Oscares 2019 Filmes Esqueçidos

Óscares 2019 | Os filmes injustamente esquecidos pela Academia

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Depois das nomeações para os Óscares, é altura de recordar e honrar os grandes filmes que, infelizmente, foram ignorados pela Academia de Hollywood.

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Apesar da sua fama, encarar os Óscares como reflexo de uma meritocracia pura e dura é um erro ingénuo. A Academia de Hollywood foi formada originalmente por grandes personalidades dos maiores estúdios de Hollywood que queriam novas oportunidades de promover seus produtos e encontrar validação prestigiosa para o seu trabalho.

O reconhecimento de mérito artístico nunca foi a ordem do dia e inúmeros fatores contribuem para que, todos os anos, os Óscares sirvam mais como um reflexo do modo como Hollywood pensa sobre si mesma e a que tipo de cinema dá valor do que um apto barómetro de qualidade ou importância estética.

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Com isso em conta, decidimos celebrar alguns filmes que, por uma miríade de razões, não caíram nas boas graças do corpo votante que atribui os Óscares, que é formado por alguns dos nomes mais respeitados da indústria cinematográfica americana. Como critério de seleção, optámos por apenas considerar filmes dentro da lista de elegibilidade da Academia e obras que realisticamente poderiam ter sido premiadas por esta instituição. Ou seja, nada de filmes muito obscuros ou obras experimentais.

Por essa mesma razão, temos de excluir “The Other Side of the Wind”, essa obra de Orson Welles que foi ‘terminada’ este ano e distribuída pela Netflix. O contexto histórico desta obra é tão peculiar que considerámos ser melhor pô-la de fora desta lista. Contudo, fica aqui uma menção honrosa. Outro destaque vai para os quatro filmes que Nicole Kidman estreou em 2018 no mercado americano, “Destroyer: Ajuste de Contas”, “Boy Erased”, “Aquaman” e “Como Falar Com Raparigas em Festas”. Nenhuma das obras desse quarteto cativou a Academia, mas há que admirar a qualidade e variedade do trabalho desta inigualável atriz australiana.

oscares 2019 nicole kidman
2018 foi um grande ano para Nicole Kidman.

Sem mais demoras, usa as setas para ires passando os diferentes slides deste artigo. Os filmes foram simplesmente organizados por ordem alfabética.




ANIQUILAÇÃO de Alex Garland

Aniquilação
Um filme em diálogo com o espetador.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Cenografia, Efeitos Visuais, Banda-Sonora Original, Sonoplastia, Efeitos Sonoros

Para começar, temos uma proposta de ficção-científica cerebral, do tipo raramente visto sair dos estúdios de Hollywood. Trata-se de “Aniquilação”, uma adaptação do romance homónimo de Jeff VanderMeer, em que uma bióloga participa numa perigosa missão ao interior de uma zona coberta por uma misteriosa barreira translúcida onde fenómenos estranhos têm vindo a ocorrer. O realizador de tal obra é Alex Garland que, depois do sucesso de “Ex-Machina”, se parece querer assumir como o novo rei da ficção-científica no panorama do cinema americano.

Tratando-se de uma obra densa em metáfora e conceitos eternamente discutíveis, explicar a grandiosidade de “Aniquilação” em três parágrafos é algo um tanto ou quanto impossível. Contudo, fica aqui uma promessa de que esta bizarra narrativa, que parece ser a versão body horror do “Stalker” de Tarkovsky, resguarda em si alguns dos maiores horrores e maiores maravilhas do cinema de 2018. Desde uma dramatização assustadora de desespero feminino em cinco distintas variações a um retrato constantemente mutável do confronto entre o ser humano e a natureza necessariamente finita da sua existência, “Aniquilação” é um filme que quer dialogar com suas audiências, pedindo apenas sua generosidade e abertura a tal diálogo.

Em relação à performance pueril do filme na temporada dos prémios, só nos resta ficar enlutados. Afinal, como é possível que os cenários inventivos de um universo em constante e grotesca mutação não tenham valido nenhum reconhecimento? É insano pensar que o clímax do filme, onde Natalie Portman confronta um alien antropomórfico não tenha capturado interesse dos técnicos de efeitos visuais da Academia que nem sequer escolheram o filme como um dos seus dez finalistas. Pior ainda é a rejeição pelos profissionais do som, considerando como um grito gravado saído da boca de um urso cadavérico é provavelmente o mais memorável e infernal efeito sonoro do ano passado.




ASIÁTICOS DOIDOS E RICOS de John M. Chu

oscares asiaticos doidos e ricos
As comédias românticas estão de volta!

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Secundária (Michelle Yeoh), Argumento Adaptado, Figurinos

Há mais de duas décadas que não havia nenhum filme de Hollywood com todo um elenco principal formado por pessoas de origem asiática. Na verdade, apesar de representarem uma considerável percentagem da população americana, pessoas de etnia asiática são das minorias menos representada pelos grandes estúdios de cinema dos EUA. Este ano, “Asiáticos Doidos e Ricos” veio provar como tal falta de representação não só é uma mostra de hediondos preconceitos raciais internalizados na cultura popular, como também é uma péssima estratégia financeira. Afinal, esta adocicada comédia romântica adaptada de um livro de Kevin Kwan, foi um dos filmes mais lucrativos do ano.

De forma muito sumária, o filme conta a história de uma professora universitária sino-americana cujo namorado a convida a ir visitar sua família em Singapura, aquando do casamento do seu melhor amigo de infância. Durante a viagem, ela descobre que o namorado, longe de ser um humilde imigrante, é herdeiro de uma das maiores fortunas do mundo e sua família vive uma existência de estratosférica opulência e não estão nada contentes com a intrusão de uma estrangeira pobretanas com valores americanos.

Seguindo o modelo das grandes comédias escapistas da Grande Depressão, “Asiáticos Doidos e Ricos” é um espetáculo de riqueza sem limites tornada em entretenimento popular para as massas. Os figurinos, por exemplo, são um festim para os olhos, enquanto o guião é uma coleção de piadas de colisão cultural sombreadas por sérias considerações sobre a identidade cultural de americanos com origem chinesa. O clímax entre heroína e sua potencial sogra, interpretada por Michelle Yeoh a dar uma prestação merecedora de Óscar, é uma delícia improvável que consegue ser tão comovente como vitoriosa.




BLINDSPOTTING – À QUEIMA-ROUPA de Carlos López Estrada

oscares 2019 blindspotting
Dois amigos separados pela barreira do privilégio racial.

Devia ter sido considerado para: Melhor Ator Principal (Daveed Diggs), Argumento Original, Montagem

Entre os muitos filmes de grande urgência social que estrearam em 2018 sobre temas de tensão racial, “Blindspotting – À Queima-Roupa” foi um dos melhores e mais arrojados. Parte do seu sucesso deve-se ao extraordinário argumento que traça os dilemas de dois amigos de longa data, um afro-americano e o outro caucasiano, a viver em Oakland, na Califórnia dos nossos dias. Um deles está bem ciente da diferença que a sociedade traça entre o par, das discrepâncias de oportunidade e punição, enquanto o outro vive na ignorância privilegiada. É fácil entender qual é qual mesmo sem ter visto o filme.

