

Conclusão

“Eternals (Eternos)” apresenta problemas narrativos evidentes que afetam a sua estrutura geral e ritmo, mas Chloé Zhao consegue entregar mais um capítulo sólido da MCU. Repleto com prestações excecionais por parte do elenco cheio de estrelas, Zhao não deixa de seguir algumas das fórmulas de sucesso da Marvel, mas o seu estilo único traz novos atributos para o universo cinemático, tais como a cinematografia distintamente deslumbrante e temas profundos sobre fé e humanidade. Apesar do argumento guiado por exposição pesada, o grupo de personagens admitidamente subdesenvolvido, mas inclusivo e diverso, contém relações emocionalmente genuínas. Para os fãs da ação obrigatória, os níveis extraordinários de entretenimento continuam presentes, mas é definitivamente o mais distante da MCU que um filme alguma vez esteve. Está destinado a ser divisivo, mas, felizmente, caí para o lado positivo.

Pros

  • Prestações do elenco inclusivo e diverso.
  • Estilo diferente do habitual na MCU, apesar de algumas fórmulas se manterem presentes.
  • Cinematografia torna o filme no mais bonito de todo o universo cinemático.
  • Exploração de temas profundos como fé e humanidade.
  • Relações entre as personagens.
  • Ação de alto nível, como esperado.

Cons

  • Problemas narrativos afetam a estrutura e ritmo.
  • Argumento guiado por exposição pesada e algo desnecessária.
  • Personagens subdesenvolvidas.
  • Arco dos Deviants tinha potencial para muito mais.
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