©MONSTRA

MONSTRA ’22 | TerrorAnim: Curtas, em análise

[tps_header]

É já tradição no Festival MONSTRA, e também não falou nesta 21ª edição: falamos da sessão TerrorAnim Curtas, a qual se insere na programação do mesmo nome e presta homenagem a obras de animação afins aos géneros do terror e fantástico.

Avaliamos agora, ainda que de forma breve, as 7 curtas-metragens exibidas no dia 21 de março, pelas 20h00, no Cinema City de Alvalade.

[/tps_header]

O NÃO NASCIDO DE CAROLINA SANDVIK (SUÉCIA, 2021, 15′) 

TerrorAnim O Não Nascido
©MONSTRA

 

A sueca Carolina Sandvik abre esta sessão do TerrorAnim com o perturbador e lynchiano “O Não Nascido”, uma reflexão horrorífica acerca da maternidade e dos processos físicos complexos que esta acarreta. No inglês “The Expected”, este filme lida com a perda e os horrores não cantados da gravidez, quiçá a experiência mais aterradora pela qual o ser humano passa e a que mais se aproxima dos confins do género do body horror. Por isso mesmo, vários dos filmes desta sessão lidam precisamente com mulheres grávidas, não fosse esta uma simbologia visual tão fértil e transformadora.

Este é um filme capaz de perdurar na memória de quem o vê, como uma exploração visceral do terror que é um aborto. Não existe nenhum monstro real, senão a perda, à medida que um ansioso futuro pai deambula pelo seu apartamento, incapaz de lidar com a perda do seu bebé, à medida que a sua parceira, devastada pelo aborto que sofreu, se encontra tão fustigada ao ponto de se tornar apenas um invólucro de pele vazio. Aqui a metáfora é extremamente visual, inteligente, quase perversa.

Uma obra de stopmotion, “O Não Nascido” é um thriller psicológico que explora de forma inteligente a psique humana, transformando um evento mundano num capaz de provocar temores, como apenas as obras de qualidade são capazes de fazer. A animação não é bela, mas o grotesco claramente integra-se na história. Um sólido arranque.

Classificação: 80/100




DEIXA-TE DISSO DE INEZ KRISTINA (DINAMARCA, 2021, 7′) 

MONSTRA curtas terror cinema city cut it out
©MONSTRA

 

“Deixa-te Disso”, da autoria de Inez Kristina, tem muito sangue, tripas e monstros, no seu arranque assemelha-se até a um filme pós-apocalítico de ação, mas, na realidade, é uma história que pouco apoquenta os seus espectadores. Ilustradora e animadora oriunda de Malta, Inez Kristina cria aqui mais um conto que, nesta sessão, explora a ligação entre organismos e a sua prole, à medida que um monstro feito de carne exposta procura devorar e integrar, através de um cordão umbilical, uma corajosa agente especial de uma unidade de detonação de bombas.

A resiliência da protagonista feminina central acaba por ser a sua principal valência, e os seus esforços recordam-nos de uma Ripley em todo o seu heroísmo anunciado. Todavia, “Cut it Out”, no título original, tem uma animação demasiado grosseira e tecnológica, nesta peça que se apresenta como a primeira curta realizada por esta artista. A própria autora identifica este pequeno filme como um estudo de personagem “surrealista e absurdo”, uma descrição que parece encaixar que nem uma luva, mas que realmente denota também os seus maiores problemas.

“Cut it Out”, o segundo filme exibido nesta sessão de curtas TerrorAnim, tem um fio narrativo muito breve e sofre de síndrome de curta-metragem (curta) : a sua história não tem realmente um princípio, meio e fim, parecendo solucionada de forma dúbia e apressada. Todavia, reconhece-se qualidade gráfica muito para lá do esperado de um filme que, como este, foi criado no âmbito universitário.

Classificação: 65/100




NOITES PARALIZANTES DE ANNA HENRIETTE KOPPEN (HOLANDA, 2021, 4′) 

noites paralizantes na MONSTRA
©MONSTRA

“Noites Paralizantes” é uma das curtas de menor duração a exibir nesta sessão mas apresenta um conceito e não uma narrativa completa e, por essa razão, os quatro minutos de duração são mais do que suficientes para que a ideia central seja transmitida de forma eficaz. Apesar de apresentar uma ideia coesa, interessante e exposta de forma visualmente estimulante, a verdade é que este filme sobre paralisia de sono não é de todo um objeto afim aos reinos do terror que supostamente marcam presença na programação da secção TerrorAnim nesta MONSTRA ’22.

“Paralysed Nights” é um objeto simples e que provavelmente poderia beneficiar de algum aprofundamento de conceitos. Ao fim de contas, este fenómeno pode ser verdadeiramente aterrador, como os góticos tanto exploraram no passado. O outro problema é que já existem inúmeras curtas-metragens, tanto de animação real como de animação e, por isso, acrescentar algo novo e empolgante à representação da temática é um desafio considerável.

Classificação: 68/100




BOLONHESA DE ACHILLE THIÉBAUX (FRANÇA, 2021, 6′) 

Bolognaise TerrorAnim
©MONSTRA

 

Esta curta francesa de Achille Thiébaux é uma favorita pessoal entre a seleção do TerrorAnim. Um filme quase perfeito para a sua duração de seis minutos, e que nunca resultaria como longa-metragem, enquadra-se, de facto, na premissa desta sessão. Aliás, fosse esta história criada em imagem real, seria quase demasiado devastadora para as sensibilidades de muitos membros do público. Há algo mais horrífico que isso?