No centro de tudo isso, Davees Diggs, famoso pela sua prestação vencedora de um Tony em “Hamilton”, afirma-se como a âncora do filme e um dos melhores atores de 2018. Quando listámos as prestações mais subvalorizadas do ano passado, tivemos isto a dizer sobre o trabalho do ator nesta obra:

Diggs faz tudo isto sem mostrar sinais de esforço, internalizando todos os conflitos em gestos reativos antes de explodir em cenas gritadas e até quase “cantadas” na segunda metade do filme. Sua grande mais-valia é a química que tem com o coprotagonista, mas seu maior e mais espantoso esforço é a capacidade para construir uma performance de apreensão interna num filme tão apoiado em constante diálogo como este. Quando ele finalmente deixa as suas emoções se mostrarem na plenitude e perde controlo, toda a repressão anterior valorizam e justificam o momento que funciona como um murro no estômago do espectador e das personagens em cena.

Além de tudo isso, o projeto conta com um elenco secundário igualmente hábil e um realizador adepto da experimentação, especialmente na mesa de montagem. Muita da energia febril do filme devém da sua estrutura a nível micro e macro, do modo como cenas se encadeiam em transições vistosas e uma só sequência pode transformar-se tonalmente, passando de uma comédia leve a uma tragédia lírica sobre um mundo injusto. É pena que os Óscares tenham demonstrado tanto desinteresse por este precioso trabalho de cinema enquanto diagnóstico de uma sociedade podre e doente.




COLETTE de Wash Westmoreland

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Keira Knightley em estado de graça.

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Principal (Keira Knightley), Ator Secundário (Dominic West), Argumento Original, Figurinos

Cinebiografias vestidas em modas do passado e insufladas de importância literária normalmente são uma aposta segura para os Óscares. Por norma, tratam-se também de exemplos de mediocridade cinematográfica, mais telefilmes da BBC que projetos merecedores da projeção no grande ecrã. Para mal e bem, tanto em termos de adoração dos Óscares e qualidade artística, “Colette” é a exceção que prova a regra.

O filme de Wash Westmoreland conta a história de como a mulher que viria a ser conhecida simplesmente como Colette passou de ser uma humilde rapariga de campo ao estatuto de lendário fenómeno da literatura francesa. A narrativa traça a sua relação profissional e pessoal com o marido, um empresário literário que publicou os primeiros livros da esposa sem lhe dar qualquer crédito. Longe de esta ser uma clássica exploração de abuso unilateral, “Colette” retrata como a escritora foi cúmplice ativa da sua própria opressão e gradualmente revela a viagem de autodescoberta que ela teve de tomar para ganhar autonomia. Além disso, trata-se do raro filme de época que retrata relações e indivíduos queer com verismo histórico, audaz franqueza e nem uma sugestão de moralismos perniciosos.

Por tudo isso, é uma verdadeira tragédia que “Colette” tenha sido quase totalmente ignorado na temporada dos prémios. Somente os Gotham e os BIFA parecem ter-se recordado da existência do filme. Num mundo justo, Keira Knightley teria sido falada como uma potencial candidata a Melhor Atriz pela sua impetuosa prestação no papel titular. De modo semelhante, Dominic West teria sido uma boa adição aos nomes que estiveram na corrida a Melhor Ator Secundário e a figurinista Andrea Flesch mais do que merecia ter recebido uma nomeação pelo seu exímio trabalho de recriação de estilos históricos incomuns, idiossincráticos e maravilhosamente estranhos.




DISOBEDIENCE de Sebastian Lélio

Queer Lisboa Disobedience critica
A comunidade é conforto e opressão, é salvação e perdição.

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Secundária (Rachel McAdams), Ator Secundário (Alessandro Nivola), Argumento Adaptado, Banda-Sonora Original

“A Favorita” não foi a única história de amor lésbico protagonizada por Rachel Weisz a fazer parte da lista de títulos elegíveis aos Óscares deste ano. “Disobedience”, o primeiro filme anglófono do cineasta chileno Sebastián Lelio, conta a história de Ronit, uma fotógrafa que, aquando da morte do pai, regressa à comunidade judaica ortodoxa que a rejeitou no passado pela sua homossexualidade. Esse regresso é marcado pelo reencontro com seus amigos de juventude, incluindo a sua antiga amante Esti, agora uma professora casada.

Esta é uma comovente e subtil meditação sobre conceitos de lar, amizade e amor que tem a coragem de assumir que certas relações familiares e comunitárias são irreparáveis e a fuga é muitas vezes a opção mais brava e saudável. Tudo isto é formulado por um guião cheio de nuance psicológica e ancorado por um trio de desempenhos estonteantes. Weisz é uma tempestade de micro expressões e gestos reticentes que contam anos de história pessoal nunca verbalizada em diálogo. No papel de Esti, Rachel McAdams é um poço de claridade emocional tão mais poderosa e dolorosa pelo contexto opressivo em que se manifesta. Por fim, Alessandro Nivola, como o marido de Esti e antigo amigo de Ronit, tem de lidar com arco narrativo mais complicado do filme e executa-o com admirável subtileza e coerência psicológica.

Até a banda-sonora estranhamente ostentosa merecia atenção das associações que dão prémios, mas nenhuma dessa glória se manifestou. O mais triste é que, pela sua especificidade cultural e temática queer, “Disobedience” teve pouca projeção internacional. Umas quantas nomeações provavelmente teriam ajudado o filme a ter distribuição comercial em muitos mais países, incluindo Portugal. Por cá, esta obra só passou no Queer Lisboa e foi um dos melhores filmes em exibição no festival.




A EDUCADORA DE INFÂNCIA de Sara Colangelo

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Desespero personificado.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Atriz Principal (Maggie Gyllenhaal), Argumento Adaptado

O mundo em que vivemos está à beira de destruição e na sociedade atual, nada parece ter significado. Tais considerações híper fatalistas sobre a contemporaneidade são algo cada vez mais comum no panorama do cinema. Em 2018, por exemplo, “No Coração da Escuridão” refletiu isso mesmo com sua história de um padre calvinista levado às antípodas do desespero existencial quando confrontado com a catástrofe ambiental proto apocalíptica para a qual a Humanidade caminha a passos largos. Esse filme teve a sorte de receber uma muito merecida nomeação para o Óscar de Melhor Argumento Original, mas houve outras obras, igualmente valiosas, que exploraram temas semelhantes e personagens em equivalentes estados psicológicos, mas não cativaram as associações de prémios de cinema.

Entre essas obras, damos destaque a “A Educadora de Infância”, um remake americano do original israelita sobre uma mulher com aspirações artísticas que encontra, entre seus alunos, um prodígio poético ainda na meninice e decide tentar motivá-lo e divulgar seu génio. Boas intenções rapidamente se precipitam na obsessão patológica e gradualmente entendemos como, para esta pedagoga, a doçura de um poema infantil é possivelmente a única luz visível por entre a escuridão desesperante de um universo sem valor e sem beleza.

Maggie Gyllenhaal dá vida à personagem titular e, no processo, oferece aos espectadores um dos mais lacerantes retratos de agonia existencial nascido da doença de uma cultura vácua. Observar como a atriz se agarra às palavras de uma criança como se elas fossem uma boia salva-vidas no meio de uma tempestade marítima é testemunhar píncaros de vulnerabilidade humana que são francamente difíceis de ver, mesmo no mundo distante do grande ecrã. Pensar que Gyllenhaal não recebeu um único prémio importante por tal feito, quando foi nomeada para o Óscar por uma das suas piores prestações, em “Crazy Heart”, é confrontar uma das maiores injustiças em toda este universo de prémios de excelência artística.




