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The Handmaid’s Tale, quarta temporada em análise

“The Handmaid’s Tale” chegou ao final da sua quarta temporada, em junho de 2021, com uma nuvem negra a abater-se sobre o mundo de June (Elizabeth Moss), à medida que a retribuição finalmente está ao seu alcance (e é atingida). 

Num quarto ano com menos capítulos, mas que finalmente fez avançar a história, somos devorados por algo que prometia há muito chegar: Gilead tornou-se um estado de espírito e à nossa protagonista pouco mais parece aguardar senão ser engolida pelo vazio.

 

Foram 10 capítulos com níveis de progressão narrativa muito distintos. A meio do trajeto lá chegámos ao “El Dorado”: o outro lado. E agora, para onde se movem estas figuras fantasmagóricas?

 

ATENÇÃO: o artigo contém pequenos SPOILERS relativos à T4 de “The Handmaid’s Tale”. 

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AVANÇOS NARRATIVOS NA 4ª TEMPORADA DE  “THE HANDMAID’S TALE” 

Handmaid's Tale t4
Imagem promocional oficial da 4ª temporada © MGM Television Entertainment Inc.

Depois de uma terceira temporada dominada pela lenta progressão narrativa, perante o descontentamento de parte da muito fiel base de seguidores de “The Handmaid’s Tale”, eis que o esperado quarto ano nos transportou para novos cenários e situações, com Gilead cada vez mais descentralizada e a vertente de conflito geopolítico a agudizar-se.  Por fim June Osborne está livre da sua existência totalitária enquanto Offred, procurando exílio no Canadá.

Os primeiros episódios da temporada, interessantes do ponto de vista visual e emocional, prometeram transportar-nos para direções distintas. Se por um lado surgiu a hipótese de fuga (uma vez mais), também a recaptura de June e das restantes colegas de fado se fazia inescapável. Este jogo perpétuo de gato e rato, ao qual assistimos especialmente nos primeiros 4 de 10 episódios, deixou a desconfortável sensação de que o enredo nunca daí passaria. Ao fim de contas, a espectacular primeira temporada teve um material literário forte como sua base e, a partir daí, o criador Bruce Miller e a sua equipa têm vindo a “esticar” o enredo de “The Handmaid’s Tale”, recorrendo a um desolador espectáculo visual e a uma sucessão de engenhosa exposição de tortura física e psicológica.

Por muito que essa fórmula nos tenha horrorizado e entretido, com June a as restantes handmaids como um símbolo das próprias limitações recentes à liberdade reprodutiva das mulheres no Sul dos Estados Unidos da América (“The Handmaid’s Tale” é perversamente atemporal e o crédito vai para a escritora da obra original, Margaret Atwood), a verdade é que esta história clamava por progressão.

PARA LÁ DE GILEAD…

“Chicago”, o 5º episódio, providenciou isso mesmo. A porta para Gilead fecha-se, em parte, e June parte em busca da tão anunciada revolta em Chicago. Aqui, onde os Estados Unidos da América lutam ainda pela sua auto-determinação e é desconcertante constatar que a narrativa de “May Day”, tão importante na temporada anterior, é trocada com pouca cerimónia pela chegada da comitiva de Moira (Samira Wiley). A conveniência narrativa, sinal eterno de alguma preguiça na escrita de argumentos, é aqui autoevidente. Numa cidade devastada por bombardeamentos, é para Moira facílimo e casual encontrar June e contrabandeá-la rumo ao Canadá.

The Handmaid's Tale T4
A jovem Mckenna Grace como a revolucionária esposa Esther Keyes |©NOS

 

Com isto, Janine, Lydia ou a bem-vinda e recém-chegada esposa adolescente Esther Keyes (Mckenna Grace de “The Haunting of Hill House “), Nick e o Comandante Lawrence são algumas das poucas figuras relevantes que permaneceram (pelo menos fisicamente) em Gilead. Tal leva-nos necessariamente à adoção de uma estrutura de narrativa muito mais bipartida, com o estado autoritário apenas como o segundo palco da ação. Agora, o Canadá é a terra prometida onde a conveniência política e as relações internacionais poderão uma vez mais comprometer a primazia dos direitos humanos.

A segunda metade desta temporada,  num quarto ano nomeado a 15 de julho a 21 prémios Emmy (à frente em número de indicações seguem apenas “The Crown” e “The Mandalorian” com 24 cada e “Wandavision” com 23), adota um registo menos sanguinário e chocante. Isto se excluirmos o seu clímax dramático, claro está. Com a despedida de uma personagem central à narrativa, “The Handmaid’s Tale” conseguiu chocar e garantir que o sangue fervilhava e as pulsações dos seus e suas espectadores subiam.

