Ranking ALIEN | 6. Covenant e a crueldade intolerável
Depois de “Prometheus,” Ridley Scott e Michael Fassbender regressaram em “Alien: Covenant,” um filme particularmente cruel na História do franchise.
Neste Artigo:
Em último lugar ficou “AVP2: Aliens vs. Predador.”
“Alien: Romulus” veio a seguir, em oitavo lugar.
Por seu lado, “Alien vs. Predador” está na sétima posição.
A saga “Alien” nasceu na senda do slasher, quando o subgénero do terror ganhava forma e popularidade, à beira de explodir na década de 80. Esse modelo manteve-se, mesmo quando as sequelas se transfiguravam em cinema de ação ou grotescos com ar gálico. Por isso mesmo, as histórias de xenomorphs e suas vítimas humanas sempre se enquadraram numa arte de crueldade, cheia de cadáveres e violência erógena. No entanto, sempre houve alguma contenção, um calor Humanista que contrariava a misantropia generalizada. Essa vertente não se regista em “Alien: Covenant,” que faz sequela a “Prometheus” e de prequela ao original de 1979 – todos realizados por Ridley Scott.
Tal como na transição do segundo filme para o terceiro, personagens amadas que conseguiram sobreviver ao flagelo do capítulo anterior são dizimadas fora de cena. Não há nenhuma sentimentalidade ou sequer respeito pela perda, despachando-se a tragédia como se nada fosse. Mas a fita não abre com essa perda. Pelo contrário, “Covenant” convida-nos a entrar na sua história com uma pintura assombrosa sobre a fragilidade humana. Por um lado, temos a génese do androide David, criação de quem se pensa Deus, todo poderoso e criador de nova vida. Por outro, temos uma catástrofe em nave de missão colonial.
Ridley Scott presenteia-nos um cinema cruel.
A imagem de câmaras de sono criogénico cambaleando no meio de uma tempestade espacial é algo assombroso. “Alien: Covenant” faz questão de sublinhar a fragilidade da vida humana e reforça esse horror com a morte imediata de uma série de personagens que nem tivemos tempo de conhecer. James Franco entra no filme só para ser queimado vivo dentro de uma cama feita caixão. Trata-se de um presságio do que está para vir, a chacina indiscriminada de personagens subdesenvolvidas, tão mal esboçadas que essa condição parece escolha deliberada. Não os entendemos como pessoas, mas sim como criaturas falíveis, arrogantes perante uma força que não entendem.
Como sempre acontece nos filmes “Alien,” este grupo de almas perdidas desvia a sua viagem para um planeta estranho. Lá, encontram o seu fim. Mas antes disso, deparam-se com uma paisagem que perturba pela calma contranatura, um silêncio sepulcral e uma atmosfera amena, plantas de aspeto terrestre e uma total ausência de vida animal. No instante em que as figuras tiram os capacetes e decidem respirar livremente no planeta desconhecido, os olhos do espetador começam a revirar. Mas Scott está mais interessado na falibilidade do que em excelência. Por isso as suas não-personagens cometem erros estapafúrdicos e sujeitam-se à punição de um deus cruel.
Michael Fassbender é o homem duplicado.
Só que, neste universo de “Alien,” divindades são mentiras. Ora o Criador é o Engenheiro caprichoso que tanto concebe como quer destruir a Humanidade, ou será o realizador que manda sobre a realidade cinematográfica. E, como é evidente, também há David. A criação de uma criação, o androide interpretado por Michael Fassbender continua o arco narrativo começado em “Prometheus,” mostrando a ascendência da máquina. De facto, quando David aparece aos colonos enquanto salvador misterioso, “Covenant” dá uma cambalhota tonal e aterra num registo mais próximo do filme B que do terror ‘elevado.’
Por outras palavras, David é como o Dr. Moreau de H.G. Wells, esse cientista louco que, sozinho numa ilha, enche o habitat com as criações mais tenebrosas do seu laboratório. Neste caso, os monstros são protótipos do xenomorph, criados depois do robot se vingar dos Engenheiros com um genocídio acompanhado pela poesia de Shelley. Fassbender é uma maravilha como uma entidade ambivalente tornada vilão. Ainda para mais, as suas melhores cenas colocam-no em contracena consigo mesmo. Em “Alien: Covenant,” o ator irlandês é David, mas também dá vida a Walter, uma de-evolução robótica, programado para ser menos ‘humano’ que o seu gémeo.
Um filme sempre pronto a atacar.
A partilha da mesma cara entre as duas personagens possibilita o twist com que Scott encerra a fita, um ataque final contra as suas personagens. Só que também é um ataque contra a audiência, aniquilando a possibilidade de catarse ou a mera ilusão de que há esperança. “Covenant” mergulha no niilismo profundo com que o cineasta há décadas experimenta, invocando uma hostilidade atroz. Não se sente qualquer piedade, nem mesmo o afeto de um contador de histórias para com o seu conto. Quase conseguimos imaginar o filme em forma de besta, a rosnar e mostrar os dentes, uma ameaça tão ou mais mortífera que esse organismo perfeito – o xenomorph.
E por falar nessa abominação, “Alien: Covenant” inclui novas variações do seu design e morfologia, inclusive novas possibilidades infernais daquele líquido preto que tanto se afirma essência da vida como poção da morte certa. O design não é tão diabólico como as ilustrações originais de H.R. Giger, mas é suficiente para dar calafrios. Ainda no campo visual, Dariusz Wolski merece aplausos pela fotografia, sempre apurada para o lado épico da encenação e as possibilidades mais afiadas da tecnologia digital. Não se trata de beleza convencional, mas um espetáculo de frustração estética. Ou seja, uma reflexão da narrativa, suas crueldades e desinteresse em satisfazer fãs do franchise.
Por fim, depois de quatro artigos, finalmente damos as boas-vindas a Ellen Ripley. Não percas o próximo artigo neste ranking da saga “Alien.”