EIGHTH GRADE de Bo Burnham

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Uma das melhores atrizes do ano.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Atriz Principal (Elsie Fisher), Ator Secundário (Josh Hamilton), Argumento Original

“Hereditário”, “Um Lugar Silencioso” e “Suspiria” podem ter horrorizado muitos espectadores e chocado tantos outros, mas não houve filme mais assustador e visceralmente desconfortável em 2018 que uma modesta comédia dramática sobre uma vlogger de treze anos. “Eighth Grade”, que nunca foi distribuído em Portugal, é a estreia do youtuber e comediante Bo Burnham no mundo da realização de cinema e trata-se de um dos mais impressionantes retratos já feitos do tipo de inferno que é ser jovem no nosso mundo moderno com redes sociais e tudo o mais.

Em parte, o filme é tão extraordinário pela sua precisão psicológica, pela sua especificidade, sinceridade e habilidade em ilustrar uma perspetiva adolescente sem exibir qualquer tipo de distanciamento adulto. Por outras palavras, Bo Burnham parece ter conseguido expor aqui a mentalidade de uma rapariga de treze anos, sem filtros e com total honestidade, por muito doloroso que tal exercício seja. A sua protagonista é tão mais perfeita pela banalidade dos seus dilemas que tanto o argumento, como a realização e os atores encaram com todo o dramatismo e inquietação com que ela mesma as sente. Não há aqui ironia e o filme é tão mais assustador por essa ausência.

No final, queremos chorar pela heroína e suas inseguranças, queremos abraçá-la e dizer que tudo vai ficar melhor e queremos recordá-la da sua importância. Elsie Fisher, a estrela adolescente do filme, é culpada de muitas dessas emoções do espectador, oferecendo aqui um desempenho tão emocionalmente cru como tecnicamente preciso. Só o modo como ela vomita os enormes monólogos que Burnham lhe escreveu, com todas suas afetações, pausas estranhas e trejeitos linguísticos, já seria suficiente para lhe valer uma montanha de prémios. Todo o elenco está ao nível de Fisher, todo o filme partilha o seu génio e, enquanto humildes espectadores, só nos cabe aplaudir e celebrar tais esforços.




EM CHAMAS de Lee Chang-dong

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Nunca nenhum filme coreano foi nomeado para os Óscares.

Devia ter sido considerado para: Melhor Ator (Ah-in Yoo), Atriz Secundária (Jong-seo Jun), Ator Secundário (Steven Yeun), Argumento Adaptado, Filme numa Língua Estrangeira (Coreia do Sul)

Qualquer cinéfilo com moderado gosto por cinema internacional deverá saber que a Coreia do Sul é um país de grande cinema e grandes cineastas. No circuito dos festivais, os maiores autores coreanos dominam e têm vindo a afirmar-se como algumas das vozes mais importantes no panorama atual da sétima arte. Tudo isto começou por volta de 2002, quando a crítica mundial realmente começou a dar valor aos cineastas emergentes desse país. O filme que originou tudo isso foi “Oásis” de Lee Chang-Dong, realizador que este ano assinou um dos filmes mais unanimemente aclamados pela crítica, “Em Chamas”.

Para entenderes de que o filme trata e alguma da sua maravilhosa qualidade, ficam aqui algumas das nossas primeiras impressões do filme, aquando da sua estreia em Cannes:

“Burning”, é um filme emocionante e tenso, sobretudo porque o realizador consegue preencher muito bem e dar volume em belíssimas imagens aos gaps narrativos e mais misteriosos da intrincada história, de três estranhos personagens. Lee começa sua narrativa meses antes dos acontecimentos do conto, isto no dia em que o protagonista Jongsu (Ah-in Yoo), um jovem desempregado, solitário e aspirante a escritor, se depara com uma velha amiga da escola chamada Haemi (Jeon Jong-seo), como se fosse pela primeira vez. Logo no dia seguinte, os dois jovens encontram-se no pequeno estúdio dela e fazem sexo. A sedutora Haemi anuncia que viaja para umas férias no Quénia, pedindo a Jongsu que lhe alimente o gato. Haemi regressa com Ben (Steven Yuen), um tipo misterioso e bem-parecido que conduz um Porsche 911 Carrera e vive num bairro caro, que lhes confessa ter o estranho hobby de atear fogo às estufas de cultivo, cobertas de plástico (no conto é aos celeiros). Jongsu observa Ben com um certo desprezo e uma inveja visível, enquanto este ouve jazz e cozinha macarrão, no seu luxuoso apartamento. O que se segue é um surpreendentemente thriller e um triângulo amoroso excitante, sensual e misterioso, com Jongsu no papel de um pobre diabo castrado e apaixonado pela desaparecida Haemi ou pelo contrário apesar da sua passividade, num cérebro perverso que quer encontrar matéria e argumento para o seu primeiro romance.

Com tudo isto em conta, muitos eram os prognosticadores que supunham que seria “Em Chamas” a vingar e obliterar uma das mais vergonhosas lacunas na História dos Óscares, tornando-se no primeiro filme coreano a ser nomeado para o prémio de Melhor Filme Estrangeiro. Infelizmente, tal não ocorreu, o que só tira aprumo e respeitabilidade à Academia em si. Aliás, justiça seria este filme ter recebido, além de uma indicação na já referida categoria, nomeações para seu elenco e argumento adaptado.




HEREDITÁRIO de Ari Aster

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Nem Satanás tem tanto poder malévolo como a insituição social que é a familia.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Realizador, Atriz Principal (Toni Collette), Ator Secundário (Alex Wolff), Argumento Original, Montagem, Cenografia, Efeitos Visuais, Banda-Sonora Original, Sonoplastia, Efeitos Sonoros

Hereditário” foi o filme sensação do Festival de Sundance do ano passado e com razão. Este pesadelo cinematográfico é uma sintetização monstruosa de um tipo de perda tão poderoso que faz com que a realidade se fragmente diante dos nossos olhos. A primeira longa-metragem de Ari Aster é um demónio vindo dos infernos para nos assombrar, tomando a forma de uma tragédia familiar que gradualmente vai caindo na insanidade do terror.

No centro de tudo isso, Toni Collette dá-nos a performance de uma vida. Quando originalmente escrevemos sobre o filme, tivemos isto a dizer sobre os esforços da atriz:

A concretização de Annie no grande ecrã é muito provavelmente a magnum opus de Toni Collette, sendo esta uma prestação profundamente feia, repelente e primordial na sua visceralidade. Trata-se também de um papel que exige à atriz um controlo diabólico de tom, pois Annie começa o filme já no precipício da insanidade, mas acaba-o numa espiral descontrolada que transcende conceitos básicos de loucura. Até chegar aí, Collette tem de exercitar os seus músculos faciais e cordas vocais numa coleção das mais pavorosas expressões de pânico in extremis, desdobrar-se em monólogos dignos de Bergman e protagonizar cenas sonhadas em que a atriz e seu realizador exploram um tipo de personagem que até no cinema de terror é tabu: uma mãe que não ama o filho, que, na realidade, nunca o quis.

