De Barbie a Babylon, estas são as melhores bandas sonoras de 2023
“Barbie” e “Oppenheimer” são os favoritos para ganhar os Óscares musicais. Melhor Canção e Melhor Banda-Sonora Original devem já estar no papo, mas isso não significa que a Academia fez as melhores escolhas. Aqui propomos um top dez alternativo.
Como aqui na Magazine.HD trabalhamos segundo o calendário das estreias portuguesas, não nos vamos orientar pelas mesmas regras seguidas pela Academia de Hollywood. Ou seja, alguns filmes que competiram aos Óscares do ano passado, marcarão presença aqui. Além disso, não nos vamos restringir a bandas sonoras completamente originais ou exclusivamente instrumentais. Aqui, celebra-se todo o tipo de música e até uma seleção de canções bem feita merece aplausos. Com essas especificidades esclarecidas, passemos a algumas menções honrosas.
No foro do cinema sobre músicos, composições eruditas estiveram em destaque em 2023 e até a prestigiada Deutsche Grammophon se pôs ao barulho. Por exemplo, eles lançaram as bandas sonoras de “TÁR” e “Maestro,” dois filmes unidos por referências a Mahler e amor ao legado de Leonard Bernstein. Também há que se considerar “Chevalier,” onde Kris Bowers explorou e reinventou a obra de Joseph Bologne, Chevalier de Saint-Georges. Há ainda “American Symphony,” um documentário da Netflix sobre Jon Batiste com uma banda sonora composta pelo músico.
E depois há o caso de “May December: Segredos de Um Escândalo,” onde Todd Haynes e o compositor Marcelo Zarvos repensaram as músicas que Michel Legrand escreveu para “O Mensageiro” nos anos 70. O que antes era uma banda sonora de filme consagrado tornou-se numa arma de melodrama tragicómica – um golpe de génio, quiçá um génio do mal. Em termos de canções bem selecionadas que nos dizem muito sobre as personagens que as ouvem, não há melhor que “O Assassino” de David Fincher ou “Dias Perfeitos” de Wim Wenders.
Por fim, ficam algumas recomendações mais tradicionais. “Mestre Jardineiro” é mais um curioso trabalho de Paul Schrader que, em termos musicais, supera em muito os antecessores diretos – “No Coração da Escuridão” e “The Card Counter: O Jogador.” Há também a maravilha de “Emily,” uma ficção histórica que conjetura a vida de Emily Brontë. Aí, o compositor Abel Korzeniowski invocou o assobio do “Monte dos Vendavais” com cordas gritantes, transformou a voz humana numa chamada dos céus e soube como fazer do tema romântico uma canção de perdição.
Sem mais demoras, aqui ficam as nossas escolhas para as dez melhores bandas sonoras de 2023. Em décimo lugar fica…
10. EO
Na sua idade avançada, Jerzy Skolimowski ainda é um cineasta capaz de surpreender e expandir os limites da sétima arte. “EO” é prova disso mesmo, contando a história de um burro que muito sofre, inspirado em Bresson e com toques experimentais. A loucura cinematográfica é evidente desde o primeiro momento, quando o brilho escarlate rompe a escuridão de um circo, pondo à descoberta o nosso protagonista de quatro patas. A acompanhar o espetáculo visual, a música do polaco Paweł Mykietyn hipnotiza o espetador qual sereia da Antiguidade. Ela acompanha-nos na viagem picaresca do herói e suas muitas martirizações, puxando o filme para um patamar mais perto do sonho que da realidade comum.
09. VELAS ESCARLATES
Depois do seu belíssimo “Martin Eden,” o realizador italiano Pietro Marcello virou o seu olhar para França no rescaldo da Primeira Guerra Mundial. Com suas imagens granulosas, “Velas Escarlates” parece um filme perdido há mais de um século e recentemente redescoberto, cheio de faces caricatas e as texturas de tempos ancestrais. Contudo, também tem uma vertente fabulística, especialmente forte na sua musicalidade.
O compositor Oscarizado Gabriel Yared escreveu passagens instrumentais e canções para o filme, acentuando as qualidades de conto-de-fadas. Numa cena especialmente deslumbrante, é a voz da protagonista que atrai um homem apaixonado, como uma princesa da Disney repensada para um cinema lírico.
08. ELEMENTAL
Apesar de trabalharem todos por detrás das câmaras, a família Newman é uma das grandes dinastias de Hollywood. Alfred Newman foi um dos compositores mais galardoados na História dos Óscares, e ainda há Randy, Lionel, David e Emil Newman. Por fim, temos Thomas Newman que, ao contrário desses outros familiares, ainda está à espera da primeira estatueta da Academia. Ele já arrecadou quinze nomeações, mas a vitória escapa-lhe sempre. Contudo, a qualidade do seu trabalho não vacila e “Elemental” é prova disso mesmo. Conjurando especificidades culturais sem referência no mundo real, romance fantasioso e outras maravilhas que tais, a banda sonora é a melhor parte do filme. De facto, diríamos que a música é muito superior ao filme que a contém.
07. A VOZ DAS MULHERES
Nos últimos anos, Hildur Guðnadóttir tem-se vindo a afirmar como uma das grandes promessas no mundo da música para cinema. Em 2020, a compositora islandesa ganhou o Óscar por “Joker” e, desde então, a sua boa reputação só tem aumentado. Há grande beleza no trabalho desta artista, uma propensão para a arritmia sinfónica que, em momentos chave, se resolve em esplendor sónico. “A Voz das Mulheres” é um pouco diferente desse modelo tão comum na sua filmografia, sendo mais tradicional e ostentoso, mas não por isso menos belo ou delicado. Em certas passagens, quase sentimos que o diálogo de Sarah Polley podia ser excisado sem que se perdessem as emoções da trama, tão fortes são as melodias de Guðnadóttir.