“Bolognaise”, no francês, é uma obra distópica a preto e branco e salpicada de vermelho, como um quadro que presta homenagem ao expressionismo alemão, em todo o seu delicioso terror simbólico. É difícil falar sobre o filme sem abrir demasiado o jogo, uma vez que esta pequena gema se encontra repleta de reviravoltas macabras inesperadas. Todavia, há que dizer que, em menos de seis minutos úteis de filme, o realizador cria um mundo negro e absurdo bastante robusto, num ultra-pesadelo industrial, onde o controlo da população se faz através da alimentação: o ser humano já não come para viver, vive para comer. A carne crua apela à sua animalidade, à medida que todos nos tornamos um pouco mais dormentes e simultaneamente mais ferozes.

Excelente filme de final de curso, que parece antes realizado por alguém na indústria há muitos anos. Um bónus acrescido, “Bolonhesa” está disponível no Vimeo para ver e rever.

Classificação: 90/100




COLÓNIA DE PILAR GARCIA-FERNANDEZSESMA (EUA, 2021, 13′) 

short film TerrorAnim MONSTRA
©MONSTRA

Na sua essência, “Colónia” é um thriller de body horror, que relaciona o processo de metamorfose dos insectos com a reprodução humana. Mamífero e insecto tornam-se um só, neste conto distorcido acerca de maternidade que, curiosamente, na marca singela dos 13 minutos, parece um pouco longo de mais para a breve história que conta.

Fosse uma narrativa de imagem real, o horror da transformação poderia chocar. Todavia, a animação suave e colorida, com uma palete muito pouco inquietante, escolhida pela realizadora independente de Nova Iorque Pilar Garcia-Fernandezsesma, acaba por suavizar muito o impacto de tudo o que vemos no ecrã. Numa nota interessante, “Colónia” é outra história realizada por uma mulher, neste TerrorAnim, e que coloca a maternidade e a gravidez em primeiro plano. Nunca uma sessão de curtas de terror assumiu um carácter tão feminino e, por isso, temos de felicitar a MONSTRA pela seleção.

Classificação: 70/100




MÃE DE KAJIKA AKI FERRAZZINI (FRANÇA, 2020, 9′) 

MOM TerrorAnim Monstra 22
©MONSTRA

“Mãe” é mais nostálgico e dramático do que propriamente assustador, apensar dos seus tons neo e banda-sonora realmente puxarem para o lado dos thrillers mais dramáticos. A curta-metragem parece traçar uma crítica à sociedade mediática, colocando-nos perante um cenário que parece saído das páginas do livro “The Hunger Games”.

Todavia, e suponho que é essa a herança geral de um filme que tenta apresentar um enredo complicado em menos de dez minutos, é difícil compreender todas as peças do puzzle que nos é apresentado. Tanto se traça uma crítica a uma sociedade distópica, insensível em relação ao meio ambiente e aparentemente alienada do ponto de vista emocional, como se recorda a relação próxima entre uma mãe e uma filha. Caso exista uma ligação entre estes dois elementos, de certo não é fácil compreendê-la.

Esta pequena história provavelmente ganhava muito com 10 minutos extra de duração, mas em termos técnicos e emocionais, sem dúvida que, apesar de parecer um produto algo inacabado, se lhe reconhecem vários trunfos.

Classificação: 75/100




TERRORANIM FECHA COM AUTOCARRO NOTURNO DE JOE HSIEH (TAIWAN, 2021, 20′) 

MONSTRA Autocarro da Noite
©MONSTRA

Joe Hsieh fecha, em chave de ouro, esta sessão TerrorAnim na MONSTRA ’22, como um filme noir encantador que não só se aproxima mais dos meandros do terror como o faz com nítido humor mordaz e muito, muito negro. Na cultura chinesa, o macaco é um animal tido como original, inteligente, capaz, amável e observador. Todas estas características são morbidamente exploradas em “Night Bus”, uma obra que coloca o ênfase na moralidade dos atos das suas personagens centrais,

No mundo de “Autocarro Noturno” a malvadez é castigada a rigor, numa obra de animação com um visual muito clássico e apelativo que já anda há quase dois anos na rota de festivais, merecidamente, e que inclusive foi premiada no afamado Festival de Sundance, nos EUA. No ano passado, havia já vencido o Grand Prix no Animafest Zagreb 2021.

Aqui, todos os atos têm consequências e se, por vezes, se resvala para o melodramático e até para o inverosímil, a verdade é que “Autocarro Noturno” nunca é nada menos do que delicioso. Quando um colar é roubado num autocarro, tudo o que se segue leva a um grave e fatal acidente que vai despoletar uma série de eventos intrigantes que tocam em temáticas como vingança, amor e traição. Por muito exacerbado que seja, “Autocarro Noturno” é memorável e bem executado, não tivesse o seu realizador demorado cinco anos a ver a obra terminada.

Classificação: 90/100

[tps_footer]

Lê Também:   MONSTRA '22 | Flee - A Fuga, em análise

Tens acompanhado a 21ª MONSTRA – Festival de Animação de Lisboa, que acaba amanhã (27 de março) em Lisboa? 

[/tps_footer]

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *