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MOTELx’23 | Hood Witch, a Crítica

“Hood Witch”, com estreia mundial mundial na presente edição do MOTELX, é a primeira longa-metragem escrita e realizada por Saïd Belktibia. Na competição europeia de 2023 para o  Prémio Méliès d’argent – Melhor Longa Europeia conquistou a menção honrosa do júri. Será meritório? 

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Em primeiro lugar, há que saudar o MOTELx, festival que sabe crescer e tornar-se um marco para o seu nicho respectivo. A acumular estreias mundiais na sua competição europeia, prova inequivocamente ser capaz de mostrar uma revista relevante do género do terror num dado ano.

Todavia, e por muito positivo que seja apresentar uma estreia mundial e com o realizador Saïd Belktibia presente na sala, reconhecemos em “Hood Witch”, obra francesa em co-produção com o Irão, uma tendência para o valor choque e uma incapacidade de fazer passar a sua mensagem de forma clara e empolgante.

Em “Hood Witch”, ou “Rokya”, no título original, somos apresentados a um conto que pensa a feitiçaria (e a nossa percepção da mesma) na época contemporânea. O arranque do filme é muito forte, com uma sucessão de imagens e clipes que ponderam a feitiçaria da época medieval até aos dias de hoje (smartphones e Tiktoks e tudo mais incluídos na reflexão).

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O que é que aconteceu desde então? A feitiçaria deixou de ser temida? Democratizou-se nas redes sociais? Ou a população continua a alimentar preconceitos infundados e a acusar, como boa sociedade patriarcal, mulheres da prática de feitiços?




Para respondermos a questões pertinentes e que nos primeiros minutos nos são apresentadas através de tal montagem bem conseguida, é-nos apresentada a história e vida de Nour (Golshifteh Farahan). Cidadã francesa muçulmana, Nour tem um emprego pouco usual, fazendo contrabando de animais exóticos e outros produtos raros, como venenos ou raízes.

Nour é sem dúvida excêntrica, mas é mais curandeira que feiticeira (ao fim de contas, não faz feitiços e não amaldiçoa pessoas). Antes, tenta ter um impacto positivo na sua comunidade e até tem uma app e um website para a ajudar a encontrar potenciais clientes. Inevitavelmente, tal deixa-a bastante exposta a ser rotulada como “bruxa do bairro“.

Todavia, a carreira e vida de Nour, que procura o melhor para o seu filho e também divorciar-se de vez de um marido tóxico, é irremediavelmente destruída quando uma das suas consultas dá para o torto. O caso de um jovem esquizofrénico que Nour propõe tratar através de um exorcismo e não através da mais cara medicação tradicional. Quando Nour se apercebe do seu erro de discernimento, já é tarde de mais.

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Daqui para a frente, Nour é alvo de uma verdadeira caça às bruxas no sentido literal. Tudo isto leva-a a agir de forma errática, à medida que teme pela sua segurança e pela segurança do seu filho. A restante duração da longa-metragem vê-se pautada pela estrutura do filme de vingança, com uma sequência rápida de eventos e muita ação à mistura. Como mencionado, o valor choque está também muito presente e o que não sobra é pausa para a reflexão.




Por tudo isto, e por muito que o filme queira confrontar de frente a superstição, o patriarcado e o fundamentalismo religioso, parecendo deixar uma consideração interessante acerca das muitas formas em que ser curandeira não é assim tão diferente de ter fé em deus, a verdade é que a sua mensagem é sempre ambígua.

Nour de facto foi indiretamente responsável por um evento trágico e à medida que o filme vai evoluindo vai cometendo outros actos dúbios, seja para salvar-se a si própria e ao filho ou simplesmente por pura raiva. Com um comentário ou outro bem interessante, como a visita aos arrepiantes centros de exorcismo/ purificação para muçulmanos, estes momentos bons de “Hood Witch” não conseguem contrabalançar o tom algo risível de muitos instantes da história.

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Aqui temos um exemplo clássico de uma ideia superior à sua execução prática.  Saïd Belktibia, neste seu argumento, fica-se pela superficialidade. Vibramos com a proposta central, e não desgostamos inteiramente da resolução. Todavia, nos entretantos, nunca compreendemos verdadeiramente quem é Nour, o seu filho ou o seu ex. Todos eles superficiais, todos eles simplesmente submetidos à ditadura de fazer avançar a acção.

Arriscamo-nos a dizer que a excelente atriz de topo iraniana Golshifteh Farahani (“Paterson”, “About Elly”) merecia um maior desenvolvimento de personagem, pois é ela o grande elemento vencedor e estrela desta obra. Não podemos dizer que eleve o argumento, mas garante uma entrega inesquecível. Contudo, das suas palavras e dos seus actos, desses esperávamos menos hipérbole e mais especificidade.

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O MOTELX decorreu, em 2023, entre os dias 12 e 18 de setembro. Continua a acompanhar a nossa cobertura, com diversas críticas já publicadas e por publicar. 

Hood Witch, em análise

Movie title: Hood Witch

Movie description: Nour ganha a vida fazendo contrabando de animais exóticos e produtos ilícitos (aves de rapina, venenos, raízes raras e coisas demais), e actuando na sua comunidade como uma espécie de curandeira. Desejando um futuro melhor para o filho fora da cidade onde vivem, ela cria uma app que conecta clientes e marabus. A sua ideia é um sucesso, mas quando uma destas consultas se transforma numa tragédia, Nour vê-se confrontada com uma onda de violência e perseguição que pode custar a sua vida e a do seu filho.

Date published: 20 de September de 2023

Country: França

Duration: 91'

Author: Saïd Belktibia, Louis Penicaut

Director(s): Saïd Belktibia

Actor(s): Golshifteh Farahani, Denis Lavant, Jérémy Ferrari

Genre: Thriller, Drama

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  • Maggie Silva - 57
57

Conclusão

Aqui temos um exemplo clássico de uma ideia superior à sua execução prática. Saïd Belktibia, neste seu argumento, fica-se pela superficialidade. Vibramos com a proposta central, e não desgostamos inteiramente da resolução. Todavia, nos entretantos, nunca compreendemos verdadeiramente quem é Nour, o seu filho ou o seu ex. Todos eles superficiais, todos eles simplesmente submetidos à ditadura de fazer avançar a acção.

Pros

  • Golshifteh Farahani não é menos que estupenda, como habitual;
  • Uma boa premissa de partida.

Cons

  • “Hood Witch” tem boas ideias, mas não tira delas o melhor partido;
  • A vontade de chocar quem vê é rei e rainha;
  • Não são inteiramente compreensíveis as intenções da obra;
  • Mais filme da acção que drama ou comentário societário.
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