“Quentin por Tarantino”, é uma novela gráfica de cerca de 240 páginas. ©Leya/divulgação

Quentin por Tarantino | Uma Vida aos Quadradinhos

“Quentin por Tarantino”, é uma notável novela gráfica, “escrita e realizada” pelo ilustrador francês Amazing Améziane, inspirada na vida e obra do realizador. Trata-se de uma banda desenhada para descobrir de uma maneira diferente, como o rapazinho de Knoxville, apaixonado e autodidata do cinema, se tornou num dos maiores realizadores da atualidade. Concorre ao passatempo da MHD e ganha um exemplar!

“Quentin por Tarantino”, é uma novela gráfica de cerca de 240 páginas, publicada em português pela ASA e da autoria do escritor, ilustrador, diretor artístico e professor de banda desenhada francês, Amazing Améziane (n.1972), sobre o cineasta que se tornou um dos grandes ícones do nosso tempo. Sobre o autor, influenciado pelas bandas desenhadas de Frank Miller & Bill Sienkiewicz, pelos filmes de Bruce Lee e Sergio Leone e pelos ritmos da soul dos anos 1966-76, — influências que curiosamente partilha com Tarantino —Améziane (ainda não Amazing…) trabalhou até ao fim de 2001 como simples ilustrador e designer gráfico.

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Tornou-se Amazing, depois de ter produzido sozinho as cento e oitenta páginas do thriller noir “BagMen”, (2013), em seis meses. Produziu depois disso, cerca de 20 livros, alguns dos quais traduzidos em mais de 9 países: “Muhammad Ali” (best seller do New York Times), escrito por Sybille Titeux de la Croix, foi o seu primeiro livro de banda desenhada publicado nos EUA. Os dois autores co-assinaram igualmente “L’Atelier des gueules cassées”, (2018), “Miss Davis” (2020), a adaptação do romance de culto “1984”, de George Orwell e as biografias de Martin Scorsese e recentemente de Francis Ford Copolla. Amazing Améziane divide agora o seu tempo entre a família e o ensino, os seus projetos de quadrinhos a solo, os seus argumentos para cinema e claro as novelas gráficas como esta “Quentin por Tarantino”.

Quentin por Tarantino
“Quentin por Tarantino” é no fundo uma extraordinária história aos quadrinhos e uma biografia incontornável. ©Leya/Divulgação




NA CABEÇA DE QUENTIN TARANTINO

Quanto a Tarantino, tem cerca de 30 anos de carreira, realizou nove filmes tornando-os quase num género próprio (“tarantinesco”), que tem sido muitas vezes imitado, mas nunca igualado, filmes esses que mudaram para sempre o cinema contemporâneo. À pergunta de como conciliar a ideia de um trabalho artístico, com a cultura popular, mesmo com filmes (quase) de série Z, Quentin responde: “Não te mexas, filho da puta, vou ensinar-te, sendo que o termo nos EUA, tem uma carga de mais cumplicidade, do que em português. “Quentin por Tarantino”, além de uma lição de vida e da sua obra é um mergulho, através de imagens desenhadas e diálogos interiores, na mente do mestre Quentin Tarantino.

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É muito difícil resumir a sua ascensão e a carreira. Então por que ser ele a contar o seu próprio percurso? Amazing Améziane, imaginou o texto como se fosse uma entrevista com o cineasta (com coisas que ele disse ou foi dizendo) e onde este, numa espécie de relato na primeira pessoa, nos vai revelando a história da sua curiosa e auspiciosa carreira como realizador; além de contar pormenores sobre a sua vida, desde o seu início humilde, como empregado de um videoclube, até à sua ascensão através dos seus sucessos de bilheteira, filmes independentes e únicos, que fizeram dele uma super-estrela global. Bom, nada de novo para quem é um razoável conhecedor e admirador da obra do cineasta. Porém o que é interessante neste livro, é confrontarmo-nos com as influências, opiniões e história de um dos cineastas mais aclamados do mundo, inconfundível pelo seu estilo e talento e, aqui está a originalidade, através de uma novela gráfica e extraordinários desenhos ao estilo muito moderno e com referência a autores como Frank Miller, talvez também uma das suas influências. 

VÊ TRAILER DE ‘PULP FICTION’

UMA DETALHADA BIOGRAFIA DO ‘MESTRE’

Essencialmente, o livro é uma biografia de Quentin Tarantino que parece contada pelo próprio em formato de história aos quadrinhos algo que é de facto bastante singular, isto como se fosse documentário com excertos que em vez de filmados, são desenhados. Trata-se de uma detalhada viagem mental sobre a sua carreira parecendo mesmo que ele é o escritor-narrador. Especialmente porque às vezes é tão sincero e tão espalhafatoso, como o Tarantino que conhecemos. Diz quem já o entrevistou ao vivo, em que as conversas, acabam por ser verdadeiros monólogos ou autoentrevistas.

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O realizador, fala, fala sem se dar conta de si mesmo, como se tivesse que dar todas as explicações, tornando-as verdadeiras lições de cinema. E não apenas do seu cinema! É de facto muito interessante saber ainda mais sobre a infância de Tarantino, os empregos que ocupou, as suas aspirações profissionais e como se tornou cineasta. Apesar de uma carreira com muito sucesso, a história em banda desenhada mostra também como esse percurso para a fama, não foi fácil: teve que lutar bastante para se afirmar e para fazer os seus filmes, para conseguir financiamento e sobretudo a dificuldade em manter-se firme quando houve resistências dos produtores, na escolha dos seus atores, como por exemplo quando quis John Travolta e Samuel L Jackson, (dois actores então rotulados de “has been”) como protagonistas de “Pulp Fiction”. O livro é na verdade um pouco caótico, cheio de anedotas e episódios interessantes, bastante desligados uns dos  outros, como o desejo de contratar Bill Lustig para realizar o magnífico “Amor à Queima Roupa”, em vez de Tony Scott, até ao seu relacionamento próximo com Samuel L. Jackson, que se tem mantido ao longo da sua carreira.

Quentin Tarantino
A história em quadrinhos mostra como o caminho para a fama, não foi fácil© Anton_Ivanov via ShutterStock (ID: 332648750)




O SEU ESPIRITO ALTERNATIVO E ‘GRINDHOUSE’

É interessante ainda observar em “Quentin por Tarantino”, como aspectos da sua vida e das pessoas que o rodeiam, acabaram por inspirar alguns dos seus personagens. É mais fascinante ainda verificar como o realizador, mostra conhecer todos e os mais pequenos detalhes e pormenores, sobre os personagens que criou. Quentin Tarantino, não é apenas realizador e argumentista, mas é também um excelente ator e director de actores, que conseguiu criar papéis para si mesmo, além de ter conseguido trabalhar e dirigir atores ao lado de artistas tão lendários como Harvey Keitel, Robert De Niro, Bruce Willis, Uma Thurman, a nossa Maria de Medeiros, além dos já referidos acima.

A história de banda desenhada mostra ainda a sua ideia de complementar a sua obra com as novelizações dos seus filmes, que aliás concretizou em “Sacanas Sem Lei” e “Era Uma Vez… em Hollywood”, publicados em livro. “Quentin por Tarantino” mostra ainda a paixão do realizador pelo cinema de todos os géneros, sejam grandes sucessos de bilheteria como “Tubarão”, ou mesmo na exploração de cinemas Grindhouse — cinemas de aparência desprezível com sessões contínuas, sobretudo, de filmes com conteúdo pornográfico, violento e de série B — que foram a marca da 42nd Street, de Nova Iorque na década de 1980 e de muitos cinemas de bairro dessa época e anteriores, em todo o mundo. Resumindo “Quentin por Tarantino” é no fundo uma extraordinária história aos quadrinhos e uma biografia incontornável, para qualquer fã incondicional do realizador.