Algumas associações de prémios até reconheceram a grandiosidade do que Collette fez no filme, sendo ela a prestação que mais honras de Melhor Atriz ganhou da crítica atrás de Olivia Colman. Contudo, nem uma nomeação para esse Óscar teria sido suficiente para fazer justiça ao triunfo de “Hereditário”. Desde a sonoplastia até aos jogos de escala dos cenários, todos os aspetos mais técnicos do filme são uma maravilha e, se possível, Alex Wolff, no papel de um adolescente traumatizado, é quase tão espetacular como a atriz que interpreta sua mãe. Só mesmo dois punhados de nomeações que incluíssem Melhor Filme seriam suficientes para prestar devida homenagem a esta glória. Avé Paimon!




OS IRMÃOS SISTERS de Jacques Audiard

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Um western despido de nostalgia cinematográfica.

Devia ter sido considerado para: Melhor Fotografia, Cenografia, Figurinos, Maquilhagem

Os Irmãos Sisters” marca a estreia do celebrado realizador francês Jacques Audiard no mundo do cinema anglófono. É também o seu primeiro western e um dos exemplos mais peculiares desse género nos últimos tempos. Trata-se de uma adaptação de um romance de Patrick DeWitt, sendo que muita da estranheza vem daí, mas mais do que isso, são as personagens e os jogos tonais do filme que surpreendem pela positiva.

Acerca disso mesmo, dissemos na nossa crítica da cobertura do LEFFEST:

Estas não são personagens feitas para o western com seus fatalismos e niilismos do costume. Isto são palhaços atormentados pelos seus crimes, aventureiros dececionados com o mundo e profetas proto socialistas a andar cegos por um mundo traiçoeiro e inóspito. Um mundo belo, tátil e estranho, onde cidades florescem no meio do nada como parques de atrações delapidados, onde São Francisco é a Babilónia banhada pelo Pacífico e onde a violência é como uma infeção que afeta tudo e todos, corroendo a moral e envenenando os corpos de quem a sofre e perpetra. Nada disto é visto com uma perspetiva trágica, mas sim com a gentileza de um poeta melancólico que encontra humor no absurdo da vida, mas não tem ilusões nostálgicas sobre o passado.

Por isso mesmo, é uma pena que os esforços de Audiard enquanto argumentista e realizador não tenham sido reconhecidos fora do circuito dos festivais. Podemos dizer o mesmo dos seus atores, sendo que Joaquin Phoenix, John C. Reilly, Ruz Ahmed e Jake Gyllenhaal oferecem aqui alguns dos melhores trabalhos das carreiras. Pelo menos os César reconheceram algum do virtuosismo técnico do filme. Enfim, ainda tínhamos esperança que os cenários inventivos ou os fabulosos figurinos de Milena Canonero fossem marcar presença algures nos prémios americanos, mas tal não aconteceu.




LEAVE NO TRACE de Debra Granik

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Pai e filha em conflito de interesses.

Devia ter sido considerado para: Melhor Realização, Atriz Principal (Thomasin McKenzie), Ator Principal (Ben Foster), Argumento Adaptado

Em 2010, Debra Granik arrebatou as audiências do Festival de Sundance com “Despojos de Inverno”, um pequeno drama americano que, meses mais tarde, viria a afirmar-se como um dos filmes mais aclamados do ano, sendo nomeado para quatro Óscares. Entre essas nomeações, estava a primeira indicação de Jennifer Lawrence ao prémio de Melhor Atriz, sendo esse o projeto que realmente deu a conhecer a atriz ao mundo e abriu o caminho ao estrelato. Apesar de tal sucesso, para a realizadora de “Despojos de Inverno” o futuro não foi tão risonho como o da sua atriz principal.

Oito anos depois dessa obra auspiciosa, Granik finalmente voltou a estrear uma longa-metragem narrativa e mais uma vez arrebatou as audiências do Festival de Sundance. Desta vez, o filme “Leave No Trace”, o retrato de uma dupla de pai e filha que vivem às margens da sociedade, no meio da natureza, rejeitando instituições e o contacto com qualquer outro humano. Para o patriarca traumatizado pela sua experiência militar, tal existência é uma necessidade inquestionável, mas o mesmo não é verdade para a menina de treze anos que ele arrasta consigo neste estilo de vida isolado de tudo e todos. Ao longo do filme, a intervenção de algumas forças exteriores ao duo familial acaba por levar a jovem rapariga a questionar as ações do pai e o modo como elas a vão afetar a longo prazo. Ou seja, desde os primeiros instantes, sabemos que esta é uma situação insustentável e que pai e filha vão acabar por se separar, mas Granik e sua equipa muito fazem para delinear toda dor e autodescoberta requerida para que as suas personagens aceitem o inevitável.

Como um estudo de comportamento humano, trauma e as dores do crescimento inerentes à história de uma jovem aprender a questionar as escolhas do seu patriarca, “Leave No Trace” é um triunfo ainda maior que as outras obras de Granik. Seu argumento e magistral direção de atores são de particular perfeição e mereciam muito mais atenção na temporada dos prémios do que acabaram por receber. Os protagonistas também são extraordinários. Ben Foster raramente foi tão subtil e comedido na sua exteriorização de mágoas interiores e Thomasin McKenzie é um espanto, especialmente no que diz respeito à sua capacidade para ilustrar todas as emoções contraditórias que a sua personagem sente quando do clímax da história.




MISSÃO IMPOSSÍVEL: FALLOUT de Christopher McQuarrie

Missão: Impossível - Fallout
Um estrondoso épico de ação, efeitos visuais e bombástica sonoridade.

Devia ter sido considerado para: Melhor Montagem, Efeitos Visuais, Sonoplastia, Efeitos Sonoros

Para muitos franchises, aclamação crítica e comercial é sinónima de reconhecimento da indústria cinematográfica na forma de estatuetas reluzentes. “Missão Impossível” não é um desses franchises apesar de andar a desfrutar uma onda de reconhecimento artístico crescente com cada novo filme. Aliás, “Fallout” que estreou em 2018, tem melhores críticas que muitos dos filmes mais nomeados para os Óscares este ano, incluindo alguns dos candidatos ao maior galardão de todos.

Enfim, não queremos com isto afirmar que seria justo ou mesmo possível ver o filme de Christopher McQuarrie nomeado para Melhor Filme ou Realizador. Contudo, a sua completa ausência das categorias apelidadas de “técnicas”, é algo profundamente absurdo. É certo que se trata de um filme de ação mais comprido do que o normal, mas, em termos de sequências individuais, trata-se de um dos trabalhos de montagem mais bombásticos do ano. Somente a insana perseguição pelas ruas de Paris seria suficiente para garantir uma nomeação se os Óscares não tivessem uma alergia a filmes de ação e outras obras de géneros despidos de prestígio e pressuposta seriedade.

Montagem é só uma das categorias em que o filme poderia e deveria ter tido algum reconhecimento. Também temos o trabalho de som, com suas incríveis tempestades de ruídos sobrepostos que conseguem ilustrar o caos do momento sem serem confusas. Mais estrondoso ainda é o trabalho de efeitos visuais que, ao contrário de muitos outros filmes, coloca a ênfase em efeitos práticos e materiais ao invés de ilusionismo digital.