06. SUZUME
Este ano que passou foi extraordinário no que se refere a cinema de animação japonês. Entre os muitos títulos anime que merecem respeito está “Suzume,” a mais recente obra-prima de Makoto Shinkai, passado em competição na Berlinale. Podíamos falar dos muitos triunfos dessa fita, desde a história estrambólica até à animação de uma cadeira com três pernas. Dito isso, estamos aqui para aplaudir trabalhos musicais, pelo que brilhamos o holofote sobre os esforços de Kazuma Jinnouchi e Yojiro Noda, também conhecido como RADWIMPS. Entre uma coleção de canções originais e estupendas passagens instrumentais, ouvir a banda-sonora de “Suzume” é como ser transportado para outra dimensão.
05. BARBIE
Por vezes, temos de nos render aos fenómenos culturais. “Barbie” foi assim um fenómeno, rebentando com todas as contas do box office e outras métricas semelhantes, sua banda sonora repleta de canções originais tornando-se num dos álbuns mais ouvidos do ano. Até nos Grammys, esta banda sonora teve direito a vingar e arrecadar mais algum ouro para a sua coleção de prémios. Face a tudo isto, podíamos insinuar alguma sobrevalorização, mas a qualidade do trabalho é inegável.
Começa-se com uma paródia do “2001: Odisseia no Espaço” e passamos ao “Pink” da Lizzo, uma canção perfeita para narrar o dia-a-dia das bonecas de Barbieland. Mas depois vem Dua Lipa, Ava Max e tantas outras, culminando a folia no “I’m Just Ken” cantado por Ryan Golsing. Mas ainda não acabou, pois falta Billie Eilish para cristalizar a crise existencial da protagonista com “What Was I Made For.” É extraordinário!
04. OPPENHEIMER
Ludwig Göransson é o segundo compositor islandês nesta lista e, tal como Hildur Guðnadóttir, também já tem um Óscar. No seu caso, foi ganho pelo “Black Panther” da Marvel e suas conceções de sonoridades Afro-futuristas. Este ano, volta a ser favorito na corrida para os Prémios da Academia, mas com um projeto muito diferente. Desta vez, o compositor está a concurso por “Oppenheimer,” uma cinebiografia que Christopher Nolan levou além dos limites da convenção.
A cronologia salta e resvala, a montagem parece seguir uma propulsão explosiva, em movimento contínuo – no meio deste aparato, a música também cumpre o seu papel. É a banda-sonora que dá coerência e até alguma poesia à estrutura. Algumas das melhores composições individuais do ano passado podem-se encontrar em “Oppenheimer.”
03. ASSASSINOS DA LUA DAS FLORES
Desde os anos 80 que Robbie Robertson é um dos colaboradores mais fiéis de Martin Scorsese, tendo trabalhado em vários títulos do realizador. “Assassinos da Lua das Flores” foi o último filme em que uniram esforços. Não porque houve algum desentendimento entre os artistas, mas porque Robertson faleceu entre a pós-produção e a estreia. Para esse compositor de herança Nativo-Americana, o projeto tinha significado especial, uma História do seu povo sob a influência genocida de uma América branca e cheia de ódio.
Talvez por isso tanta da música pareça sugerir o rito fúnebre, uma lamentação ora feita por instrumentos ou pela intervenção da voz humana. Mas também há espaço para a glória de um povo honroso, o furor da fortuna numa montagem eletrizante e muito mais.
02. O RAPAZ E A GARÇA
De forma semelhante à colaboração entre Robertson e Scorsese, também Joe Hisaishi e Hayao Miyazaki são uma parelha lendária na História do Cinema. Mais especificamente, na História do Anime e do Estúdio Ghibli os dois têm sido inseparáveis, criando incríveis sonhos em celuloide e partitura. “O Rapaz e a Garça” como obra mais pessoal do realizador, tem significado especial para todos os envolvidos e por isso requer uma banda sonora capaz de capturar a intimidade do tema assim como a abstração dos atos finais, quase na vertigem do surrealismo.
Usando a sua magia do costume, Hisaishi encontra o equilíbrio perfeito, sintetizando a dor de um filho em luto pela mãe, a loucura de um mundo onde a imaginação rege tudo, uma violação das barreiras entre espaço e tempo. Pode parecer exagero, mas todas essas ideias estão presentes na música. Ouvir esta banda-sonora é chamar o choro catártico.
01. BABYLON
Damien Chazelle adora jazz, tal como se pode ver em “Whiplash” e “La La Land.” Contudo, ama ainda mais os talentos idiossincráticos de Justin Hurwitz, seu compositor de eleição cujo trabalho foge ao jazz clássico, ao mesmo tempo que incorpora musicalidades noutros géneros, referências históricas e populares. “Babylon” é a sua melhor façanha até hoje, como se a euforia se convertesse em música pura.
Sentimos que estamos no meio do caos, no olho de um furacão emocional, a não ser quando a simplicidade de um leitmotiv romântico nos traz para uma tonalidade completamente oposta. Oscilando entre o pandemónio e a harmonia, Hurwitz almeja o paraíso sónico até que um final desconcertante repensa o seu tema principal, desconstruído e como que em soluços escancarados. A música eleva o filme, supera-o, voa na direção de um universo de folia. Apesar de tudo isso, no ano passado, “Babylon” perdeu o Óscar – uma imensa injustiça que aqui vingamos.
O que pensas sobre estas escolhas? Quais foram as tuas bandas sonoras preferidas do ano passado? Deixa as tuas respostas nos comentários.