Sophia Loren em "Matrimónio à Italiana" (1964) © Compagnia Cinematografica Champion

História dos Óscares | Viva a deusa Sophia Loren!

Sophia Loren não foi nomeada aos Óscares 2021 pelo seu desempenho em “Uma Vida à Sua Frente”, mas analisamos a sua interpretação mais recente e a história da atriz junto da Academia.

Os Óscares 2021 terminaram com toda a pompa e circunstância, assim como a temporada de prémios 2020/2021. Foram longos meses de espera até conhecermos os melhores artistas de um ano complicado para o cinema e a para a arte em geral. Nestes últimos dias temos passado por uma espécie de ressaca dos Óscares, sem saber muito bem o que fazer ou o que ver.

Mesmo com as estreias em salas de cinema de obras primas como “O Pai”, de Florian Zeller, “Mais Uma Rodada” de Thomas Vinterberg ou “Minari” de Lee Isaac Chung para lidar melhor com estas jornadas que tardam a passar, decidimos repensar uma interpretação algo ignorada nos últimos meses pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood. Referimo-nos à personagem de Madame Rosa a quem deu vida Sophia Loren no drama da Netflix “Uma Vida à Sua Frente“. Com este filme, Sophia Loren recebeu o David di Donatello de Melhor Atriz Protagonista, entregue na passada noite de 11 de maio, confirmando o quão é amada pelos seus conterrâneos colegas.

Sucesso imediato na primeira semana de estreia na Netflix em Portugal, onde integrou o TOP 10 de obras mais visionadas, “Uma Vida à Sua Frente” é um drama inspirado na obra de Romain Gary do mesmo nome e realizado pelo filho mais novo de Sophia Loren, Edoardo Ponti. O cineasta mostra tudo aquilo que Sofia Villani Scicolone significa para si como mãe, enquanto a imagem serena da atriz mostra-nos a Sophia Loren que todo o mundo conhece. A estrela não perdeu a sua luz e continua a iluminar o ecrã, num papel que se conecta fortemente com a sua árdua, por vezes traumatizante, experiência de vida.

Com Madame Rosa de Sophia Loren damos mais importância à memória, ao passado relativo ao Holocausto, que aos poucos se vai perdendo nos últimos sobreviventes do genocídio sucumbidos à passagem do tempo, e ao fim das suas vidas. Hoje, em períodos de ascensão de populismo pela Europa, precisamos de nos recordar dos sobreviventes desse genocídio. O tempo faz-se também evidente no corpo de Sophia Loren, mas não lhe retira nenhum encanto. Os grandes olhos castanhos esverdeados de Sophia Loren continuam lá e os olhos escondem coisas maravilhosos que nem sempre eles mesmos  conhecem.

Sophia Loren

Uma Vida à Sua Frente“, com alguma surpresa ou talvez pelas campanhas de marketing da Netflix, valeu a celebração desta musa do cinema italiano em diferentes associações de prémios, num reconhecimento fortemente relacionado com a sua relevância na história do cinema. Tal como Madame Rosa, as restantes personagens de Sophia Loren (são quase 100 diferentes mulheres) souberam-se adaptar à sua contemporaneidade com toda a elegância e atrevimento, rompendo limitações associadas ao género. Apesar de remeterem a contextos heterogéneos, estão quase todas um pouco à frente nas suas maneiras e gestos de ser e dialogam com as gerações de jovens mulheres nos nossos dias. Basta ver um filme com Sophia Loren a falar ou a cantar italiano, napolitano, grego ou inglês e todos queremos ser como ela.

Sophia Loren no entanto não é o seu nome real, e corresponde a uma derivação do sobrenome Torén da atriz sueca Märta Torén, atribuído pelos maiores produtores do cinema italiano entre os quais Carlo Ponti (1912 – 2007), com quem constituiria família e viveria por mais de 50 anos. Sofia Villani Scicolone, a eterna napolitana nascida em Roma a 24 de setembro de 1934, soube ultrapassar os problemas causados pela pobre infância em Pozzuoli em plena Segunda Guerra Mundial (1939-1945) ou a vida profissional e familiar exigente em Napóles, sem jamais ceder a melodramas. Sophia Loren soube e sabe viver a vida como ela é, retirando sempre proveito dela numa contínua busca pela auto-afirmação. A sua história de superação é a história de muitas mulheres da mesma geração, inesperadamente transformada em conto de fadas (ou perto disso!) com muito amor, carinho familiar, trabalho e admiração das legiões de fãs e dos seus colegas de trabalho.

Tantas ovações e aplausos, fazem de Sophia Loren uma das atrizes mais amadas em tema de galardões. Reúne assim mais de 70 prémios na sua casa em Génova na Suíça entre eles 5 Globos de Ouro (um deles é o prestigiado Cecil B. DeMille Award), o prémio de Melhor Atriz no Festival de Cinema de Cannes e a Colpi Award no Festival de Veneza, 12 prémios David di Donatello (os prémios atribuídos pela Academia Italiana de Cinema) e 2 Óscares, um de Melhor Atriz pelo filme “Duas Mulheres” (Vittorio De Sica, 1960) e outro pela carreira entregue em 1991.

A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas celebrou Sophia Loren como realmente merecia, embora a cada nova interpretação que (re)vejamos não consigamos entender como a atriz não teve outras tantas nomeações. É uma diva à altura de Katherine Hepburn, a atriz mais celebrada pela organização.

Sophia Loren
Sophia Loren no 67º Festival de Cannes | Denis Makarenko / Shutterstock.com

Entre os seus papéis mais emblemáticos contam-se os filmes “Ontem, Hoje e Amanhã (Vittorio De Sica, 1963)”, “O Último Adeus” (Vittorio De Sica, 1970), “Um Dia Inesquecível” (Ettore Scola, 1977), que felizmente não foram esquecidos da corrida às estatuetas douradas. O mesmo aconteceu este ano com “Uma Vida à Sua Frente”, obra nomeada ao Óscar 2021 de Melhor Canção Original.

De qualquer forma, não queremos aqui denegrir as escolhas da Academia para o Óscar de Melhor Atriz deste ano. Não nos poderemos esquecer que a corrida ao Óscar 2021 na categoria foi uma das mais interessantes que tivemos na última década quer pela imprevisibilidade, quer pela variedade de bons desempenhos. Sem tirar o mérito a Vanessa Kirby, Carey Mulligan, Andra Day, Viola Davis nem à vencedora deste ano Frances McDormand por “Nomadland – Sobreviver na América”, não poderemos deixar de homenagear Sophia Loren que, aos 86 anos, por pouco não se tornava na mulher mais velha de sempre nomeada a um Óscar de interpretação. Mesmo Sem a nomeação à categoria competitiva, Sophia Loren terá ainda direito a uma honra muito importante no próximo outono: receberá o Óscar Visionário, a ser entregue na inauguração do Museu da Academia a 25 de setembro.

Este artigo da MHD, escrito pelo Coordenador de Cinema & Streaming Virgílio Jesus, promete dar-te a conhecer um pouco mais sobre o seu desempenho em “Uma Vida à Sua Frente”, contextualizar a vitória e nomeações de Sophia Loren na história dos Óscares e servir inclusive como a maior carta de amor alguma vez dedicada à atriz na nossa revista. É impossível não se deixar deslumbrar por Sophia Loren! Vens nesta viagem connosco?

O enorme fascínio que sentimos por Sophia Loren estará presente em cada um dos próximos parágrafos e isso não poderemos negá-lo. Segue todas as setas, lê os artigos que recomendamos e vê todos os vídeos partilhados contigo.




Sophia Loren vence o Óscar por “Duas Mulheres”

Antes sequer de vencer o seu primeiro Óscar de Melhor Atriz por “Duas Mulheres” nos Óscares 1962, no qual se tornaria o primeiro intérprete (atriz ou ator) a vencer a estatueta dourada por um desempenho em língua não inglesa, Sophia Loren era já um rosto conhecido do público norte-americano e, portanto, o seu sucesso junto dos membros da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas não aconteceu por mero acaso.

Uma Vida à Sua Frente
Sophia Loren em “Começou em Nápoles” (1960) © MUBI

Poucos anos antes contracenara com Cary Grant e Frank Sinatra em “Orgulho e Paixão” (1957), com John Wayne em “A Cidade Perfeita” (1957), com Anthony Perkins em “Desejo Sob os Ulmeiros” (1958), com William Holden em “A Chave”, com Anthony Quinn em “A Orquídea Negra” (1958) e novamente com Cary Grant no divertídissimo “Quase nos Teus Braços” (1958).  Estes últimos parte de um contrato de cinco filmes assinado entre a atriz e um dos majors studios de Hollywood, a Paramount Pictures. Todos acabaram por ser um enorme sucesso junto do público, sobretudo pela química de Sophia Loren e os homens mais velhos com quem contracenou – Loren tinha apenas 25 anos quando vez de par romântico com Gable, com 59 anos.

Além disso, deu personalidade às suas mulheres não apenas limitadas aos estereótipos italianos – poucas foram as vezes em que Sophia Loren não interpretou uma italiana, tendo em conta os permanentes lapsos de casting em Hollywood muito em voga neste altura. Sophia Loren canta, dança e move-se de maneira ousada nesses filmes, conferindo uma certa atitude feminista que subtilmente seduz o espectador e os seus co-protagonistas.

Apesar de tanta fama, Sophia Loren não quis separar-se totalmente da sua cara Italia e em 1959 recebe um convite de Vittorio De Sica para participar em “Duas Mulheres” (“La Ciociara” no original), uma adaptação do romance de Alberto Moravia publicado em 1957, sobre eventos que decorreram em Itália em 1943, referentes à onda massiva de violações sexuais e assassinatos brutais levadas a cabo pela tropas aliadas marroquinas que serviam no exército francês e que ficaria conhecida como “Marocchinate”.

Sophia Loren

O filme com produção de Carlo Ponti teve um processo de bastidores complicado, porque inicialmente seria George Cukor e não De Sica a realizar o projeto e seria Anna Magnani a interpretar Cesira e Sophia Loren como Rosetta. Nunca aconteceu, porque Anna Magnani abandonou o projeto por razões muito pouco claras, como refere Sophia Loren em entrevista ao ‘The Hollywood Reporter’ (ouvir um podcast com mais de uma hora aqui). Existe uma versão da história que diz que Magnani não queria ser ‘mãe’ de Loren no cinema (embora tivesse idade para isso, com 26 anos de diferença). Já outra versão refere o facto de Sophia Loren ser casada com Carlo Ponti como um facto que levou Magnani a afastar-se.

Em detrimento da decisão de Magnani, Sophia Loren foi escolhida para o papel da matriarca Cesira, mesmo sendo tão jovem e o papel de Rosetta foi entregue à recém-contratada e desconhecida atriz Eleonora Brown. Com toda a beleza do preto e branco, somos envolvidos numa das histórias italianas mais intensas e algo singular para a época, muito conhecida por uma sequência de violação que deixa a personagem de Sophia Loren completamente horrorizada. O trailer de “Duas Mulheres” pode ser visto abaixo.

Duas Mulheres | Trailer do filme com Sophia Loren

Mais que referir o quanto a interpretação de Sophia Loren é a prova do seu talento, este é um filme que se conecta imediatamente à vida da atriz, que outrora criança teve que sobreviver à falta de alimentos provocada pela II Guerra Mundial. A Cesira de Sophia Loren coloca a atriz despojada de artíficios da Hollywood que a elevou a estatuto de estrela. Há uma força cruel que poderia muito bem colocar Cesira como representação máxima de todas as mulheres em tempos de conflito armado, totalmente devastada pelo destino da filha e pelo desmoronar de um país em crise, dominado por inimagináveis atrocidades cometidas por homens nesse período.

Como Cesira, Sophia Loren transmite doçura e segurança e procura acalmar regularmente a sua Rosetta, uma flor inocente em ponto de desabrochar. Quando não o consegue fazer, os seus olhos enchem-se de espanto, de lágrimas e a sua boca arrebatada por gritos lamentosos que entretanto não conseguem, nem podem, ficar mais tempo guardados. A fragilidade dos sentimentos é notável na dupla e Sophia Loren evidencia as complexidades vividas da época, apesar de não deixar morrer o desejo de recomeçar do zero.

Apesar de muitos incluírem “Duas Mulheres” na onda do neorrealismo italiano, esse movimento cinematográfico estava já num passado distante e a Itália começava a mudar de paradigma, para as narrativas contemporâneas e intelectuais ao estilo da Nouvelle Vague. No entanto, De Sica e o seu célebre colaborador Cesare Zavattini, com o distanciamento temporal certo e as memórias de quem soube trazer ao grande ecrã histórias sensíveis e bem tratadas do ponto de vista de crianças como “Sciuscià” (1946) e “Ladrões de Bicicleta” (1948) enaltece a naturalidade da representação das duas protagonistas. As duas mulheres são o retrato de uma ferida inesquecível da Itália e que precisa de ser sarada.

A vitória de Sophia Loren nos Óscares foi mais do que merecida. Porém, a atriz na época com 28 anos, jamais pensaria vencer o galardão e com o medo de enfrentar de cara as maiores estrelas de Hollywood acabou por não apanhar avião nem participar na cerimónia. Enquanto Sophia Loren dormia na sua casa em Itália, Greer Garson recebeu o galardão em seu nome, como poderás observar no vídeo abaixo.

Sophia Loren vence o seu primeiro Óscar

Nomeadas ao Óscar 1962 de Melhor Atriz

  • Sophia Loren, “Duas Mulheres”
  • Geraldine Page, “Fumo de Verão”
  • Piper Laurie, “A Vida É Um Jogo”
  • Audrey Hepburn, “Boneca de Luxo”
  • Natalie Wood, “Esplendor na Relva”

Sabias que… depois de ter filmado “Duas Mulheres”, Sophia Loren voltou a rodar uma grande produção de Hollywood, intitulada “El Cid“, no qual tornou-se apenas a 2ª atriz a receber 1 milhão de dólares pela sua participação? A primeira foi Elizabeth Taylor pela magnificência de “Cleópatra”.

Continua com a leitura deste artigo e conhece o papel que valeu a Sophia Loren, a segunda nomeação ao Óscar de Melhor Atriz. 




Sophia Loren nomeada por “Matrimónio à Italiana”

O sucesso de Sophia Loren na Academia de Hollywood com “Duas Mulheres” não foi isolado. A atriz voltou a ser nomeada para a estatueta dourada de Melhor Atriz pela sua interpretação em “Matrimónio à Italiana” na edição dos Óscares 1965, filme que acabaria também por ser nomeado no ano seguinte ao Óscar de Melhor de Língua Não-Inglesa, como representante de Itália. Acabou por perder ambas categorias dos Óscares, mas não deixa de ser uma oportunidade de (re)vermos o quão bela é Sophia Loren, e o quão ousadamente deambula pelas ruelas de Nápoles, que tantas vezes revelou ser a sua verdadeira terra natal.

Matrimónio à Italiana” é tão italiano não só por mostrar os gritos e gestos exagerados da sociedade do sul de Itália como pelos seus protagonistas, uma das duplas mais amadas da história do cinema: Sophia Loren e Marcello Mastroianni. Curiosamente, apesar das suas parcerias em 12 filmes, incluindo “Ontem, Hoje e Amanhã (1963)”, nunca foram nomeados aos Óscares pelo mesmo filme. Em “Matrimónio à Italiana”, cujo trailer podes ver abaixo, Sophia Loren interpreta Filumena Marturano uma mulher apaixonada por Domenico ‘Dummì’ Soriano, proprietário de uma pastelaria em Nápoles, de quem é amante há mais de 20 anos. O relacionamento não segue em frente, pois Domenico não consegue estabelecer um vínculo institucional (o do casamento) com Filumena pelo seu passado como prostituta.

Matrimónio à Italiana | Trailer com Sophia Loren e Marcello Mastroianni

É um dos filmes mais divertidos da dupla Loren-Mastroianni, onde ambos atores são envolvidos em diálogos caricatos, em que se disparam ataques picantes, representando a guerra de géneros e de dualidades homem-mulher de uma Itália – senão de toda a sociedade ocidental – em mudança. Filumena e Domenico tanto odeiam-se quanto se amam e exemplificam uma sociedade universal incapaz de viver as instabilidades da vida a dois, e que prefere estar agarrada a um papel. Um papel que significa tanto para ela e pouco para ele.

Apesar de concebido há quase 60 anos, “Matrimónio à Italiana” realizado por Vittorio De Sica e adaptação da bem sucedida peça de Eduardo De Filippo, mantém-se atual e trata-se de uma história em que a sua protagonista, para além da exultante sensualidade, exige respeito.

É uma reivindicação da autoridade do género feminino, no qual o sentimentalismo e entrega total de Filumena contrariam o culturalmente amarrado Domenico. A presença inconfundível de Marcello Mastroianni é muitas vezes ofuscada pela aqui hiperbólica Sophia Loren. Inicialmente, o seu olhar enquanto jovem Filumena é um olhar recheado de esperança, de sonhos e que se deixa convencer pelas doces e persuasivas expressões de Domenico. Porém, no final do filme, temos uma mulher ávida, que anseia por vingança porque não conseguiu concretizar o seu objetivo. Sophia Loren neste filme evidencia o quanto as mulheres mais bonitas não são simplesmente objetos de desejo e têm direitos e ambições que deverão ser respeitadas. É uma chamada de atenção sem igual.

Sophia Loren
Sophia Loren em “Matrimónio à Italiana” (1964) © Compagnia Cinematografica Champion

Mas como “Matrimónio à Italiana” acabou por ser nomeado aos Óscares tendo em conta a sua temática? A Itália sempre foi um país de prestígio junto dos membros e votantes da Academia, sendo mesmo aquele com o maior número de estatuetas do Óscar de Melhor Filme de Língua Não-Inglesa. Talvez a denúncia do machismo em “Matrimónio à Italiana”, também presente em “Duas Mulheres”, mas desta vez apresentado em tom de comédia tenha ganho vários adeptos junto da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas. Curiosamente, o desempenho de Sophia Loren não deixou de ser ousado para a época, quando – recordemos – a Academia era ainda dominada por homens brancos e conservadores.

A Filumena de Sophia Loren pode ser uma mulher polémica, ao contrário da doce personagem interpretada pela vencedora desse ano Julie Andrews por “Mary Poppins“, com fortes traços da dona de casa convencional. Sophia Loren dá vida a uma personagem adorável, entusiasmante e matreira que merece lugar de destaque entre as melhores nomeadas ao Óscar de Melhor Atriz. Assiste ao momento em que Sophia Loren perde o Óscar de Melhor Atriz para Julie Andrews.

Sophia Loren perde o Óscar para Julie Andrews

Nomeadas ao Óscar 1965 de Melhor Atriz

  • Julie Andrews, “Mary Poppins”
  • Debbie Reynolds, “Os Milhões de Molly Brown”
  • Sophia Loren, “Matrimónio à Italiana”
  • Anne Bancroft, “Discussão no Quarto”
  • Kim Stanley, “Sance on a Wet Afternoon”

Depois de “Matrimónio à Italiana”, as colaborações entre Sophia Loren e Marcello Mastroianni continuaram e culminariam com o filme “Pronto a Vestir” (Robert Altman, 1994), onde reencenariam a famosa sequência de striptease feita para o filme vencedor do Óscar de Melhor Filme de Língua Não-Inglesa “Ontem, Hoje e Amanhã“. É um momento intenso para repensar o peso da memória cinematográfica e que vale a pena assistir no vídeo abaixo.

Continua com o nosso especial, com a entrega do Óscar Honorário a Sophia Loren no ano de 1991.




Óscar Honorário para Sophia Loren

A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood não poderia deixar de reconhecer o conjunto da obra de Sophia Loren e, por tal, nos Óscares 1991 recebe finalmente o seu Óscar Honorário. A atriz recebeu a sua estatueta dourada das mãos de Gregory Peck, com quem contracenou em “Arabesco”, uma trama ao estilo de James Bond realizada por Stanley Donen.

Este momento, partilhado no vídeo abaixo, é um momento de poucas palavras, em que Sophia Loren mereceu uma ovação por parte dalgumas das estrelas mais conceituadas de Hollywood e dos novos rostos do cinema dos anos 90. Sem nada mais para provar, a sua beleza mantém-se tão natural e os seus olhos enchem-se de uma humildade estrondosa. Deixem-se de críticas aos Óscares e sintam as emoções à flor da pele com Sophia Loren neste momento.

Como referimos no início desta viagem pela história de Sophia Loren nos Óscares da Academia, a diva do cinema receberá o primeiro Visionary Award entregue pela Academia na abertura do seu museu em Los Angeles no próximo mês de setembro. Ao seu lado estará o cineasta etíope Haile Gerima, bastante reconhecido nos EUA, que receberá o Vantage Award.

Segundo comunicado oficial da Academia, o Visionary Award reconhece o “extenso trabalho [que] fez avançar a arte do cinema”, além de ter dito que estes novos galardões “refletem a sua missão de celebrar e promover a compreensão das diversas e variadas histórias do cinema e dos artistas cinematográficos”. Com o todo o amor da Academia que queremos continuar a celebrar Sophia Loren. Mas quantas vezes foi a atriz ignorada? Quando é que esteve quase lá numa nomeação?

Sabe mais na página seguinte.




Quando é que a Academia ignorou Sophia Loren?

Apesar da ascensão de Sophia Loren a ter colocado entre os nomes mais prolíferos de Hollywood, e a ter colocado entre as 25 maiores estrelas femininas do cinema pelo AFI -American Film Institute, não podemos deixar de a reconhecer como profissional cuja temporada alta de galardões ficou bastante circunscrita aos anos 50 e 60. Se por um lado não perdeu a sua beleza pura, por outro Sophia Loren quis estreitar as portas do cinema para dedicar-se mais à sua vida como mãe e ao marido Carlo Ponti, com quem vivia entre Genebra, Miami e Nova Iorque.

Festa do Cinema Italiano
Sophia Loren em “Um Dia Inesquecível” © Compagnia Cinematografica Champion

No final dos anos 60 e inícios dos anos 70, era praticamente raro vê-la num filme norte-americano, aliás foi exatamente nesse período que a América começava a olhar para as suas novas potencialidades de contar histórias e virava a página a estrelas do cinema clássico. Neste período, um dos últimos filmes de Sophia Loren em inglês foi “A Condessa de Hong Kong”, o derradeiro filme de Charlie Chaplin com Marlon Brando e Tippi Hedren no elenco, estreado em 1967. A relação entre Brando e Loren não foi das melhores, e provavelmente a atriz não se sentia tão confortável com estrelas norte-americanas como acontecera antes. Rodaria à posteriori e preferencialmente em solo europeu, onde participou em filmes com Peter O’Toole – falamos do terrível musical “O Homem de La Mancha” (Arthur Hiller, 1972) e Richard Burton – com quem contracenou em “Il Viaggio“, último projeto de Vittorio De Sica.

Mas será que existiram outras chances de Sophia Loren estar na corrida aos Óscares? Na verdade, acreditamos que Sophia Loren é uma estrela à altura de Meryl Streep na Academia e que deveria ter obtido mais nomeações. Para além da justa nomeação com “Uma Vida à Sua Frente” que deveria ter acontecido este ano, a carreira de Sophia Loren tem interpretações que gritam por estatuetas douradas. O génio das composições para “Ontem, Hoje e Amanhã” (De Sica, 1963) ou “Os Girassóis” (Vittorio De Sica, 1970), são poucas vezes casos de estudo pelos amantes dos prémios da Academia, mas memoráveis pelos espectadores.

Um outro caso é o tantas vezes comentado “Um Dia Inesquecível” (1977), de Ettore Scola e com Marcello Mastroianni, com o qual a atriz merecia estar na corrida à estatueta dourada. Marcello Mastroianni, com toda a justiça conseguiu uma nomeação ao Óscar de Melhor Ator – o ator era de longe o melhor na corrida e deveria ter vencido -, e a obra esteve também na corrida ao Óscar de Melhor Filme de Língua Não-Inglesa.

Trailer de Um Dia Inesquecível com Loren e Mastroianni

Um Dia Inesquecível” conta a história de duas pessoas que moram no mesmo condomínio, um homem e uma mulher aparentemente desconhecidos que se vêem unidos no dia em que Adolf Hitler visita Roma, em maio de 1938. Sophia Loren é Antonietta, uma mãe de seis filhos e Marcello Mastroianni é Gabriele, um locutor de rádio desempregado. Aqui não temos uma mulher ousada, mas uma pessoa cansada de cumprir os seus deveres domésticos.

Com uma expressão constantemente apática ao costume, Sophia Loren revela ser uma mulher oprimida no seu matrimónio, sem razão para viver. Há uma amargura nos olhos de Sophia, cujo fogo interior só se acede quando estabelece a relação com Gabriele, um homem frágil com um segredo mais tarde revelado. Sophia olha para Gabriele e surge nela uma obsessão por voltar a amar intensamente, numa jornada tão absurda, onde os olhos da sociedade italiana estão postos no encontro de duas figuras políticas tirânicas e patriarcais. Para Antonietta o mais importante é a bondade de um homem sensível e que apenas quer ser amado. Gabriele e Antonietta são, na sua maneira simples de viver, dois ativistas contra as ideologias totalitárias, xenófobas e discriminatórias de Hitler e Mussolini, duas cúmplices na procura de uma vida sem convenções, de uma vida simples.

Sophia Loren
Cartaz original de “Um Dia Inesquecível” com Sophia Loren e Marcello Mastroianni

A personagem de Sophia Loren vem na linha das suas prévias nomeações aos Óscares, de uma mulher que procura ser aceite por ser ela mesma, num papel mais exigente reconstituindo segundos anteriores à eclosão da II Guerra Mundial. O cineasta Ettore Scola apresenta-a como uma mulher convencional, apenas para subverter o quão é forçada a viver naquele contexto. Há ainda uma procura do cineasta em evidenciar como a sexualidade de Antonietta (e com isso a sensualidade de Loren) é-lhe negada a favor da procriação – a personagem tem seis filhos – e não tem lugar de destaque no espaço casa quando rodeada pela família. “Um Dia Inesquecível” acabaria por ser histórica e culturalmente importante por impulsionar o movimento feminista na Itália na década de 1970 e uma das produções italianas de maior impacto do seu ano.

Talvez não saibas, Sophia Loren tem parentescos com a família Mussolini, tendo sido a sua irmã Anna Maria Scicolone casada com Romano Mussolini, o quarto filho do ditador.

Abaixo partilhamos as nomeadas ao Óscar 1978 de Melhor Atriz no qual deveria ter figurado Sophia Loren por “Um Dia Inesquecível”. Qual destas interpretações retiravas para incluir Sophia Loren? Apesar de não ter sido nomeada aos Óscares 1978, com a sua intensa performance no filme de Scola, Loren venceu o David di Donatello para Melhor Atriz Protagonista, o Globo de Ouro Italiano na mesma categoria e o prémio de Melhor Atriz entregue pelo Sindicato Nacional de Jornalistas Cinematográficas Italianos.

Nomeadas ao Óscar 1978 de Melhor Atriz

  • Diane Keaton, “Annie Hall”
  • Jane Fonda por “Julia”
  • Shirley MacLaine por “A Grande Decisão”
  • Marsha Mason por “Não Há Duas Sem Três”
  • Anne Bancroft por “A Grande Decisão”

Terminamos esta página com o momento em que Sophia Loren brilhou também como apresentadora nos Óscares, neste caso na edição dos prémios da Academia de 1999, ao entregar o Óscar de Melhor Filme Não Inglesa a Roberto Benigni, o cineasta de “A Vida É Bela”. Foi a 10ª vez que o país recebeu o respetivo Óscar, agora designado de Melhor Filme Internacional.

Segue as setas e lê a nossa última página sobre este especial Sophia Loren. Um Dia Inesquecível” está disponível em DVD na FNAC.pt.




“Uma Vida à Sua Frente” e “O que Faria Sophia Loren?”

É com a entrevista de Sophia Loren à Netflix Itália, no âmbito da estreia do filme “Uma Vida à Sua Frente” que começamos a última parte da carta de amor da MHD à vedeta italiana. Reconhecemos que os anos foram-lhe justos e Sophia Loren mantém a magia nos seus discursos, aliada à sabedoria da idade. Sophia Loren é uma artista completa e intemporal, que poucas vezes teremos oportunidade de descobrir.

Como Madame Rosa é uma ex-prostituta, uma sobrevivente do Holocausto cheia de traumas, caracterizada pela dureza de um passado complicado. Porém, para escapar desse passado, acolhe órfãos e filhos de prostitutas, educa-os e ofereces-lhes um lar. O filme é o retomar da dialética inerente na carreira de Sophia Loren de que as prostitutas merecem um espaço na sociedade, e não devem ser sempre vistas como figuras marginalizadas. “Uma Vida à Sua Frente” é um filme que de maneira muito simples, promove a aceitação social e oferece um dos elencos mais diversificados do ano de 2020, sem demasiada persistência ou questionamentos desajeitados sobre isso. As mais distintas individualidades e barreiras em questão de idade, racismo, transexualidade, migrações ilegais, religião e prostituição são tratadas com o maior dos cuidados numa história sobre um dar mais de si aos outros. Foi isso Sophia Loren fez ao longo de toda a sua vida.

A seguir partilhamos um excerto da nossa crítica a “Uma Vida à Sua Frente”. Aproveita para ler esta crítica, publicada ainda antes das nomeações aos Óscares 2021.

“Uma Vida à Sua Frente” faz-nos revisitar algumas das personagens mais familiares de Sophia Loren e permite consolidar uma mulher cuja dureza da sua rotina transparece nos seus gestos mais singelos. Sophia Loren e a sua Madame Rosa sabem bem que significado têm a dor e o sofrimento e embora o corpo possa estar enrugado e fragilizado, a mente e a vontade de viver não. Percebemos pouco a pouco que Madame Rosa não cede às emoções e a sua sabedoria fá-la aceitar melhor aquilo que passou no passado.

Não poderemos deixar de partilhar o trailer da curta-metragem documental “O Que Faria Sophia Loren?” que por pouco não foi nomeado aos Óscares 2021 na respetiva categoria, mesmo que estivesse incluído na lista de finalistas e fosse considerado pela imprensa especializada como favorito. “O Que Faria Sophia Loren?” é uma carta de amor a Sophia Loren, de maneira audiovisual, no qual percebemos o impacto da sua cinematografia e da sua maneira de existir (vestir, pentear e maquilhar-se a la italiana) junto dos imigrantes italianos norte-americanos e seus descendentes nos Estados Unidos da América – onde mais 17 milhões de norte-americanos identificam-se como descendentes de Itália.

O Que Faria Sophia Loren?” evidencia como a feminilidade de Sophia Loren e como a mesma não se esgotava num simples cenário e atravessava a quarta parede, de uma maneira que pouco comum a outras estrelas de Hollywood, que se afirmavam divindade omnipotentes em vez de grandes senhoras como a corajosa Sophia Loren.

Trailer de “O Que Faria Sophia Loren?”

Há muito por admirar neste pequeno filme independente também distribuiído pela Netflix. Além do vínculo italiano, é importante referir o quanto a representatividade italiana é crucial nesta trama. Os espectadores precisam de pessoas que lhe sejam próximas de alguma maneira, para conseguirem encontrar o seu “eu” numa sala de cinema e para que o ‘efeito Loren’ continue a ocorrer com o passar dos tempos. Uma das falhas passadas de Hollywood, precisa de ser agora uma das suas principais idiossincrasias. Sophia Loren não é apenas um mito, é uma mulher que soube dar voz àquilo ao que significa ser italiano, num tempo em que todos queriam ser americanos, com todos os artefactos que isso demandava.

Por essa mesma razão concluímos esta carta de amor a Sophia Loren com a lista de músicas interpretadas por Sophia Loren e disponíveis na plataforma Spotify. Entre as músicas encontra, por exemplo, “Tu Vùo Fà L’Americano” (“Tu Queres Ser Americano”) interpretada por Sophia Loren no filme “Começou em Nápoles” (Melville Shavelson, 1960), embora escrita previamente, em 1956, pelo famoso cantor Renato Carosone. Há que ser fiel às origens, e Sophia Loren trabalhou imenso para o fazer.

Ainda não terminamos! A seguir podes conhecer onde ver os filmes de Sophia Loren referidos neste artigo.




Onde ver os filmes de Sophia Loren?

Queremos partilhar contigo como podes ver os filmes de Sophia Loren que te falamos ao longo deste artigo. Apresentamos vários sugestões, desde plataformas de streaming como a Filmin Portugal e a Netflix à possibilidade de comprares um DVD dos filmes de Sophia Loren através da Fnac ou Amazon.

Clica em cima do título do filme para seres encaminhado à respetiva página. Prepara a sessão e entregue de coração às suas personagens.

Filmes com Sophia Loren na Filmin Portugal

Sophia Loren
Sophia Loren e Ibrahima Gueye com os rostos sobrepostos no poster de “Uma Vida à Sua Frente” © Netflix Italia

Filmes com Sophia Loren na Netflix Portugal

Filmes com Sophia Loren no Google Play

Festa do Cinema Italiano
Sophia Loren

Filmes com Sophia Loren em DVD na Amazon

Filmes com Sophia Loren em DVD na FNAC Portugal

Assim terminamos um momento histórico na MHD completamente dedicada aos papéis imaculados da artista italiana. Mantém-te atento às novidades da nossa página e aos nossos artigos sobre a História dos Óscares. 

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