NUNCA ESTIVESTE AQUI de Lynne Ramsay

joaquin phoenix top 10
O ator anula-se a si mesmo e à sua personagem em nome de uma proposta cinemática pouco ortodoxa.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Realização, Ator Principal (Joaquin Phoenix), Montagem, Fotografia, Banda-Sonora Original, Sonoplastia

Desde sua estrondosa banda-sonora até ao trabalho assombroso de Joaquin Phoenix, passando pela melhor montagem que se viu recentemente em cinemas portugueses, “Nunca Estiveste Aqui” de Lynne Ramsay foi um dos melhores filmes do ano passado, senão o melhor. Face ao seu formalismo violento e tonalidades líricas, é entendível que tenha sido ignorado na temporada dos prémios, mas não deixamos por isso de chorar seu triste fado.

Para melhor expressar nossos sentimentos de devoção, paixão e adoração para com esta obra, o trabalho da realizadora e do ator no seu centro, deixamos aqui as palavras que outrora publicámos sobre “Nunca Estiveste Aqui” no contexto de um top 10 das melhores interpretações de Joaquin Phoenix:

(…) Em “Nunca Estiveste Aqui”(…) o ator não cria uma personagem bem definida, parecendo mesmo estar a trabalhar com o intuito inverso. Ele esbate de tal modo a caracterização que esta desaparece e a sua figura se transmuta num vácuo de significado, um veículo pela qual Lynne Ramsay consegue orquestrar a sua facada sensorial na psique da audiência.

A auto-anulação diante das câmaras é algo tão ou mais difícil que a construção de uma personagem credível. Apesar das informações que o filme nos dá sobre a figura de Joe, um veterano de guerra traumatizado que agora trabalha como uma espécie de assassino contratado, ao longo do desenrolar da narrativa ele assume-se mais como uma presença física que psicológica. Essa faceta interior não marca presença na prestação de Phoenix, mas é, na verdade, integrada no formalismo extremo com que Ramsay construiu o seu drama hiperviolento. O resultado de tudo isto é a criação de um filme que dá a ideia de ser protagonizado por um espectro vivo, uma ideia mal lembrada de um homem que morreu no campo de batalha, mas cujo corpo robusto ainda serve como arma para quem o contrata ou como salvação para quem ele decide resguardar dos males do mundo.

(…) Fazendo uma analogia literária, é como se a maioria dos atores e cineastas construísse as figuras humanas dos seus filmes como os protagonistas de longos trabalhos de prosa épica e concreta. Phoenix e Ramsay, pelo contrário, edificam uma proposta cinematográfica onde o ser humano no seu centro está mais próximo do sujeito abstrato de um poema sobre o modo como todo o mundo e seus horrores estão contidos na imagem de um feijão doce a ser esmagado entre os dedos de um homem cansado da vida.




O ÓDIO QUE SEMEIAS de George Tillman Jr.

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O ativismo para mudar o mundo começa com os jovens.

Devia ter sido considerado para: Melhor Ator Secundário (Russell Hornsby), Argumento Adaptado, Canção Original (“We Won’t Move”)

Supor que literatura juvenil somente representa a materialização de interesses comerciais sem grande mérito artístico ou relevância política é cair no erro da condescendência cultural. “O Ódio Que Semeias”, escrito por Angie Thomas, é o perfeito exemplo disso mesmo, lidando com questões de violência policial e de injustiça racial endémica às instituições e estruturas sociais mais fundamentais da sociedade americana. Por seu lado, a adaptação cinematográfica do livro, revela como cinema socialmente relevante não tem de ser necessariamente uma obra de prestígio para uma audiência exclusivamente adulta. Há valor e importância em explorar tais questões de uma perspetiva juvenil e para espetadores dessa mesma faixa etária.

Seguindo essa mesma lógica, “O Ódio Que Semeias” centra-se nas experiências de uma jovem adolescente afro-americana que, apesar de viver num bairro empobrecido marcado pela presença criminal, frequenta um colégio privado cujos alunos são quase todos caucasianos. Devido a essa dinâmica, ela passa a vida a vestir e despir códigos sociais e culturais e aceita essa realidade com uma passividade que ela mesma assume como pragmatismo. Assim é até à noite em que um antigo amigo de infância é morto pela polícia em frente aos seus olhos. Seu crime foi unicamente a cor da pele, sendo que a suposta arma que motivou os tiros do polícia não passou de uma escova que o jovem passava pelo cabelo no seu último instante de vida. Tal evento vira do avesso a vida da protagonista e leva-a a questionar a ordem do mundo que habita e sua inação face às injustiças que todos os dias ela sente.

Muito mérito há que ser dado aos produtores, realizador e argumentista do filme, que traduzem o livro para linguagem cinematográfica mainstream sem sacrificar em demasia a complexidade política do texto. Contudo, a grande maravilha deste projeto é o seu elenco que aqui mostra tudo o que vale, mesmo os atores em papéis mais pequenos. Entre todas as admiráveis performances, Russell Hornsby merece particular destaque como o pai da heroína juvenil, cujo passado conturbado muito influencia o modo como ele lida com os horrores que se abatem sobre a vida da filha e da comunidade.




PADDINGTON 2 de Paul King

paddington 2 melhores guarda-roupas
Uma esplendorosa sobremesa cinematográfica.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Ator Secundário (Hugh Grant), Argumento Adaptado, Cenografia, Figurinos, Maquilhagem, Efeitos Visuais

Paddington 2” estreou em 2017 nos cinemas portugueses, mas só chegou aos EUA em 2018, daí estar na lista de filmes elegíveis para os Óscares de 2018/19. Infelizmente, chegada a altura de se votar nos prémios, já a indústria se tinha esquecido do mais delicioso e inocente filme do ano. O facto de que sinceridade emocional, otimismo e joie de vivre infantil estão fora de modo certamente também não ajudaram o filme, é claro.

Mesmo assim, temos de celebrar esta joia cinematográfica, que tanto diverte como comove. Sobre o requinte formal do filme, dissemos o seguinte na nossa crítica:

(…) o realizador Paul King e a maior parte da equipa do primeiro filme executam a premissa infantil do filme com doses titânicas de virtuosismo, que é especialmente valioso pela modéstia com que se manifesta na forma final de “Paddington 2”. O cenógrafo Gary Williamson e o diretor de fotografia Erik Wilson, por exemplo, conjuram aqui uma versão fantasiosa de Londres que é suficientemente estilizada para sugerir a realidade de um conto-de-fadas contemporâneo, mas realista o suficiente para não ser alienante ou completamente díspar da metrópole inglesa. Quando o filme chega à prisão é quando este jogo se torna mais evidente, com o edifício vitoriano a ganhar a divertida aparência de um diorama vagamente reminiscente do universo Wes Anderson, povoado por criminosos vestidos com macacões cor-de-rosa. As fardas rosadas, há que dizer, são apenas uma das muitas delícias no guarda-roupa desenhado por Lindy Hemming, uma coleção de figurinos que tanto sugerem o século XXI como uma certa intemporalidade que apenas existe na ficção, sendo que os seus trajes para o vilão são a cereja no topo do bolo.

Pelo menos, no ano passado, os BAFTAs recordaram-se da excelência destas aventuras do urso mais adorável do Peru. Não só foi “Paddington 2” nomeado para Melhor Argumento Adaptado e Filme Britânico, como Hugh Grant recebeu uma merecedora indicação para o prémio de Melhor Ator Secundário pela sua estrambólica performance como um vilanesco ator tornado mestre criminoso. Oxalá os Óscares tivessem mostrado a mesma inteligência que os seus primos ingleses no que diz respeito a este filme.




PRIVATE LIFE de Tamara Jenkins

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Um filme cheio de estrondosos desempenhos.

