Robot Dreams (Pablo Berger), a Crítica | Nomeado aos Óscares 2024, brilha agora na MONSTRA
“Robot Dreams”, uma co-produção francesa e catalã, foi uma das grandes surpresas na categoria de Melhor Filme de Animação nos Óscares 2024. A longa-metragem conseguiu angariar atenção internacional, mesmo sem grandes orçamentos e livre de diálogos, fazendo-se elevar pela sua força emotiva poderosa. Antes da estreia nacional nas salas, passou pela MONSTRA na secção Perspectivas.
A longa-metragem animada em estilo clássico cartoon, adaptada a partir da popular banda desenhada de Sara Varon, e situada temporalmente na Nova Iorque de 1980 só chega às salas nacionais na entrada do verão, integrando o catálogo da Films4You. Todavia, a Competição Perspectivas da 23.ª edição da MONSTRA possibilitou a existência feliz de uma sessão única deste filme altamente comovente.
Co-produção entre França e a Catalunha, “Robot Dreams” de Pablo Berger, já havia encantado no Festival Annecy, nos Prémios Annie (onde venceu Melhor Filme Independente) ou em Sitges, onde venceu o Prémio do Público. No dia 10 de março chegou a Hollywood como um nomeado improvável na categoria de Melhor Filme de Animação. Ao lado da sequela da versão animada de “Homem-Aranha” e do novo filme de Miyazaki (que saiu vitorioso), o pequeno indie “Robot Dreams” conseguiu prevalecer nas nomeações sobre grandes filmes de estúdio como “Wish”, a longa animada do “Super Mário”( um grande sucesso de bilheteira), ou a nova versão das tartarugas ninja.
Com pouco mais de 1h30 de duração e dispensando quaisquer diálogos além de algumas indicações escritas e um ruído expressivo aqui e ali, “Robot Dreams” exprime os seus belos sonhos e lições sobre companheirismo e encontros (e desencontros), dispensando palavras. Enganadoramente simples, a longa-metragem é desfrutável por qualquer tipo de público. Tenhamos 8 ou 80 anos, é possível extrair alegria, diversão, entretenimento e, em geral, valor depois de descobrir o universo de “Robot Dreams”. A sua linguagem é universal, da forma mais genuína, e a sua simbologia torna-se mais poderosa com a passagem do tempo. Um adulto verá trágicas conclusões nesta obra musicada e animada, uma criança provavelmente só verá a bela e improvável amizade entre cão e robô.
O filme de Pablo Berger apresenta-nos ao protagonista “Cão”, que como o nome deixa bem claro é um canídeo. Neste caso um canídeo antropomórfico que vive numa Nova Iorque habitada unicamente por animais. Até aqui nada de novo. Mergulhado na rotina e na solidão, Cão decide arranjar um robô de companhia que se torna rapidamente o seu amigo mais próximo. O robô é aberto, afável, pronto a aprender e copiar comportamento. Tem o entusiasmo genuíno de uma criança mas a resignação de um adulto quando necessário. Em suma, é o companheiro perfeito, sempre com um sorriso e disposto à aventura.
É durante uma visita à praia de Coney Island, no final do verão, que o grande (gigante) obstáculo do filme nos é colocado. Depois de ir à água e enferrujar, o robô é incapaz de se levantar e o cão não o consegue mover da praia e tem de voltar para a cidade e arranjar um plano perfeito para recuperar o seu companheiro. Aqui se inicia uma trama inesperada para uma longa que começa ligeira, leve e aparentemente incapaz de machucar. Mas eis que se intrometem reflexões contundentes sobre a natureza da solidão que não precisam de diálogos para se fazer valer, bem como as divagações e sonhos de um robô senciente preso num tormento existencial.
A ação de “Robot Dreams”, exibido na MONSTRA, desenrola-se vagarosamente mas sempre ritmada com mestria. As estações do ano vão acompanhando a progressão da história e com elas se multiplicam os elementos belos que dão cor à experiência humana. Sim, este filme sobre um cão e um robô é na realidade profundamente humanista e faz um esforço notável para confrontar a força da adversidade com a da resolução, persistência e otimismo. Perante a primeira neve do inverno, o nosso robô maravilha-se com os flocos grossos e perfeitos que caiem do céu; com a chegada da primavera, testemunha o milagre do nascimento e acolhe uma família de passarinhos; com a passagem do tempo reflete e entre angústias e incertezas, o nosso protagonista, suposto objeto, vai fazendo crescer a sua bondade e resiliência e todas as outras características que o tornam tão humano.
Perspicaz, repleto de humor e de música, e capaz de martelar a canção “September” para sempre nos nossos cérebros, de forma a nunca se dissociar da obra de animação, “Robot Dreams” oscila entre uma resignação poética e o apelo a uma vontade de viver voraz. Fala-nos de companheirismo, de solidão, de oportunidades falhadas e desencontros, de momentos na vida que se fazem efémeros e que assim continuarão a sê-lo e, por muito doloroso que tal possa ser, esta condição apenas aumenta o seu valor incalculável.
Esta obra, em igual parte tragédia e comédia, merece o mundo, entregando uma história que, sendo balizada temporalmente, assume um carácter bastante universal. A sua representação de amizade e companheirismo tem um pendor franco e genuíno – capaz de desarmar e de combater cinismos. A passagem do tempo remete-nos para dilemas existenciais inerentes, mas a sua energia alegre e contagiante mantêm-nos ancorados na jovial natureza dos eventos. O equilíbrio entre a alegria e a tristeza é sublime, à medida que a relação entre um cão e um robô conseguirá, de certo, fazer-nos refletir abertamente acerca das nossas próprias relações – e sobre o passado, futuro e presente.
Minimalista, esperançoso, reduzido aos elementos narrativos mais centrais e não refém de uma progressão galopante como muita da animação mainstream dos dias de hoje, “Robot Dreams” é verdadeiramente encantador e especulamos que consiga agradar a gregos e troianos.
ROBOT DREAMS| A BELÍSSIMA HISTÓRIA DE AMIZADE NA MONSTRA EM 2024
“Robot Dreams” chega às salas de cinema portuguesas a 27 de junho. Recomendamos vivamente esta comédia dramática muito peculiar.
Robot Dreams, em análise
Movie title: Robot Dreams
Movie description: DOG vive em Manhattan e está cansado de estar sozinho. Um dia, decide construir um robot, um companheiro. A amizade deles floresce, até se tornarem inseparáveis, ao ritmo de Nova Iorque nos anos 80. Numa noite de verão, DOG, com grande tristeza, é forçado a abandonar ROBOT na praia. Irão eles voltar a encontrar-se?
Date published: 15 de March de 2024
Country: ESPANHA, FRANÇA
Duration: 102'
Author: Pablo Berger, Sara Varon
Director(s): Pablo Berger
Actor(s): Ivan Labanda, Albert Trifol Segarra, Rafa Calvo
Genre: Animação, Comédia, Drama
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Maggie Silva - 85
CONCLUSÃO
“Robot Dreams” é uma obra de ficção animada que vence pela simplicidade e pela genuína emotividade dos seus eventos. Inventivo nos mais pequenos pormenores e imenso na capacidade de conexão com os mais basilares sentimentos humanos, o primeiro filme de animação assinado pelo espanhol Pablo Berger merece toda a atenção mediática que tem vindo a conquistar – da passagem pela secção “Perspectivas” na MONSTRA 2024 à justa nomeação aos Óscares.
