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Festival de Veneza 2024: Daniel Craig regressa ao cinema Queer

Daniel Craig é o escritor William S. Burroughs em “Queer”, o novo e ousado filme do italiano Luca Guadagnino (“Chamam-me Pelo Teu Nome”). A grega Athina Rachel Tsangari (“Attenberg”), regressou à Competição com “Harvest”, um filme protagonizado pelo terrivelmente expressivo Caleb Landry Jones. A Competição aproxima-se rapidamente do fim…

O realizador italiano Luca Guadagnino, trabalhava na rodagem de “Challengers” (2024), estreado há poucos meses nas salas de cinema, quando decidiu propor “Queer”, o segundo romance do escritor William S. Burroughs (1914-1997) ao argumentista Justin Kuritzkes, para transformá-lo no guião do filme que estreia agora na Competição do 81º Festival de Cinema de Veneza. Há mais de trinta anos que o Guadagnino, já nomeado ao Óscar, por “Chama-me Pelo Teu Nome” (2017), queria fazer um filme baseado neste romance de Burroughs, considerado um dos pais da literatura beat norte-americana, livro que leu pela primeira vez quando era adolescente. O livro foi escrito em 1952, mas publicado apenas em 1985 porque foi considerado demasiado escandaloso e controverso, por causa do uso das drogas e a descrição de cenas muito realistas de homossexualidade, que são aliás também a grande marca do filme.

Um excepcional Daniel Craig

Queer Daniel Craig
©A24

A história passa-se em 1950 e a figura principal é William Lee, — interpretado por um excepcional Daniel Craig, num papel em que estamos pouco habituados vê-lo — um americano no limiar dos quarenta anos, que vive expatriado na Cidade do México. William passa os dias quase sozinho, embebedando-se nos bares da cidade, até conhecer Eugene Allerton (Drew Starkey, estrela da série “Outer Banks”), um jovem estudante por quem se apaixona. Inicialmente relutante, Eugene acaba cedendo aos avanços de William, que começa a iludir-se pensando que poderá finalmente estabelecer uma relação íntima e estável. Entre os impulsos sexuais e a toxico-dependência sobretudo de Lee, seguem juntos numa viagem pela América Latina, em busca na busca pelo yage, ou ayahuasca, uma droga usada pelos índios da nascente do rio Amazonas à qual se atribuem poderes sensoriais e anestésicos.

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Uma viagem alucinante

É a partir deste “Queer”, um pequeno romance semi-autobiográfico onde Burroughs na verdade transpôs a sua própria história de amizade com Adelbert Lewis Marker (1930-1998), um soldado da Marinha americana dispensado, — há dúvidas senão faria espionagem ou seria informador da CIA — que vivia na Cidade do México, que Guadagnino diz que realizou aquele que, é seu filme mais pessoal, mas também o mais explícito, ousado e abstrato, com uma narrativa que fica em suspenso ou que é difícil descobrir o que são fantasias, alucinações e a realidade. Mais difícil foi transformá-las em filme. Apesar de tudo, segundo o realizador o projeto é também uma homenagem a Michael Powell e Emeric Pressburger, a dupla de realizadores do clássico musical “Sapatos Vermelhos”: “Acho que se eles vissem o ‘Queer’ iriam apreciar muito as cenas de sexo, que são numerosas e bastante escandalosas”.

Um produto da Cinecittà

Queer Daniel Craig
©A24

“Queer”, é filmado quase inteiramente nos estúdios da Cinecittà, onde foi reconstruído com muita fidelidade, um bairro da Cidade do México, na década de 1950. Além da dupla de protagonistas conta com um elenco de luxo onde está Lesley Manville, Jason Schwartzman e Henrique Zaga, interpretando figuras que dão algum humor ao filme. A excelente banda sonora conta com a música de Trent Reznor e Atticus Ross, ambos vencedores de dois Óscares por “Soul” (2020) e “A Rede Social” (2010).

Agricultura vs. Indústria

Harvest
Photo by Jaclyn Martinez, via ©The Match Factory

A grega Athina Rachel Tsangari regressou à competição de Veneza com “Harvest”, depois de “Attenberg” (2010), filme que rendeu à atriz Ariane Labed a Coppa Volpi de Melhor Interpretação Feminina. “Harvest” (a tradução literal “Colheita”, ajuda a entender melhor o cerne do filme) é baseado no romance homónimo de Jim Crace. O filme passa-se numa aldeia remota na zona rural inglesa do final do século XVI, no final daquela revolução agrícola que transformou a terra de bens coletivos, em bens colocados sob o controlo direto e legal dos proprietários de terras. Ao longo de uma semana seguimos Walter Thirsk (Caleb Landry Jones), um homem dessa comunidade, que se dedica à agricultura e o seu amigo da infância, o desajeitado proprietário Charles Kent (Harry Melling).

Uma tragicomédia campestre

Na verdade, o tema do filme assenta no trauma da modernidade versus agricultura e numa espécie de metáfora tragicómica do género western, passado nas terras frias e profundas da Grã-Bretanha, na passagem do modelo económico agrícola, para o industrial. “Harvest” é um filme sobre um acerto de contas— como explica Tsangari nas notas do realizador —, que se passa num mundo liminar e que ilustra as primeiras fissuras da “revolução” industrial. É um filme sem heróis, pelo contrário abunda a miséria e personagens falhados, pessoas comuns e imperfeitas. A direção de fotografia é belíssima aproveitando muitas vezes o crepúsculo, num filme que é rodado em 16mm, com granulação bem evidente, justamente para valorizar a meticulosa reconstrução de ambientes e atmosferas da época.

O grande Caleb

Harvest
©The Match Factory

Entre os protagonistas encontramos como já referi um ator que está em alta depois do prémio por “Nitram” no Festival de Cannes 2021: Caleb Landry Jones, recém-saído também da sua esplêndida interpretação em “Dogman”, apresentado aqui em Veneza no ano passado, além de Harry Melling, Dudley Dursley (“Harry Potter”), e Rosy McEwen.

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