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Principal (Kathryn Hahn), Ator Principal (Paul Giamatti), Argumento Original

Tamara Jenkins é uma das cineastas mais frustrantemente pouco produtivas do panorama do cinema independente americano. “Private Life” é somente a sua terceira longa-metragem num período de vinte anos e, como suas obras anteriores, trata-se de uma preciosidade em cinema observacional, um drama de extrema modéstia e realismo, cheio de detalhes idiossincráticos e dolorosas verdades humanas. Infelizmente, ao contrário de “Os Savages” que conquistou duas nomeações para os Óscares, “Private Life” não conseguiu cativar os membros da Academia de Hollywood.

Sem alguma vez fazer qualquer tipo de julgamento moral, o filme retrata os dilemas de um casal nova-iorquino na casa dos 40 que, nos últimos anos, tem dedicado todo o seu esforço, tempo, atenção e posses monetárias ao sonho de serem pais. Desde tratamentos de fertilidade que nunca parecem resultar a esquemas de adoção que regularmente acabam com corações partidos, o mundo destes dois é definido pela sua total devoção a algo que pode bem ser inalcançável. O problema é que nenhum deles quer admitir essa possibilidade, pois fazê-lo envolveria olhar para como os desafios propostos por essa aspiração têm ofuscado todos os outros problemas do casal, deixando-os fermentar nas sombras e enraizar-se na sua dinâmica conjunta.

O argumento de Jenkins é uma maravilha estonteante, especialmente no que diz respeito ao modo como maneja o tom, gradualmente transfigurando uma comédia satírica em tragédia matrimonial. Melhor ainda é o elenco, com destaque para Kathryn Hahn e Paul Giamatti nos papéis principais. Hahn, em particular, oferece um desempenho miraculoso, que tanto cristaliza as frustrações de uma mulher que quer ser mãe como o fardo da constante humilhação e derrota que cada tratamento falhado ou adoção fracassada representam.




SUPPORT THE GIRLS de Andrew Bujalski

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Haley Lu Richardson e Regina Hall no seu melhor.

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Principal (Regina Hall), Atriz Secundária (Haley Lu Richardson)

Apesar de ter pouca projeção internacional, Andrew Bujalski é um dos realizadores mais promissores do panorama independente americano. A sua habilidade em direção de atores é particularmente impressionante e muitos membros dos seus elencos podem creditar as performances nos filmes de Bujalski como o melhor trabalho das suas carreiras. “Support the Girls” é mais uma triunfal montra de grandes prestações.

O filme, que nunca estreou em Portugal, dedica a maior parte dos seus 93 minutos a retratar um dia entre as trabalhadoras de um restaurante-bar ao estilo de Hooters, onde empregadas de mesa com decotes pronunciados e calções indecentes fazem a delícia da clientela maioritariamente masculina. O foco desta exploração de uma mini comunidade é a manager do estabelecimento, cuja exaustão parece quase sugerir uma depressão e cujo dia vai de mal a pior ao longo da narrativa.

Como dissemos antes, a grande mais-valia do filme é o trabalho do seu elenco e foi mesmo a prestação da sua atriz principal o elemento que ainda recebeu algum reconhecimento por grupos de críticos americanos. De facto, Regina Hall é perfeita, ilustrando o cansaço da personagem com naturalismo subtil e suficiente carisma para ancorar todo o filme nas suas expressões faciais forçosamente joviais e falsamente confiantes. É raro ver um trabalho tão maravilhosamente modesto ser nomeado para o Óscar, mas teria sido uma justa consagração de uma das grandes atrizes americanas da sua geração. Também o elenco secundário é fenomenal, com especial destaque para Haley Lu Richardson, como uma empregada perpetuamente efusiva cuja atitude risonha nunca parece inorgânica ou uma fachada.




SUSPIRIA de Luca Guadagnino

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Avé Mater Suspiriorum!

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Realização, Argumento Adaptado, Montagem, Fotografia, Cenografia, Figurinos, Maquilhagem, Efeitos Visuais, Banda-Sonora Original, Canção Original (“Suspirium”), Efeitos Sonoros

Suspiria” é um remake que vem revolucionar o significado desse mesmo conceito. Longe de refazer o filme original de Dario Argento, o inigualável Luca Guadagnino decidiu apresentar uma variação sobre temas e mecanismos semelhantes, usando uma estética e amplitude narrativas completamente distintas. O que nasceu desses esforços foi um dos mais extraordinários feitos cinematográficos do ano.

Como dissemos na nossa crítica, publicada aquando da passagem do filme pelo LEFFEST:

Este “Suspiria” dado à luz no annus horribilis de 2018 é um filme que confunde, que provoca e que choca. Este é um filme que, numa orgia de sangue, encontra espaço para melancolia e vê lugar para brutalidade num gesto de misericórdia. Este é um filme em que a Morte e uma matriarca menonista são a mesma pessoa, onde Tilda Swinton interpreta três papéis e até tem direito a um pénis falso, em que Luca Guadagnino perde a cabeça e contorce-se no chão a meio de um orgasmo cinematográfico. Ver o filme é dançar com um parceiro relutante que a cada gesto troca o passo e a coreografia. Quando pensamos que já entrámos no seu ritmo, um movimento repentino deixa-nos de novo perdidos enquanto ele se regozija no triunfo de nos ter escapado, uma e outra vez. Em seis atos e um epílogo, este “Suspiria” será para muitos um exercício em frustração e indecifrável pretensiosismo, mas ninguém o pode acusar de ser previsível ou pouco ambicioso.

Tais palavras permanecem verdadeiras, apesar do seu teor hiperbólico, tal é a magnitude deste feito de puro cinema sem barreiras, sem limites e sem medo. Já na lista dos melhores filmes do ano passado, a equipa MHD encontrou lugar para destacar “Suspiria” e o mesmo voltou a acontecer com nossos tops de figurinos e bandas-sonoras. É um crime que desacredita a Academia de Hollywood que “Suspiria” termine esta temporada de prémios sem uma mísera indicação ao Óscar de Melhor Maquilhagem que, num mundo justo, o filme de Guadagnino teria ganho sem qualquer competição.

Enfim, depois de mencionar o feito do realizador, do argumento que reinventou o clássico, do guarda-roupa e da música, temos ainda de destacar uns quantos elementos merecedores de galardões. Eles são a fotografia outonal, os cenários audaciosos com suas linhas modernistas e ocasionais explosões de bizarria como paredes forradas a cabelo, o trabalho de som com seus ossos quebrantes e órgãos rasgados e a montagem que conseguiu tornar um dos mais hediondos atos de mutilação corporal que o cinema já viu numa orgia de beleza rítmica sem igual.




TULLY de Jason Reitman

tully critica
Charlize Theron é estupenda a retratar uma mulher nos extremos da exaustão física e mental.

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Principal (Charlize Theron), Argumento Original

Jason Reitman estreou dois filmes em 2018 que, a uma primeira análise, poderiam facilmente entrado a valer na temporada dos prémios. Um deles, “The Frontrunner”, contudo, foi um fracasso crítico, pelo que a sua falta de presença entre os prémios é justificável. Contudo, “Tully” foi um triunfo crítico, o que não o impediu de acabar a temporada dos prémios com uma mísera nomeação para o Globo de Ouro de Melhor Atriz como sua máxima consagração.

