74º Berlinale | Ponho as “Mãos no Fogo” neste Festival
“Mãos no Fogo” da portuguesa Margarida Gil vai estar a concurso na secção Encounters da Berlinale 2024, em fevereiro próximo. Na Competição mais uma vez bastante autoral, apenas com um filme norte-americano de raiz, destacam-se as novas obras do francês Bruno Dumont e novamente o imparável realizador coreano Hong Sangsoo, com Isabelle Huppert.
“Mãos no Fogo”, o novo filme de Margarida Gil concorrerá à competição Encounters — onde estiveram em anos anteriores “A Metamorfose dos Pássaros”, de Catarina Vasconcelos, e “Viver Mal“, de João Canijo — será a única participação portuguesa nos concursos da 74.ª Berlinale, que vai decorrer de 15 a 25 de Fevereiro próximos. A MHD vai acompanhar in loco, todos os dias do Festival. Trata-se da oitava longa-metragem da veterana realizadora (73 anos), de “Relação Fiel e Verdadeira”, “Adriana” ou “Mar” e este seu novo filme “Mãos no Fogo”, marcará curiosamente também a sua primeira participação numa competição do Festival de Berlim. O filme português é uma adaptação muito livre do conto “A Volta no Parafuso“, de Henry James, (edição portuguesa da Relógio D’Água) com a direcção de fotografia do “mestre” Acácio de Almeida e é interpretado pelos actores Carolina Campanela, Rita Durão, Marcello Urgeghe e Ricardo Aibéo.
UMA COMPETIÇÃO EQUILIBRADA
Quanto à Competição principal da Berlinale 74, — a última dirigida por Mariette Rissenbaek e Carlo Chatrian, em fim de mandato e entretanto substituídos por Tricia Tuttle, ex-diretora do BFI London Film Festival — conta com 20 filmes, que combinam o talento de veteranos, com a ousadia de jovens realizadores, além de filmes de África, da América do Sul, da Ásia, ao lado de produções da Europa e de filmes com estrelas de Hollywood, que curiosamente marcam também a sua presença no cinema mais alternativo. Destacam-se assim, alguns nomes sonantes do cinema do mundo e do circuito de festivais: Bruno Dumont com “L’Empire”, uma sátira às space-operas (como “A Guerra das Estrelas” ou “Dune”, provavelmente?), o prolífico Hong Sangsoo (“A Mulher Que Fugiu“), com “A Traveller’s Need” — num filme desta vez protagonizado pela vedeta francesa Isabelle Huppert —, o mauritano Abderrahmane Sissako (“Timbuktu“) com “Black Tea”, a história da integração de uma africana na China, um bastante aguardado regresso do francês Olivier Assayas (“Wasp Network“) com “Hora du Temps”, uma comédia, que tem como pano de fundo, o confinamento; e a franco-senegalesa Mati Diop (“Atlantique“), com o documentário “Dahomey”.
O realizador mexicano Alonso Ruizpalacios, duas vezes vencedor do Urso de Prata — “A Cop Movie” (2022) e “Museo” (2018) — regressa também à competição de Berlim com “La Cocina”, o seu filme de estreia em inglês, com Ronney Mara e Raúl Briones — actor de “A Cop Movie”. O realizador alemão Andreas Dresen (“Grill Point”, “Rabiye Kurnaz vs. George W. Bush”), outro habitual da Berlinale, está também de volta à competição com seu mais recente, “From Hilde With Love”, com Liv Lisa Fries, a estrela da série “Babylon Berlin“, num drama da época da II Guerra Mundial. Outro dos participantes regulares de Berlim que regressa à competição este ano é o documentarista russo Victor Kossakovsky, com “Architecton”.
VÊ TRAILER DE “SMALL THINGS LIKE THIS”
Os realizadores de filmes de terror austríacos Veronika Franz e Severin Fiala, estrearão o seu novo “The Devil’s Bath”, aliás como o italiano Piero Messina, com “Another End”, um filme protagonizado por Gael Garcia Bernal. A actriz Renate Reinsve (“A Pior Pessoa do Mundo“) é a co-protagonista deste “Another End” e a cabeça de cartaz também de “A Different Man”, ao lado de Sebastian Stan, o único filme de origem norte-americana de raiz, realizado por Aaron Schimberg, integrado na Competição principal. A abertura, no dia 15 de fevereiro, como já tinha sido anunciado anteriormente, far-se-á com “Small Things Like These”, um filme integrado na Competição e uma adaptação do romance “Pequenas Coisas como Estas”, — mais uma edição portuguesa da Relógio d’Água — da escritora irlandesa Claire Keegan.
O filme passa-se em 1985, numa pequena cidade irlandesa, cheia de mistérios do passado e bastante controlada pelos dogmas da Igreja Católica. O filme além de reunir uma parte da equipa da série televisiva “Peaky Blinders“, ou seja o realizador belga Tim Mielants e o actor irlandês Cillian Murphy (o rosto de “Oppenheimer”), traz um elenco onde se destacam Michelle Fairley (“Downton Abbey“) e a vedeta britânica Emily Watson (“Criaturas de Deus“). O filme tem ainda um argumento que é escrito sobre o romance de Keegan, pelo dramaturgo Enda Walsh, e entre os seus vários produtores estão Matt Damon e Ben Affleck.
OS MELHORES DOS ENCONTROS
Além de “Mãos no Fogo”, de Margarida Gil, destacam-se ainda na secção Encounters, (ou Encontros), a longa-metragem brasileira “Cidade; Campo”, de Juliana Rojas (“Sinfonia da Necrópole”) e a co-produção “Dormir de Olhos Abertos”, de Nele Wohlatz, uma co-produção Brasil, com Argentina, Taiwan, Alemanha e “Tú me abrasas”, do argentino Matías Piñeiro (autor de “Sycorax”, uma curta-metragem co-realizada com Lois Patiño, rodada nos Açores e uma co-produção da Bando à Parte), um filme que é uma co-produção com Espanha, a grande ausente das competições, depois dos dois grandes êxitos anteriores “Alcarràs“ (2022) e “20.000 Espécies de Abelhas” (2023).
Outros destaques da programação do Encouters, supostamente composta de filmes mais vanguardistas e experimentais, incluem “Un Famillie”, a estreia na realização da aclamada e polémica escritora francesa Christine Angot, cujo trabalho como argumentista, inclui “Com Amor e Com Raiva”, da realizadora Claire Denis, apresentado na Berlinale 2022; “Matt and Mara”, do realizador Kazik Radwanski, protagonizado pelo realizador de “Blackberry“, o actor Matt Johnson e Deragh Campbell; e “Some Rain Must Fall”, de Qiu Yang e a estreia nas longas, deste aclamado realizador chinês de curtas-metragens.
VÊ TRAILER DE ‘LOVE LIES IS BLENDING’
PROGRAMA ESPECIAL E PARALELO
A 74º Berlinale, estreará ainda fora de concurso na Berlinale Special, incluirá dois filmes de acção: “Love Lies Bleeding”, um filme policial realizado por Rose Glass e protagonizado por Kristen Stewart, e na tradição do Festival, também um thriller coreano “The Roundup: Punishment”, de Heo Myeong-haeng. “Love Lies Bleeding”, conta também com a participação de Anna Baryshnikov, Dave Franco, Katy M. O’Brian, Ed Harris e Jena Malone, filme este que terá a sua estreia internacional em Berlim depois de passar no Festival de Sundance 2024, que começou no passado dia 18 e vai até 28 de janeiro.
