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My Animal no MOTELx’23, a Crítica: Um ‘coming of age’ feral de cortar a respiração

Altamente estilizado e mergulhado num jogo de cores luxurioso e sensual, “My Animal” explora a temática da Licantropia através de uma abordagem arrojada e fora do cânone hollywoodesco. Vimos o filme por ocasião da mais recente edição do MOTELx (12-18 setembro) e trazemos as nossas impressões. 

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Assinado pela canadiana Jacqueline Castel (mais conhecida pela realização de videoclipes e curadoria de arte) e a partir do argumento assinado por Jae Matthews (também conhecida pelo seu trabalho no mundo da música), “My Animal” é  um sonho febril que explora o mito do lobisomem a partir de um ângulo não tão comum quanto isso: como metáfora para a puberdade e ainda para a afirmação da identidade sexual e de género.

A obra chegou ao MOTElx, apresentada em sala pela sua realizadora, como parte da selecção “Serviço de Quarto”, a qual traça uma retrospectiva de algum do melhor terror feito, no último ano, à escala internacional. Não podia deixar de ser, uma vez que “My Animal” tem vindo a percorrer o circuito de festivais desde o início de 2023, com arranque no importantíssimo Sundance Film Festival, e passando por outros festivais de referência como o Outfest ou o Fantasia.

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Uma primeira longa de ficção para Jacqueline, depois de trabalhos no campo do documentário e da música, “My Animal” é audaz na sua exploração de um mito do terror como símbolo para as dores de crescimento e conquista-nos através da sua especificidade visual. Com uma banda sonora elevada, os créditos iniciais são desde logo inebriantes e marcados pelas invulgares e inesperadas imagens de culturismo que se sucedem no grande ecrã.

Motelx serviço de quarto
Bobbi Salvör Menuez em My Animal (2023) |©Paramount Global Content Distribution

“My Animal” traça a história de Heather (Bobbi Salvör Menuez, uma atriz aqui estupenda e que esperamos ver muito mais no futuro), uma jovem apaixonada por hóquei, que não obstante a sua vontade, não consegue juntar-se à equipa masculina local. Heather encontra-se numa espécie de limbo: já acabou o liceu e trabalha no complexo desportivo local, mas a sua vida é dominada pela forma como consegue (ou não) controlar a sua animalidade e os seus impulsos.

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Lobisomem do lado do pai, Heather vive aguilhoada (de forma quase literal) e sem liberdade em noites de lua cheia. Tudo muda para a jovem quando conhece Johny (a luminosa e igualmente promissora Amandla Stenberg, de “Bodies Bodies Bodies”), uma patinadora artística com um namorado difícil e um pai controlador. Quando Johny começa a treinar no seu ringue, a sua etérea aparência, o seu carácter destemido e a sua presença magnética enfeitiçam Heather.

É com destreza e eficácia que Jacqueline Castel filma e enquadra o princípio deste amor, e não obstante uma cena sexual estilizada em excesso (as cores têm um papel importante neste filme, por norma bem utilizadas, mas nem sempre bem doseadas) e com demasiada câmara lenta, o desenrolar dos eventos é satisfatório e consegue transportar-nos de forma muito eficaz para o desolador e inóspito clima de uma pequena cidade no norte do Canadá, onde o tempo parece estar parado.

A realizadora reforçou, na sessão de perguntas e respostas, que gravou o filme precisamente neste tipo de cidade. Um pequeno local esquecido pelo tempo, onde 2022 parece antes 1992, onde a “vibe” retro ameaça devorar tudo. Perante o parco orçamento, seria essencial encontrar uma localização que transmitisse de forma plena o espírito da obra. Missão cumprida.

Motelx My Animal
©Paramount Global Content Distribution

E embora a lógica do videoclipe esteja presente em demasia, fazendo a história submeter-se, por vezes, ao valor estético, há muito para apreciar em “My Animal” – das complexas dinâmicas familiares retratadas à relação cúmplice entre as duas protagonistas (Bobbi e Amandla já se conheciam da cena queer de Nova Iorque e a química genuína entre si já lá estava antes das próprias filmagens, numa coincidência feliz).




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Além disso, a própria obra tenta não ser demasiado taxativa quando nos apresenta o acordar sexual de Heather. A personagem tem espaço para crescer, apaixonar-se, cometer erros, ser magoada, purgar a sua pequena cidade de presenças menos convidativas e encontrar-se pelo caminho. E se a resolução não é perfeita, o trajeto de Heather é sempre apaixonante e interessante.

Algo é certo:estaremos de olho no trabalho de Jacqueline Castel, em anos vindouros.

TRAILER | MY ANIMAL, TERROR COM UMA ATMOSFERA RICA, NO MOTELX

Com distribuição internacional por parte da gigante Paramount, esperamos ver em breve esta obra (embora ainda sem data anunciada) nas salas de cinema portuguesas. 

My Animal, em análise
My animal MOTELX poster

Movie title: My Animal

Movie description: Heather, uma jovem guarda-redes de hóquei no gelo rejeitada pela sua pequena cidade no norte do Canadá, apaixona-se pela recém-chegada Jonny, uma atormentada patinadora artística. À medida que o relacionamento das duas se aprofunda, os desejos crescentes de Heather colidem com seu segredo familiar mais sombrio, forçando-a a controlar o animal dentro de si.

Date published: 23 de September de 2023

Country: Canadá

Duration: 103'

Author: Jae Matthews

Director(s): Jacqueline Castel

Actor(s): Bobbi Salvör Menuez, Amandla Stenberg, Stephen McHattie

Genre: Terror, Sobrenatural, Romance

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  • Maggie Silva - 78
78

Conclusão

“My Animal” é  um sonho febril que explora o mito do lobisomem a partir de um ângulo não tão comum quanto isso: como metáfora para a puberdade e ainda para a afirmação da identidade sexual e de género.

Pros

  • A proposta distinta, que casa a narrativa típica das dores de crescimento com as histórias de lobisomens;
  • O elenco e a cumplicidade nítida entre as duas intérpretes centrais;
  • A queerness expressada através de ferramentas pouco usuais;
  • Um estilo próprio, muito dramático e teatral, mas ainda assim com algum humor à mistura;
  • Que banda sonora!

Cons

  • Quiçá o final, que nos deixa à espera de mais e de uma resolução ainda mais marcante depois de um confronto repleto de perigo, adrenalina e dinâmicas complicadas entre as personagens;
  • A alta estilização da imagem (calma com tanto filtro!), e o claro passado nos videoclipes por parte da realizadora, é um trunfo durante a esmagadora maioria da duração de “My Animal”. Todavia, há algumas excepções, onde algum naturalismo poderia ser mais benéfico para o enredo.
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