Entenda-se que esta comédia dramática escrita por Diablo Cody é um dos grandes filmes sobre maternidade já feitos. Trata-se de uma exploração da psique de Marlo, uma mãe que não só tem de lidar com as dificuldades de um filho com necessidades educativas especiais como também enfrenta as provações de um novo recém-nascido e todos os transtornos fisiológicos que necessariamente acompanham o nascimento. No meio disto tudo, aparece uma jovem misteriosa, chamada Tuly, pronta a ajudar a nova mãe ao mesmo tempo que a leva a confrontar os muitos sonhos perdidos de uma juventude já meio esquecida.

Charlize Theron é estupenda no papel principal, dando vida a todas as angústias de Tully com tanto fulgor dramático como realismo visceral. O modo como a atriz telegrafa os epítetos de cansaço que estilhaçam a mente e corpo desta mãe stressada é de particular destaque. Não é mentira nenhuma dizer que Theron é melhor neste filme que, pelo menos, três das nomeadas para o Óscar de Melhor Atriz e, não fosse uma reviravolta final meio improvável, poderíamos dizer o mesmo do argumento.




UM PEQUENO FAVOR de Paul Feig

Um Pequeno Favor critica
Dois monstros amorais tão repugnantes quanto irresistíveis.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Atriz Principal (Anna Kendrick), Atriz Secundária (Blake Lively), Argumento Adaptado, Figurinos

Um Pequeno Favor” foi uma das melhores surpresas do ano. Apesar da presença de Paul Feig na cadeira de realizador, a maior parte dos cinéfilos julgava que esta adaptação de um livro de Darcey Bell seria mais uma tentativa falhada de recriar o fenómeno de “Em Parte Incerta”. Felizmente para todos, o que Feig e companhia tinham planeado era algo muito diferente, uma espécie de versão irónica de todo um subgénero de entretenimento sobre mulheres psicopatas e seus esquemas criminosos.

Os resultados são extraordinários e hilariantes, especialmente no que diz respeito ao trabalho das duas atrizes principais. Sobre Anna Kendrick e Blake Lively, escrevemos o seguinte na nossa crítica do filme:

No papel mais carnudo e abertamente psicótico, Lively dá vida às contradições de Emily com estonteante facilidade, fazendo das suas micro agressões sociais pequenas facadas que servem de prelúdio à jubilante monstruosidade que ela deixa a descoberto durante o clímax. Mais do que tudo, Lively parece estar a divertir-se com a absurdez da história e isso dá-nos permissão para encontrar prazer na parvoíce do enredo. Por fim, Kendrick dá a prestação da sua vida, fazendo de Stephanie alguém cuja atitude risonha é legitimamente assustadora, mesmo quando ela está somente a ensinar como se fazem velas decorativas no seu vlog. No fundo, as personagens fazem do filme uma história de pessoas horríveis e glamourosas que decidem destruir a vida umas das outras enquanto tentam forçar o próprio tecido da realidade a subjugar-se aos seus caprichos. O que poderia ser melhor?

De facto, é difícil imaginar algo melhor. Só mesmo os figurinos e o argumento conseguem superar a maravilha venenosa dessas duas atrizes. O guarda-roupa, em particular, merecia muito mais reconhecimento por parte da indústria. Nem o sindicato dos figurinistas reconheceu a qualidade deste trabalho super moderno e super inteligente, cheio de detalhes requintados e um sentido de humor e drama capazes de tornar um vestido floral com saia rodada e folhos cor-de-rosa no melhor uniforme para o Mal personificado.




UMA GUERRA PESSOAL de Matthew Heinemen

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Rosamund Pike assume-se como uma atriz camaleónica.

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Principal (Rosamund Pike), Maquilhagem, Canção Original (“Requiem for A Private War”)

Depois de anos a ser uma das mais notáveis atrizes secundárias do cinema britânico, Rosamund Pike finalmente ganhou projeção internacional e um lugar de destaque no ecossistema de Hollywood quando David Fincher a escolheu para interpretar o papel principal de “Em Parte Incerta”. Esse thriller tornou-se um fenómeno cultural e Pike arrecadou uma muito merecida nomeação para o Óscar, pressagiando uma nova e muito áurea fase da sua carreira. Infelizmente, tais desenvolvimentos profissionais não se manifestaram e tivemos de esperar até 2018 para finalmente voltar a ver Pike fincar os dentes num papel do seu calibre.

O filme em questão é “Uma Guerra Privada” e o papel é Marie Colvin, célebre correspondente de guerra que morreu na cidade de Homs, na Síria, em 2012. Trata-se da estreia do realizador Matthew Heinemen no panorama do cinema narrativo depois de anos a fazer documentários de sucesso. A influência de cinema jornalístico certamente marca presença na conceção formal desta cinebiografia, resultando numa experiência de imersão estética no caos da guerra experienciado, em primeira mão, por uma mulher coberta pelas cicatrizes físicas e emocionais do trauma.

Pike serve de âncora a toda esta experiência que privilegia a natureza sensorial dos eventos vividos por Colvin em detrimento de uma análise psicológica mais detalhada. Cabe à atriz fazer essa análise e assim complementar o jogo do seu realizador, algo que Pike executa com empenho e o virtuosismo de uma mestra da sua arte. Ela metamorfoseia-se em Colvin, adotando suas cadências vocais de tal forma que o que poderia ser grotesco se torna em algo natural, orgânico, uma parte essencial desta figura amargurada que tanto vive atormentada pelos efeitos do estado de guerra, ao mesmo tempo que sente uma atração contraditória por esses mesmos infernos. Pelo fim da narrativa, ela é uma mulher estilhaçada, apenas apoiada nos seus valores jornalísticos e Pike tudo isso demonstra sem sinais de esforço. É certo que ela recebeu uma nomeação para o Globo de Ouro, mas merecia muito, muito mais.




VIÚVAS de Steve McQueen

viuvas critica
Uma narrativa de blockbuster filmada com o rigor artístico de uma proposta de festival.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Realização, Atriz Principal (Viola Davis), Atriz Secundária (Elizabeth Debicki), Ator Secundário (Daniel Kaluuya), Argumento Adaptado, Montagem, Fotografia, Canção Original (“The Big Unknown”), Sonoplastia, Efeitos Sonoros

Depois do sucesso que “12 Anos Escravo” teve no que diz respeito aos Óscares, seria de esperar que o novo filme de Steve McQueen tivesse marcado maior presença na temporada de prémios deste ano. Surpreendentemente, “Viúvas” acabou por ser quase totalmente ignorado, não obstante a sua estrondosa qualidade. Desde o primeiro minuto que o filme se anuncia como uma montra de formalismo puro e duro em nome de uma visão negra do mundo em que vivemos, um mundo de injustiças sociais, de racismo e classismo, corrupção política, onde o crime compensa e mulheres são cronicamente subvalorizadas e subestimadas.

Acerca da sequência de perseguição policial inicial que nos mostra logo o tipo de filme que “Viúvas” é, dissemos, na nossa crítica:

Esta é uma maneira elétrica de dar início a esta adaptação de uma minissérie britânica dos anos 80, agora transposta para os EUA dos nossos dias. McQueen não poupa o espectador e imerge-o imediatamente num mundo de violência imperdoável e dor agonizante. Não há aqui a tensão de um divertimento passageiro nem, por agora, a catarse que dá lugar a suspiros e entretenimento. “Viúvas” não deixa ninguém respirar descansado ou tirar prazer gratuito das suas atrocidades, precipitando imediatamente a sua narrativa para o luto e para as teias de corrupção de uma cidade podre de ganância e amoralidade. Só pausa quando contempla os efeitos deste universo inglório nos seres humanos que têm o infortúnio de o habitar.