Por outro lado, “The Roundup: Punishmen”, é protagonizado por Don Lee, conhecido pelo seu papel em “Train to Busan”, fará a sua estreia mundial. Outros filmes a destacar na Berlinale Specials, incluem “Shikun”, o último filme do cineasta israelita Amos Gitai (“Kadosh”); o projecto documental “Turn in the Wound”, do aclamado cineasta nova-iorquino Abel Ferrara (“Bad Lieutenant”), sobre a vida em Kiev desde o inicio da guerra na Ucránia; “Supersex”, um drama italiano da Netflix baseado na vida do famoso actor de filmes para adultos, Rocco Siffredi, interpretado por Alessandro Borghi. Os três filmes terão as suas estreias mundiais em Berlim, tal como “The Box Man”, o novo filme do realizador japonês Gakuryu Ishii (“Labyrinth of Dreams”).
O documentarista francês Nicolas Philibert, cujo o filme “On the Adamant”, ganhou o Urso de Ouro de Melhor Filme o ano passado, regressa “Averroès & Rosa Parks”, mas fora competição. Outros documentários que formam parte desta programação especial da Berlinale incluem “Made in England: The Films of Powell and Pressburger”, realizado por David Hinton e narrado por Martin Scorsese, sobre os lendários cineastas britânicos Michael Powell e Emeric Pressburger; “The Empty Grave”, de Agnes Lisa Wegner e Cece Mlay, que examina os esforços dos descendentes dos cidadãos tanzanianos assassinados pelos colonizadores alemães na África Oriental do século XIX, para recuperar os restos dos seus antepassados da Alemanha; e “exergue – on documenta 14”, de Dimitris Athiridis, um documentário de 840 minutos sobre a criação da Exposição de arte documenta 14, pelo curador de arte Adam Szymczyk, em 2017.
Por fim, Adam Sandler e Carey Mulligan, protagonizam “Spaceman”, do cineasta sueco Johan Renck — conhecido pela sua participação na série “Chernobyl”, — será o filme de Gala de Berlinale Special, além de que o realizador da Formosa, Tsai Ming-Liang, apresentará o seu último filme intitulado “Wu Suo Zhu”. Por último, no longo programa da secção Panorama destaca-se o veterano realizador francês André Téchiné, com o seu novo filme “Les gens d’à côté”, com Isabelle Huppert, Nahuel Pérez Biscayart, Hafsia Herzi.
AS HONRAS E CO-PRODUÇÕES PORTUGUESAS
Em jeito de conclusão, a participação portuguesa não se reduz ao filme de Margarida Gil, pois serão exibidos na secção paralela Fórum, duas co-produções, em ambos os casos filmes oriundos de países africanos de língua portuguesa: “As Noites Ainda Cheiram à Pólvora”, um documentário do moçambicano Inadelso Cossa, — Portugal é um dos co-produtores, a par da Alemanha, França, Noruega e Países Baixos; e “Resonance Spiral”, mais uma instalação feita a partir dos arquivos documentais e fotográficos da Guiné-Bissau, da artista visual Filipa César, em parceria com o arquitecto guineense Marinho de Pina. No dia 20 de fevereiro, a Berlinale entregará um Urso de Ouro Honorário ao mítico realizador americano Martin Scorsese —Mariëtte Rissenbeek, e o director artístico, Carlo Chatrian, num comunicado, destacam-no e bem como o realizador que “acompanhou a nossa historia como espectadores e seres humanos” — numa cerimónia que inclui a projeção de “The Departed – Entre Inimigos” (2006), filme pelo qual ele recebeu o Oscar de Melhor Realização.
O nonagenário cineasta alemão Edgar Reitz (“The Tailor From Ulm” e “Alemanha no Outono”) receberá também uma Berlinale Camera, um troféu de honra pelo conjunto de sua obra. A actriz Lupita Nyong’o (“12 Anos Escravo” e “Black Panther”) vencedora de um Oscar de Melhor Actriz Secundária em 2014, é presidente do Júri Internacional da Berlinale 2024 e responsável máxima pela atribuição dos prémios Urso de Ouro e Urso de Prata deste ano.
JVM