Quentin Tarantino
Uma presença que tem sido constante no Festival de Cannes. ©Denis Makarenko / Shutterstock.com (ID: 43676548)




A VIDA CHEIA DE UM REALIZADOR ÚNICO

Quentin Tarantino nasceu em 1963, em Knoxville, Tennessee (EUA), mas em 1971, com a sua família mudou-se para El Segundo, uma pequena cidade ao sul de Los Angeles, não muito longe de Hollywood. O cineasta, tornou-se conhecido sobretudo pelos filmes “Cães Danados”, “Pulp Fiction”, “Kill Bill Vol. 1 e 2e “Sacanas Sem Lei”, entre outros. Nunca estudou numa Escola de Cinema e antes mesmo de ingressar na 7ª Arte, foi gerente de um videoclube. Refere isso muitas vezes, pois grande parte da sua criatividade e cinefilia, deve-se ao facto de ter tido acesso aos mais diversos filmes de todos os géneros populares, que serviram de inspiração para o seu trabalho. Começou a sua carreira no cinema fazendo pequenas tarefas em diversos filmes, chegando mesmo a trabalhar como ator em múltiplas séries da televisão e a escrever argumentos que se tornariam surpreendentemente grandes sucessos em Hollywood: “Amor à Queima-Roupa” (1993), de Tony Scott, e “Assassinos Natos” (1994), de Oliver Stone.

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Porém mais tarde surgiu-lhe a oportunidade de consolidar o seus conhecimentos como autodidata, fazendo o Curso de Realização do Sundance Institute. Estreou-se na realização com a produção independente, “Cães Danados” (1992), filme que foi co-produzido pelo ator Harvey Keitel, uma figura constante nos seus filmes. Logo em seguida, realizou o seu maior sucesso até o momento, “Pulp Fiction” (1994), que ressuscitou a carreira de John Travolta e deu um novo impulso a Samuel L. Jackson e Uma Thurman. Foi este filme, que proporcionou a Tarantino a sua primeira nomeação ao Óscar como Melhor Realizador, ganhando no entanto nessa cerimónia, a estatueta de Melhor Argumento Original. Foi também produtor executivo e ator de filmes como “Matando Zoe” (1994), do então estreante realizador Roger Avary, seu parceiro no argumento de “Pulp Fiction”. Participou como ator em alguns filmes de destaque, como “Aberto Até de Madrugada” (1996), de Robert Rodriguez, com George Clooney e ainda realizou um dos segmentos da comédia “Quatro Quartos” (1995), com Allison AndersAlexandre RockwellRobert Rodriguez.

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Uma das cenas de “Jackie Brown” com Robert De Niro e Samuel L. Jackson © Miramax

Em 1997, Tarantino volta a realizar sozinho um dos seus melhores filmes, “Jackie Brown”, uma adaptação do famoso livro do escritor americano Elmore Leonard. Na sua carreira como cineasta, os filmes de Quentin Tarantino estão marcados por falar do submundo do crime e não só, misturando sempre doses de humor e violência. Com o seu estilo ágil e conteúdo violento, Tarantino tornou-se num dos realizadores mais proeminentes de Hollywood, lançando várias longas-metragens de sucesso, tanto para a crítica como para o público. Ao todo, conquistou oito nomeações aos Óscares, ganhou duas vezes como argumentista por “Pulp Fiction” e “Django Libertado” (2012), depois disso ainda estreou “Os Oito Odiados” (2015) e “Era Uma Vez… em Hollywood” (2019).

Os rumores de abandonar a sua carreira nos filmes é certamente apenas uma forma blasé de Tarantino ir aumentado a sua fama e criar expectativa para o seu próximo, décimo filme. Entretanto casou-se, vive em Israel, vai ministrando cursos e participando conferências por todo o mundo, ao mesmo tempo que vai escrevendo livros especializados de cinema, como é o caso da ficções baseadas nos argumento de “Era Uma Vez… em Hollywood”, Sacanas Sem Lei e as crónicas cinematográficas “Cinema Speculation”, que não têm por enquanto uma edição portuguesa. 

JVM

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