Apesar de tudo isto, o filme foi ignorado. A única exceção de relevo foi a nomeação para Melhor Atriz que Viola Davis recebeu nos BAFTAs. Oxalá a Academia de Hollywood tivesse seguido o exemplo. Ainda mais merecedora de aclamação é talvez Elizabeth Debicki, que, num papel secundário, trouxe humor e carisma magnético ao filme e foi capaz de ofuscar todo um elenco cheio de estrelas e atores de peso a mostrar tudo o que valem.




VOX LUX de Brady Corbet

leffest vox lux critica
Prestem devoção a Celeste.

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Secundária (Natalie Portman), Canção Original (“Wrapped Up”)

Aquando do LEFFEST ’18 escrevemos isto sobre a prestação de Natalie Portman em “Vox Lux”:

(…) Se esta prestação fosse uma pintura, seria uma experiência de arte povera feita de pinceladas grossas em tintas fluorescentes e abençoada por Warhol. Não há aqui grande contenção e o sotaque de Staten Island é tão exagerado como a fisicalidade da personagem(…) Esta diva que tanto coloca a máscara de estrela como de mãe devota e vítima quando a situação se propõe, ela que fez da sua intimidade mais um produto a vender a fãs enfeitiçados. Note-se, por exemplo, como Portman comanda uma conferência de imprensa com a rebeldia estudada de uma artista da controvérsia, mas, repentinamente, deixa-nos ver como a estrela pop se apercebe que uma das improvisações escandalosas foi um passo em falso. A maleabilidade expressiva de Portman fecha-se num instante introspetivo e é como se estivéssemos a ver os mecanismos performativos de Celeste a calibrarem.

Mantemo-nos fiéis a tal admiração pela pirotecnia performativa da atriz e estamos de luto pela sua completa ausência na Awards Season. Por um lado, entendemos tal fado, sendo “Vox Lux” um trabalho de alienante pretensiosismo e ambições concetuais. Contudo, Portman é uma atriz com um Óscar e duas outras nomeações no currículo, o que lhe deveria ter garantido alguma atenção.

Enfim, se não fosse Portman a trazer prémios ao filme, ao menos as suas canções deveriam ter tido esse efeito, especialmente se considerarmos que foram escritas por Sia e o papel central que têm na narrativa. Certamente nomearíamos o deliberado desastre lírico de “Wrapped Up” ao invés de alguns dos esforços indicados na categoria de Melhor Canção Original da Academia.




WE THE ANIMALS de Jeremiah Zagar

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Uma joia de cinema queer.

Devia ter sido considerado para: Melhor Filme, Realização, Ator Secundário (Raúl Castillo), Argumento Adaptado, Fotografia

Essa complicada fase da vida em que uma criança se torna em jovem adulto nunca é nada menos que dolorosa. Quando se trata de um indivíduo queer, cujos desejos e identidade pessoal não correspondem à norma social, a confusão e o horror de tal processo apenas se intensifica. “We the Animals”, adaptado do romance de Justin Torres, retrata com lacerante especificidade as angústias de um menino de origem hispânica, com pais que passam a vida a discutir e dois irmãos chegados, que gradualmente começa a experienciar impulsos sexuais para com pessoas do mesmo sexo.

Muito do filme vive do que não é dito, sendo que toda a sua tensão existe entre as falas, nos silêncios carregados de significado, olhares inseguros e toques reticentes que têm a intensidade de ferros quentes sobre carne humana. O realizador Jeremiah Zagar sabe dar espaço à audiência para assimilar a complexidade não verbalizada de cada cena, mas também é um mestre na exteriorização formalista da psique do seu protagonista juvenil. A fotografia, por exemplo, é uma maravilha de cortar a respiração, sugerindo tanto a materialidade do realismo doméstico como a indefinição impressionista de uma memória.

“We the Animals” não é só uma boa história manejada com delicadeza por um realizador com olho para grandiosas imagens. O filme é também um dos mais potentes documentos de como pais influenciam seus filhos e os podem oprimir com o seu amor sombreado de ignorância. Raúl Castillo, como um patriarca volátil, que pode ser tão ameaçador como bonacheirão, é masculinidade tóxica personificada de modo subtil e inquietantemente sensual. O esquecimento que se abateu sobre o ator e seu filme é uma incomensurável injustiça desta temporada de prémios.




WILDLIFE de Paul Dano

oscares 2019 wildlife
Carey Mulligan e Jake Gyllenhaal mereciam ter sido considerados para os Óscares.

Devia ter sido considerado para: Melhor Atriz Principal (Carey Mulligan), Ator Secundário (Jake Gyllenhaal), Argumento Adaptado

O que é uma família senão um grupo de pessoas que todos os dias negoceia a sua capacidade para se destruírem umas às outras? Para muitos cineastas, como Mike Leigh ou Ingmar Bergman, tal visão fatalista da unidade familiar parece ser uma verdade indisputável e um tema eternamente relevante para dissecação dramática. Paul Dano, famoso pelo seu trabalho enquanto ator, junta-se a esse grupo com a sua estreia na cadeira de realizador, “Wildlife”, uma ferida aberta de dor matrimonial e incompreensão juvenil sintetizadas na forma de um objeto cinematográfico.

O filme, adaptado de um romance de Richard Ford por Dano e sua namorada Zoe Kazan, conta a história de um adolescente nos anos 60, cujos pais se separam depois do patriarca ir trabalhar como um bombeiro voluntário, deixando sua esposa e filho na penúria. Jake Gyllenhaal e Carey Mulligan dão vida ao volátil casal no centro do drama doméstico e ambos estão no píncaro dos seus talentos. O ator raramente balançou de forma tão magistral o seu carisma de estrela com as facetas mais abrasivas de uma personagem definida pelas suas falhas enquanto esposo e enquanto pai.

Mulligan, por seu lado, é uma explosão de ressentimentos e oportunismo pragmático num dos papéis mais complexos da sua carreira. Esta mãe desesperada pode ter sempre motivações clarividentes, mas as suas ações raramente são moralmente desculpáveis, o que leva a atriz a ter de constantemente negociar e calibrar os parâmetros de simpatia entre o espectador e a figura no ecrã. Parte do génio de Mulligan manifesta-se ainda na sua capacidade enquanto parceira de cena, conseguindo motivar seus colegas a elevarem duas prestações quando têm de contracenar com a matriarca enfurecida. O jovem Ed Oxenbould, em particular, ganha muito quando partilha as cenas com a atriz que faz de sua peculiar mãe.

 

Concordas com estas escolhas? Que outros filmes, na tua opinião, mereciam ter sido reconhecidos pela Academia e em que categorias? Por favor, deixa as tuas respostas nos comentários.

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One thought on “Óscares 2019 | Os filmes injustamente esquecidos pela Academia

  • Não teria dito melhor… Apenas acrescento que Dakota Johnson e Tilda Swinton tb deveriam ser consideradas pelas suas representações, trabalharam muito para o respectivos papéis e foi um trabalho notável. Cada vez mais a Academia desilude com as suas escolhas.

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