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Mas a que custo? Terá o empolgante final desta quarta temporada sido conduzido unicamente pelo valor choque? Tal como avançámos como hipótese nas primeiras impressões desta T4, a narrativa da heroína caída em desgraça, um símbolo vazio, vítima do trauma, parece cada vez mais provável. A corrupção moral de June foi em tempos assim interpretada como tal apenas por Gilead, nunca pelo espectador. Agora, já não temos assim tanta certeza.

Alexis Bledel em The Handmaid's Tale
Alexis Bledel (“Gilmore Girls”) como Emily |©2021 MGM Television Entertainment Inc

Não obstante alguma repetitividade, alguns atalhos pouco ambiciosos e uma nítida sensação de “beco sem saída”, “The Handmaid’s Tale” conseguiu em 2021 encontrar, algures entre idas a Tribunal e encontros secretos, momentos para tocar em traumas profundos e experiências coletivas que conseguem tocar a mulher contemporânea para lá do universo distópico. A raiva feminina volta a ser, por exemplo, personificada na Emily de Alexis Bledel, que com um olhar diz tudo e que, depois de vencer um Emmy por este papel como Melhor Atriz Convidada em 2017, foi novamente indicada nesta categoria pelo episódio “Testimony” (2021). Esta é a quarta nomeação de Bledel aos Emmy por esta poderosa força discreta que interpretou  já em 21 dos 47 episódios da série.

Quem não é nada discreta é Elisabeth Moss, cada vez mais extraordinária e confortável no papel da sua mártir e algures entre heroína e anti-heroína: June Osborne. Esteja prestes a deixar-se cair no abismo, a desprezar piamente a sempre exasperante (no bom sentido) Serena de Yvonne Strahovski (“Stateless”), a traduzir o peso do ódio ou do trauma, Moss é inegável em cada gesto, cada olhar, cada movimento. Como protagonista, produtora e agora também realizadora (embora algo demasiado extravagante para o seu próprio bem) de vários capítulos, Moss é a alma desta produção e sabe-o demasiado bem. A quantidade de grandes planos ou muito grandes planos centrados no seu rosto tornam-se por vezes quase cansativos, mas a June de Moss é rainha no seu trono e nada o alterará. Este é, ao fim de contas, o seu conto.

The Handmaid's Tale T4
Elisabeth Moss regressa a um dos seus mais icónicos papéis | ©2021 MGM Television Entertainment Inc

 

Algo longe do outrora conquistado valor de novidade disruptivo, “The Handmaid’s Tale” permanece um comentário relevante acerca do papel da mulher no mundo e uma distopia capaz de providenciar um elevado valor de entretenimento e produção. Contudo, estará a saturação a aproximar-se? Tudo permanece em aberto. Aqui aguardamos pelo já garantido quinto ano…

TRAILER | A T4 DE  “THE HANDMAID’S TALE” É UM EXCLUSIVO NOS PLAY

 

“The Handmaid’s Tale” encontra-se disponível na plataforma NOS Play, sendo a T4 um exclusivo deste serviço de streaming. 

The Handmaid's Tale, quarta temporada em análise
handmaids tale poster

Name: The Handmaid's Tale

Description: Na 4.ª temporada de "The Handmaid’s Tale", June (Elisabeth Moss) contra-ataca Gilead como uma temida líder das forças rebeldes. Mas os riscos que ela corre trazem consigo perigosos e inesperados desafios.

Author: Maggie Silva

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CONCLUSÃO

“The Handmaid’s Tale” continua a destacar-se como uma série televisiva da mais elevada qualidade técnica e performativa. Contudo, depois de quatro temporadas e de há muito se ter afastado da sua base literária, as liberdades criativas tomadas para avançar o enredo começam a colocar em causa a verosimilhança e credibilidade dentro do próprio universo.

Pros

-Mais um ano de estrondosas prestações (Moss é mais arrebatadora que nunca) ;

– Os capítulos pautam-se pela grandiosidade técnica e fotografia exímia, variedade de localizações, riqueza dos sets e detalhe na escolha da banda sonora;

-Finalmente deixamos de andar em círculos e o enredo avança;

Cons

-A conveniência dos salvamentos, encontros aleatórios e a própria resistência de June, contra todas as expetativas, acabam por enfraquecer a qualidade da história;

-Agora que Gilead é apenas parte do palco de “The Handmaid’s Tale”, será que o Canadá conseguirá manter a pertinência do enredo em altas? A série é de momento uma folha em branco, sem rumo evidente. Estará o seu período áureo ultrapassado? O futuro é uma incógnita com indícios inquietantes;

– Um final que  poucos favores fará à construção da jornada de June na já confirmada 5ª temporada ;

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